Chapter 1: 1
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Sarina Satoji
"As pessoas sempre falam sobre amor, relacionamentos e essas coisas como se fossem simples. Mas não são. Tudo o que envolve o coração do outro é complicado demais para ser levado com leveza.
Você conhece apenas o seu próprio coração. Isso não significa que sua vida seja um problema — apenas que talvez não consiga obter, de fato, a reciprocidade que espera."
As palmas vieram antes que eu terminasse a última frase. O professor me interrompeu com um "parabéns" e logo perguntou se eu já havia decidido para qual escola iria no ensino médio.
— Faltam apenas dois meses, senhorita Satoji. Você precisa decidir.
Meu Deus... que caos. Todas as escolas de Miyagi são focadas em esportes e eu não tenho planos de sair daqui tão cedo. Talvez só para a faculdade. Tenho muito interesse em estudar na Noritami.
Conversei mais um pouco com o professor, escutamos as outras leituras, e quando o sinal tocou, peguei minhas coisas. Ainda teria aula de física e, hoje, meu par era justamente ele: Tsukishima Kei.
O garoto dos meus sonhos desde que me entendo por gente — e que, claro, não liga para mim. Em todos esses anos que nos conhecemos, tentei cinco vezes me declarar, mas não deu certo.
Talvez Tsukishima realmente não entenda o que eu tento dizer, ou talvez eu seja sutil demais por medo de ser rejeitada. Mas tudo bem. Já tirei essa ideia da cabeça. Agora só preciso agir normalmente quando estiver com ele.
E isso será em, no máximo, quinze minutos... já que Yamaguchi faltou.
O corredor cheirava a giz e verniz antigo. Eu caminhava devagar, tentando controlar a ansiedade.
Cada passo me lembrava que Tadashi faltou e que, por isso, eu teria que dividir a bancada com Tsukishima. Ótimo. Mais quinze minutos para fingir que meu coração não bate mais rápido quando ele está por perto.
Quando entrei no laboratório, ele já estava lá. Alto, encostado na bancada do fundo, os fones pendurados no pescoço e uma expressão entediada. Girava a caneta entre os dedos longos, o loiro desalinhado caindo no rosto.
— Satoji — disse sem levantar muito a voz, apenas o suficiente para me notar.
— Tsukishima — respondi, tentando parecer neutra.
Ele ergueu uma sobrancelha, um canto da boca ameaçando um sorriso sarcástico.
— O Yamaguchi faltou, então parece que vai ter que me aguentar hoje.
— Como se eu tivesse escolha — murmurei, ocupando o assento ao lado.
Ele soltou um "hm" abafado, típico dele, e abriu o livro de física. Os dedos longos passaram pelas páginas com uma paciência irritante. Eu tentei me concentrar no enunciado do exercício, mas o cheiro do desinfetante misturado ao do shampoo dele me deixava zonza.
— Está distraída — comentou, sem me olhar.
— Não estou.
— Está, sim. Sua mão está tremendo com o lápis — ele apontou, ainda com aquele tom neutro.
Meu rosto queimou. Afundei o olhar no caderno.
— Talvez seja porque eu não dormi bem.
— Ou porque tem alguém aqui que te incomoda? — o tom dele agora tinha um traço de provocação.
Levantei os olhos e encontrei os dele: frios, dourados, mas com uma faísca que eu não conseguia decifrar. Tsukishima sustentou meu olhar por um segundo a mais do que o normal, depois desviou e rabiscou alguma coisa no caderno.
— Concentre-se no problema, Satoji — disse por fim.
— Estou tentando — retruquei, com a voz um pouco mais firme.
Ele inclinou a cabeça, quase sorrindo, e murmurou baixo o suficiente para que só eu ouvisse:
— Boa sorte.
Minha respiração ficou presa na garganta. Por que ele tinha que falar assim? Por que ele tinha que olhar assim? Me obriguei a olhar para o quadro, enquanto ele, impassível, resolvia a conta de cabeça.
Ele terminou a conta primeiro, como sempre, e empurrou o caderno para o meu lado sem me olhar.
— A sua resolução está boa — disse, quase num tom casual. — Mas você complicou a última etapa.
Franzi o cenho.
— Complicada como?
Ele inclinou o corpo para perto, apoiando o cotovelo na bancada. A ponta do lápis passou pelo meu cálculo, linha por linha, até chegar à resposta final.
— Aqui. Você escreve bonito, sabe? Parece até poesia — falou, com um meio sorriso — só que é física, não um poema.
O coração me deu um salto. Tsukishima não elogiava ninguém. Nunca.
— Você... está dizendo que eu sou dramática nas contas? — tentei rir, para disfarçar.
— Estou dizendo que é esperta demais para enfeitar tanto. — Ele ergueu os olhos para os meus, sério por um instante. — Se simplificar, chega na resposta mais rápido do que eu.
Minha garganta secou. Aquilo era um elogio. Disfarçado de crítica, mas era.
— Ah... certo. — Baixei a cabeça para o caderno, tentando ignorar o calor subindo pelo rosto.
Ele recostou de novo na cadeira, como se nada tivesse acontecido.
— Não precisa me olhar assim. Estou só ajudando — murmurou, mas havia um tom quase divertido na voz.
E eu, que conseguia argumentar sobre qualquer assunto com qualquer pessoa, fiquei sem palavras.
Chapter 2: 2
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Sarina
Desde aquele dia, algo entre mim e Tsukishima mudou.
Ele passou a me provocar mais, sempre que ficávamos em dupla. Às vezes era um comentário ácido sobre o meu jeito de resolver um problema, outras, uma observação sobre meu cabelo solto ou a minha distração. Yamaguchi tinha algumas aulas em horários diferentes dos nossos e, quando voltava, já encontrava o "ritmo" estabelecido: nós dois juntos.
Até mesmo quando estávamos em trio, a coisa evoluiu. Sem que eu percebesse, fui sendo colocada entre eles como uma possível amiga.
Amiga.
Mas tudo o que eu queria com Tsukishima estava longe de ser amizade.
Eu reparava demais nele. Nas mãos longas segurando o lápis. No jeito como ajeitava os óculos, empurrando a haste com um dedo só, ou no cuidado meticuloso quando os limpava. Yamaguchi sempre sorria quando me pegava observando, mas nunca me criticava; ao contrário, parecia entender. Tínhamos nos tornado bons amigos, para mim cada detalhe era um lembrete do que eu realmente sentia.
🏐📝🏐📝🏐📝
A sala de ciências estava silenciosa, exceto pelo som dos lápis riscando o papel e pelo clique ritmado do cronômetro que marcava o tempo do nosso experimento. O cheiro de álcool e materiais de laboratório tomava o ar. Era para ser só mais uma atividade escolar, mas, para mim, parecia um teste de resistência emocional.
Estávamos nós três — eu, Yamaguchi e Tsukishima — montando um modelo de reação química para a feira de ciências. Yamaguchi anotava resultados com paciência, enquanto eu tentava organizar as amostras. Tsukishima, como sempre, parecia no controle de tudo, encostado de leve na bancada, os óculos escorregando no nariz enquanto mexia nas soluções.
— Cuidado com essa pipeta, Satoji — comentou ele, sem sequer olhar para mim. — Se errar a dosagem vai estragar o resultado.
— Eu sei o que estou fazendo, obrigada — retruquei, mas minha voz saiu mais baixa do que eu gostaria.
Ele ergueu uma sobrancelha, aquele meio sorriso no canto dos lábios.
— Sei... mas da última vez você virou poesia com as contas. Vamos ver se agora não vira drama com os reagentes.
Tadashi mordeu o lábio para não rir e me lançou um olhar rápido, cúmplice, como quem dizia "ele está pegando no seu pé de novo".
Fiz força para me concentrar nas medidas. Mesmo assim, não consegui evitar: meus olhos foram parar nas mãos do Tsukishima, firmes e precisas, movendo os instrumentos de vidro com cuidado irritante. Cada gesto parecia calculado.
— Sabe, você é muito meticuloso para um simples experimento escolar — falei, tentando soar neutra.
Ele deu de ombros.
— Alguém precisa compensar as distrações do grupo.
— Ei! — protestei, mas Tadashi interveio com um sorriso.
— Relaxa, Sarina. Ele provoca, mas é só o jeito dele — disse, escrevendo mais um resultado na planilha.
— Yamaguchi, você está ajudando o lado errado — brinquei, mas por dentro meu coração acelerava.
Tsukishima apenas riu pelo nariz e me passou uma folha com as fórmulas.
— Aqui, vê se consegue simplificar isso antes de transformar em texto lírico.
Um elogio disfarçado de provocação. Era a terceira vez naquela semana que ele fazia algo assim. E eu, que normalmente tinha respostas afiadas, fiquei apenas olhando para a caligrafia dele no papel.
Tadashi percebeu. Sorriu de novo, mas não disse nada e eu tentei me lembrar que isso era só um projeto de ciências. Mas, no fundo, sabia que era mais um campo minado entre eu e o garoto que eu não conseguia parar de olhar.
Tadashi terminou de anotar os últimos números e deixou o lápis de lado. Ficou me observando em silêncio enquanto eu ainda mexia nos frascos. Tsukishima estava um pouco afastado, lavando o material no balcão, fones no pescoço como sempre.
— Sabe, Sarina... — Yamaguchi começou, baixinho, fingindo que falava do relatório — você anda reparando demais no jeito que ele faz as coisas.
Olhei para ele, assustada.
— Q-quê? Eu só estou concentrada no experimento.
Yamaguchi ergueu uma sobrancelha, um sorriso discreto.
— Aham. "Concentrada". Até parece que não sei ler olhares.
Meu rosto queimou. Apertei a pipeta com mais força para não deixar cair nada.
— Não é nada disso, Yamaguchi.
Ele se inclinou um pouco mais, ainda em tom de brincadeira:
— Relaxa, não vou contar pra ele. Só acho engraçado ver você tão direta nas aulas e toda atrapalhada perto dele.
Mordi o lábio, tentando não encarar o loiro do outro lado.
— Você é impossível...
Tadashi deu uma risadinha curta e voltou para os papéis.
— Se você diz.
Antes que eu pudesse responder, a voz de Tsukishima cortou o ar.
— Se ela diz o quê?
Congelamos. Eu e Tadashi trocamos olhares. O loiro estava parado bem atrás de nós, secando as mãos com um pano. O tom era neutro, mas havia algo nos olhos dele — um brilho curioso que não estava ali antes.
— Nada de importante — Tadashi respondeu rápido, mas Tsukishima não desviou de mim.
— Certo... — ele murmurou, jogando o pano no balcão. — Só achei que estavam falando de mim.
E saiu andando para buscar outro material.
Meu coração disparou, Tadashi mordeu o sorriso, tentando se conter.
— Viu? Ele ouviu.
Eu baixei a cabeça no caderno, tentando parecer ocupada, mas o sangue ainda zunia nos meus ouvidos. Era só um projeto de ciências. Só um projeto...
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O dia tinha sido produtivo demais.
Depois do projeto, Tsukishima e Yamaguchi decidiram passar numa loja de conveniência. Eles até me convidaram, mas eu neguei com um sorriso. Sabia reconhecer a hora em que os rapazes queriam ficar sozinhos.
Segui sozinha para a minha floricultura favorita, um cantinho escondido entre duas ruas estreitas. Assim que entrei, o aroma doce das flores tomou conta de mim. Rosas, lírios, girassóis. Passei os dedos de leve nas pétalas de um vaso de crisântemos brancos, inspirando fundo como quem tenta guardar o cheiro dentro de si.
Ali, entre cores e perfumes, parei para analisar a minha situação.
Falta um mês e doze dias para o fim das aulas e, consequentemente, para o fim da nossa vida letiva nessa escola. Depois disso, provavelmente cada um vai para um lado.
Eu já escolhi a escola que vou, mas não contei a ninguém. Não quero que pensem que estou tomando essa decisão com base nas minhas amizades atuais ou em qualquer outra coisa. Quero estar consciente de tudo antes de dar esse passo.
E, definitivamente, não quero que descubram a minha paixão pelo loiro alto de óculos. Já estão me olhando estranho desde que comecei a andar demais com ele e Tadashi. "Não populares", sussurram pelos corredores. Como se isso importasse para mim.
Enquanto cheirava as flores, vi meu reflexo no vidro da vitrine: uma menina que escreve textos bonitos, que fala de amor com segurança, mas que treme toda vez que aquele garoto a olha. Suspirei.
Talvez eu só esteja tentando ganhar tempo, antes que tudo mude.
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Tsukishima Kei
Ukai me olhava há um tempo.
Nós sempre passamos na conveniência dele: os sucos ficam na temperatura exata que eu gosto e, claro, as revistas de super-heróis que o Tadashi coleciona.
— Olha, Tsukki, chegou o volume oito! — Yamaguchi comentou, empolgado.
Olhei por alto.
Na minha cabeça, uma pré-confusão começava a se formar. E tratava de nada mais, nada menos, que Sarina Satoji.
A garota de cabelos verdes mais vivos que os de Tadashi, boca carnuda sorriso sincero e sardas naquela pele escura e cheirosa dela, olhos brilhantes em um tom de verde tão vivo quanto o cabelo. Sim, posso até ser meio cego, mas não sou burro.
Sarina é meio avoada, mas divertida. Tem um sorriso bonito. Muito bonito.
Sacudi a cabeça, deixando esse pensamento de lado, e voltei a falar de quadrinhos com o Tadashi. A gente geralmente joga vôlei, mas já faz alguns dias que isso não acontece.
Olhei para ele mais uma vez e lembrei: a prima dele estava para chegar em algumas horas.
Yamaguchi pode até ser meu melhor — e possivelmente único — amigo, mas Sakura Yamaguchi, a prima dele, é um problema. Um problema que, infelizmente, é mais meu do que dele, afinal me envolvi com ela.
— Hey, Tsukki, a Sak ainda não chegou. Que tal irmos lá pra casa jogar? — Tadashi sugeriu.
Neguei calmamente. Quando essa garota chegar, vou ter de ter paciência para acalmar o maldito furacão que eu mesmo, de certo modo, liberei.
É, Tsukki... você se lascou.
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A rua até a casa do Tadashi era curta. Fui andando devagar, chutando uma pedrinha com a ponta do tênis, tentando manter a cabeça no lugar. O céu estava começando a ficar alaranjado, no fim eu vim do mesmo jeito.
Na minha mente, uma imagem insistente: Sarina curvada sobre o caderno no laboratório, o lápis entre os dedos, os cabelos verdes caindo para frente e aquele jeito de franzir o nariz quando se concentra. Sacudi a cabeça. Não era hora disso.
Tadashi abriu o portão e me chamou:
— Anda logo, Tsukki.
Entrei. O quintal cheirava a chá e pão doce. No corredor, ouvi passos apressados. Quando olhei, ela estava lá: Sakura Yamaguchi. O mesmo cabelo castanho, os mesmos olhos brilhantes e o sorriso que já previa confusão, eu realmente não deveria ter vindo.
— Tsukki! — ela exclamou, vindo na minha direção. — Quanto tempo!
— Oi, Sakura — respondi, com um aceno contido.
Ela me abraçou sem cerimônia. Senti meu ombro ficar rígido, mas me obriguei a manter a compostura. Sakura sempre foi assim: um furacão que não mede espaço.
— Tadashi, preparei chá gelado! — ela anunciou, correndo para a cozinha.
Tadashi riu.
— Ela não mudou nada.
— Percebi — murmurei, tirando os tênis.
Enquanto eles falavam animados, meu celular vibrou no bolso. Peguei para ver: uma notificação simples do grupo da turma, mas com uma foto. Sarina, no meio de uma floricultura, segurando um vaso de crisântemos. A legenda dizia apenas: "Projeto de ciências finalizado. Hora de respirar."
Meu peito apertou. Eu conhecia aquele lugar. Era a mesma floricultura em que ela sempre parava depois das aulas. Fiquei olhando para a foto mais tempo do que devia, até sentir Tadashi espiar por cima do meu ombro.
— Satoji, né? — ele comentou, sorrindo de canto. — Ela gosta dessas flores.
Guardei o celular rápido demais.
— É só uma foto.
Tadashi não disse nada, mas o sorriso não saiu do rosto.
Sakura voltou da cozinha com três copos na mão.
— Vamos jogar? — perguntou, animada.
Assenti, mas enquanto o jogo começava, minha cabeça estava em outro lugar. Nas flores. Na Sarina. Na contagem que eu fingia não ver crescer dentro de mim.
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A casa estava silenciosa quando fechei a porta. Só o som do relógio na parede marcava o tempo. Larguei a mochila perto do sofá, tirei os óculos e passei a mão no rosto. O cheiro do chá gelado ainda estava na minha boca, mas a lembrança mais viva era outra, cumprimentei minha mãe e segui para o meu quarto.
Deitei no colchão sem acender a luz. O teto branco ficou tremendo na minha visão cansada. Normalmente, depois de um dia assim, eu colocaria um fone e ouviria alguma playlist qualquer, mas a cabeça não parava.
Sarina.
Era como se ela tivesse ficado ali, no corredor da casa do Tadashi, mesmo sem estar presente.
Primeiro flash: ela rindo no laboratório, apoiada na mesa, um borrão de reagente azul no pulso. Eu tentando explicar a reação química e ela me interrompendo com uma pergunta que desmontou minha explicação. Foi a primeira vez que percebi que ela não era só "alguém do grupo".
Segundo flash: ela segurando um vaso de crisântemos no fim da aula, o sol batendo nos cabelos. Eu passei por ela fingindo não notar, mas fiquei lembrando do cheiro das flores o resto do dia.
Terceiro flash: a mão dela, pequena, pegando um becker da minha frente sem pedir. Ela disse "confia em mim" e misturou as substâncias como se fosse uma receita de bolo. O resultado ficou melhor do que o meu. Eu ri por dentro, mas não mostrei.
Essas cenas passavam uma atrás da outra, como se meu cérebro tivesse criado um álbum só para ela.
Rolei para o lado, pegando o celular. A foto do grupo ainda estava lá, Sarina sorrindo com as flores. Abri e fechei a tela três vezes antes de finalmente colocar o aparelho virado para baixo.
Por que eu estava guardando tudo isso? Não era só provocação, não era só amizade forçada. Havia alguma coisa crescendo ali que eu não sabia nomear.
Passei a mão no cabelo, respirei fundo e fechei os olhos.
— Não começa com isso, Kei — murmurei para mim mesmo. — Você sabe como isso termina.
Mas no fundo, eu já sabia: tinha começado, e não era eu quem controlava mais.
O primeiro sinal da manhã parecia anunciar que algo mudaria. O corredor estava mais cheio que o normal, e eu seguia Sarina, mantendo distância segura. Tentava agir normal, mas meu cérebro ainda reproduzia a sequência de flashes de ontem à noite. Inútil.
— Bom dia, Tsukishima — ela disse, sorrindo enquanto arrumava a mochila.
— Bom dia — respondi curto, sem olhar diretamente.
Ela franziu levemente a testa, desconfiada, mas não comentou. Ótimo, ela estava me observando, e eu detestava admitir isso.
— Então... pronto para a aula de química? — perguntou, tentando soar casual.
— Sempre. — Respirei fundo. — E você?
Ela sorriu, mas parecia medir cada palavra.
— Também... acho que estamos bem no projeto.
Fiz que não me importava. Mas meu olhar fugiu para as mãos dela, e por um instante, tentei ignorar o leve tremor que senti ao vê-la mexer no estojo.
Foi nesse momento que o alvoroço começou: a porta da sala se abriu e uma garota entrou, leve e sorridente, cabelos castanhos presos em um rabo de cavalo, mochila pendurada de lado.
— Oi! Eu sou Sakura Yamaguchi! — disse, cheia de energia. — O diretor me disse que posso estudar aqui até o fim do mês então muito obrigada por me receber!
Tadashi imediatamente foi ao encontro dela, tão desacreditado quanto eu, afinal de contas ela tinha vindo para ficar até o fim da férias e não para aprontar na escola.
— Sak! — Ele falou um pouco mais alto do que o esperado. Eu me levantei devagar, tentando parecer indiferente, e cumprimentei-a com um aceno contido:
— Oi.
Ela veio na minha direção, sorrindo, e sem cerimônia me abraçou, como sempre fazia.
— Tsuki, que bom que ficaremos na mesma sala.
Balancei a cabeça, isso ainda vai me dar dor de cabeça. Sakura piscou, achando que estava me entendendo, mas não sabia nada. Tadashi começou a tagarelar sobre o projeto de ciências, sobre como ela poderia entrar no grupo, e eu apenas tentei me concentrar no quadro-negro.
Não funcionou. O canto do meu olho a capturou observando a Sarina e, por algum motivo que me irritava admitir, percebi que me pegava medindo cada gesto dela, cada sorriso, como se estivesse tentando comparar.
— Então... vou me juntar a vocês no projeto? — Sakura perguntou, puxando-me de volta para a conversa.
— Hm. — Murmurei. Um som seco, suficiente para que ela entendesse que não era hora de brincadeiras.
Sarina, ao meu lado, pareceu perceber meu desconforto, os olhos verdes medindo minha reação. Ela não comentou nada, só se aproximou, deixando meu coração bater mais rápido do que deveria.
— Não vão me apresentar para ela? — A voz de Sakura foi irrelevante e Tadashi sorriu envergonhado.
— Claro, Sakura essa é a Sarina Satoji, nossa colega de turma e Sarina essa é a minha prima, Yamaguchi Sakura.
Sarina inclinou levemente a cabeça, estudando a nova colega com curiosidade e aquele sorriso discreto que sempre me desconcertava.
— Prazer em conhecer você — disse ela, estendendo a mão.
Sakura pegou a mão dela com energia, firme e confiante, como se estivesse acostumada a se impor em qualquer lugar.
— Prazer! Vamos nos dar bem nesses últimos dias.
Eu permaneci observando, me forçando a manter a postura normal, mas cada gesto delas parecia amplificar a atenção que eu dava à Sarina. Ela riu, um som leve, enquanto respondia algo rápido e amigável a Sakura. Não era nada demais, e ainda assim, eu senti um aperto no peito que não queria admitir.
Tadashi, empolgado, começou a explicar como poderiam dividir o projeto de ciências, tentando manter todos focados. Eu fiquei atrás dele, tentando ignorar a tensão que surgia entre a Sarina e eu. Ela parecia perceber meu esforço, mas não disse nada. Apenas lançou-me um olhar rápido de canto de olho — nada explícito, mas suficiente para me fazer querer me afastar e, ao mesmo tempo, não perder de vista.
Sakura, alheia à tensão silenciosa, continuava tagarelando sobre ideias para o projeto, rindo, mexendo nos livros e materiais, e eu só conseguia perceber como Sarina reagia a cada gesto dela. A garota parecia mais consciente do que eu esperava. E eu, tentando me concentrar nos cálculos e nas fórmulas, percebi que meu cérebro insistia em voltar àquele sorriso verde, à forma como ela segurava os frascos, e a sensação de que algo havia realmente mudado entre nós.
— Então... quem quer começar organizando os materiais? — Tadashi perguntou, ainda sorrindo, tentando conter a energia de Sakura.
Olhei para Sarina e, por um instante, não consegui decidir se a queria perto ou longe. Ela permaneceu imóvel, os olhos verdes fixos na Sakura, e o leve tremor que percebi em suas mãos denunciava que aquela demonstração de "direitos sobre mim" não havia caído bem.
— Para mim, tudo bem, contanto que eu fique com o Tsukki — disse Sakura, segurando meu braço de forma casual, mas o suficiente para deixar clara a sua intenção.
Sarina vacilou, e por um segundo, seu olhar se perdeu em algo que não consegui decifrar na hora. Frustração? Ciúmes? Irritação? Tudo misturado. Ela se afastou ligeiramente, mas ainda assim manteve a postura firme, respirando fundo enquanto voltava a prestar atenção na explicação do professor.
— Não, Sak, fica mais fácil já que você está morando lá em casa. O Tsukki fica com a Sarina — Tadashi disse, tentando acalmar a situação, mas com aquela firmeza que deixava claro que a decisão já estava tomada.
Eu apenas balancei a cabeça, tentando manter a expressão neutra, mas meu corpo denunciava o que eu não queria admitir: minha atenção estava completamente dividida. Observava cada movimento de Sarina, o modo como ela fechava os olhos por um instante e mordia o lábio inferior, tentando disfarçar.
Sakura, alheia à tensão silenciosa, continuou mexendo nos materiais do projeto, rindo, animada, sem perceber que havia bagunçado o equilíbrio que antes existia entre Sarina e eu.
— Excelente, agora podemos começar a organizar o experimento — disse o professor, tentando ignorar o clima carregado da sala.
Enquanto eu pegava os frascos e materiais, meus olhos não conseguiam deixar de seguir Sarina. Era irritante, perturbador e... inevitável.
Notes:
Eu tenho uma série de Haikyuu x reader publicada, ela se chama Haikyuu lovers, caso queiram ler.
Chapter 4: 4
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Sarina
Por que a vida tem que ser tão complicada?
Por que eu não poderia ser aquela para quem ele olha com um mínimo de apreço? Realmente é triste ver que seu primeiro amor não tem olhos para você.
Quando Yamaguchi sugeriu que eu e Kei ficássemos no mesmo grupo eu vibre, por dentro fiquei feliz e pensei que teríamos um momento só para gente, mas depois eu desviei o olhar rapidamente e me dei conta de que ele não afastou a menina que estava grudada em seus braços e que em momento algum pareceu desconfortável e foi aí que algo pesou em meu peito e uma luz se acendeu na minha mente. Se tratava da certeza. Certeza de que Tsukishima Kei nunca daria bola pra mim porque já tinha outra pessoa em seu coração e está tudo bem.
A vida é feita de escolhas, não dá para eu simplesmente obrigá-lo a gostar de mim porque eu sou apaixonadapor ele desde o fundamental.
— Pode ficar com ela Tsukishima, não tem problema, eu faço minha parte com o Yamaguchi aqui na escola. — Afirmei e o loiro me encarou sério, estava na cara que ele não gostou nenhum pouco da minha ideia.
— Sério? Eu gostei de você! — A castanha falou e dei meio sorriso, mas a voz de Tsukishima se fez presente de uma forma mais intensa.
— Sakura você nem é desse projeto, está aqui para ajudar, você vai fazer a sua parte com o Yamaguchi e eu ficarei com a Sarina e isso não é discutível.
O clima na mesa pesou e eu mantive meu olhar no quadro, não sei mais o que é esse relacionamento dele com ela, será que está me usando para fazer ciúmes ou só fugindo? eu não faço ideia, nós nunca fomos amigos a esse ponto para ele me contar esse tipo de coisa.
O silêncio que se seguiu foi pesado. O som das canetas riscando papéis, das folhas sendo viradas e do professor explicando os próximos passos do experimento parecia ecoar dentro da minha própria cabeça.
Meu coração acelerava cada vez que olhava de relance para ele. Tsukishima Kei estava lá, sentado à minha frente, o olhar fixo nos materiais do projeto, mas eu podia sentir que estava me medindo, analisando cada gesto meu.
— Então... por onde começamos? — Tadashi quebrou o silêncio, tentando aliviar a tensão.
— Eu posso separar os reagentes — falei, mantendo a voz firme, mas controlando o tremor que insistia em aparecer.
— Certo. Eu cuido dos frascos — Tsukishima respondeu, seco como sempre, mas dessa vez houve uma intensidade diferente no jeito que disse "eu", como se estivesse deixando claro que o projeto era nosso, e não da Sakura.
Sakura, alheia à tensão silenciosa, começou a arrumar o material ao lado de Tadashi, rindo, mas percebi que ela não entendia completamente o que estava acontecendo entre nós. Ela estava animada, mas não sabia que cada gesto meu e dele era observado, pesado e interpretado de um jeito que eu não conseguia explicar.
Enquanto organizávamos os frascos, notei a sutileza no jeito que Tsukishima segurava o béquer, ajustando o óculos, cada movimento parecia calculado, controlado, mas... havia algo diferente. Talvez fosse só minha imaginação, mas senti que ele estava ali de propósito, próximo demais para ser apenas casual.
Suspirei, afastando a mão de alguns frascos, e me concentrei na mistura. Se ele percebia meu desconforto, não demonstrava. Se ele estava tentando me provocar... bom, talvez ele estivesse conseguindo.
Olhei de relance para ele e, mesmo com toda a minha determinação de me afastar emocionalmente, não pude deixar de notar que a forma como ele mexia nos materiais me deixava hipnotizada.
E eu percebi, com um aperto no peito, que mesmo tentando aceitar que ele nunca me daria atenção, estava me deixando envolver de novo, porque não era só sobre o projeto, a Sakura ou Tadashi. Era sobre ele. Tsukishima Kei e o meu precipício absoluto.
E a cada segundo que ele permanecia ali, ao meu lado, eu sabia que meu coração ainda não estava pronto para desistir.
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Finalmente as aulas acabaram, a última sendo de história. Todas a provas marcadas para a semana seguinte e meu olhar focado naquela barraquinha de lanches brasileiros, eu estava louca para provar o tal do brigadeiro, tirei uma faixa da minha bolsa e prendi meus cabelos em um rabo baixo deixando um laço romântico, hoje está um pouco mais calor do que pensei e eu estou doida para chegar em casa e tomar um banho.
Pensar em doces, a correria dos estudos e na minha casa vazia me ajuda a não pensar no Tsukishima. Eu tinha até saído mais cedo para que eles não me vissem, eu não queria aguentar ele e a Sakura se agarrando no meio da rua. Peguei meu brigadeiro e sentei em uma das mesinhas com meu sketch nas mãos, ás vezes gosto de rascunhas o esboço de uma poesia bonita antes de ilustrar algumas flores ou o que vem nos meus sonhos, geralmente é assim que escrevo.
O último consistia em mim, estava na floricultura junto ao Tsukishima e ambos dançávamos enquanto os vasos tremeluziam e as pétalas voavam ao entorno de nós, foi assim que criei as pétalas incandescentes, um conto totalmente baseado no calor da pele dele e nos cabelos dourados.
Meu deus eu sou muito patética tem horas, o amor é algo realmente terrível, mas tudo bem, daqui há vinte e seis dias eu estarei de férias e ano que vem, olá primeiro ano do ensino médio do Karasuno! E até nunca mais Tsukishima!
Suspirei, a quem eu quero enganar, eu gosto muito dele, mas o tempo e a distância são os melhores remédios. Provei meu brigadeiro feliz da vida pelo gosto ser incrível e estava prestes a rascunhar um bolinho preto dançantes com confeitos verdes da cor dos meus cabelos quando o universo parecia gosta de cuspir na minha cara, pois em minha direção vinha Sakura, Tadashi e o próprio Tsukishima, esse com as mãos nos bolsos e o fone no pescoço, olhava tão direto e intensamente para mim que prendi minha respiração.
Acho que ele não gostou da minha fuga.
Prendi a respiração e tentei me esconder atrás do sketch, como se pudesse me tornar invisível. Mas ele já tinha me visto. Aqueles olhos dourados me atravessavam, e o coração disparado me dizia que ele percebeu a minha tentativa de escapar.
— Oi, Sarina. — A voz dele veio calma, quase neutra, mas havia uma intensidade no tom que me fez corar.
Sakura, sempre animada, já vinha tagarelando sobre o brigadeiro e sobre como queria experimentar tudo na barraquinha, completamente alheia à tensão entre nós dois. Tadashi ria, tentando acompanhar a energia dela, mas eu só conseguia olhar para Tsukishima.
— Você fugiu cedo hoje — disse ele, finalmente tirando os fones e me encarando de forma direta. Um simples comentário, mas o modo como disse parecia medir cada reação minha.
Fingi não me importar, mergulhando de volta no meu sketch. Mas ele se aproximou mais, parando ao meu lado, e pude sentir o calor que emanava dele, tão próximo que era impossível ignorar.
— Não precisa se esconder — murmurou, sem tirar os olhos de mim. Um sussurro que parecia soar só para mim, mas com um peso que fez minhas mãos tremerem ligeiramente.
Sakura, percebendo que algo rolava, arregalou os olhos e sorriu travessa:
— Nossa, Kei... vocês dois pareciam ter alguma coisa acontecendo aí, hein?
Ele apenas revirou os olhos, mas não se afastou de mim. Eu tentei me concentrar no desenho, mas cada traço parecia fraco perto da presença dele.
Respirei fundo, tentando me convencer de que eram só vinte e seis dias. Vinte e seis dias para me curar. Mas, no fundo, sabia que meu coração provavelmente já havia se rendido há muito tempo.
— Acho que você vai ter que me aguentar, Sarina — disse ele, com aquele tom quase provocador, como se estivesse me lembrando de que não sairia tão facilmente da minha vida.
E eu, incapaz de responder, apenas mordisquei o lápis, sentindo que o universo realmente gostava de me testar.
Chapter 5: 5
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Sarina
Tsukishima estava próximo demais. Perto o suficiente para que eu sentisse o cheiro limpo da blusa dele misturado ao aroma do chá que ele sempre prepara antes de começarmos o trabalho. Eu queria terminar logo. Queria guardar minhas coisas, agradecer educadamente e sair antes que meu coração me entregasse de novo.
Desde aquele encontro na barraquinha, onde eles atrapalharam meu brigadeiro, Kei tem passado bastante tempo comigo por causa do trabalho. A semana de provas já ficou para trás, agora estamos finalizando o projeto. E, ainda assim, ele não falou nada, não fez questão de me explicar sobre a Sakura. Está tudo certo, afinal não temos nada. Mas ele continua me olhando como se eu fosse escapar, como se houvesse algo que ele não consegue dizer.
— Finalmente estamos no fim. Nem acredito que essa é a última etapa do projeto. — Levantei os braços e me espreguicei. Estou sentada há tanto tempo na sala da casa dele que meu bumbum já deve estar quadrado. Sim, eu tenho vindo aqui sempre. O motivo: Tsukishima disse que seria mais confortável e teria menos interrupções. Ele tem razão. Sempre ficamos no máximo uma hora, terminamos e vou embora.
Só que hoje ele me pediu para ficar mais um pouco. Disse que queria revisar uns detalhes antes de entregar, mas a verdade é que estou cheia de ansiedade porque eu não sei o que esperar de Tsukishima.
Ele ajeitou os óculos, com aquele jeito calmo demais que sempre me irrita, e olhou para mim de lado.
— Está cansada? — perguntou.
— Um pouco. — respondi rápido demais, tentando não parecer nervosa.
Ele não disse nada. Só se levantou, foi até a cozinha e voltou com dois copos de chá fumegante. Colocou um na minha frente.
— Obrigada. — murmurei, olhando para o líquido quente.
O silêncio entre nós não era desconfortável como antes. Era pesado. Ele parecia procurar palavras que não vinha encontrando. Eu me sentia cada vez menor no sofá dele, tentando me convencer de que nada ia acontecer.
— Sarina... — a voz dele soou diferente, mais baixa, mais grave.
Levantei os olhos devagar.
— Hm?
— Você... vai mesmo para Karasuno ano que vem?
Meu coração deu um salto. Eu nunca tinha contado para ele. Como ele sabia?
— Quem te contou isso? — minha voz saiu quase num sussurro.
Ele apoiou o cotovelo no encosto do sofá, se inclinando mais para perto.
— Não interessa quem contou. Eu só queria saber se é verdade.
Eu fiquei muda, segurando a caneca como se fosse um escudo. Ele estava perto demais, o olhar dele estava intenso demais.
— É — finalmente respondi, baixo. — Vou.
Ele respirou fundo e encostou as costas no sofá de novo, mas não desviou o olhar.
— Entendi — disse apenas, mas o tom não era de quem "entende" alguma coisa. Era de quem estava mastigando palavras que não sabia como dizer.
Pousei a caneca no pires e fiquei esperando. O tic-tac do relógio era o único som na sala.
Tsukishima passou a mão pelos cabelos, desorganizando-os mais do que já estavam. Uma coisa tão simples, mas que eu nunca tinha visto ele fazer daquele jeito.
— Sabe... — começou, com a voz mais baixa, quase um sussurro. — É meio irritante quando alguém decide ir embora sem avisar. Principalmente quando essa pessoa passa semanas entrando na minha rotina.
— Irritante? — perguntei, tentando esconder o coração acelerado. — Por quê?
Ele deu um meio sorriso, mas não era arrogante como sempre. Era um sorriso torto, quase nervoso.
— Porque eu me acostumei. — ele disse, encarando o chão antes de voltar os olhos para mim. — Me acostumei a você aqui. No meu sofá. Na minha sala. Nos meus horários.
Eu não soube o que responder. Aquilo não era um pedido para eu ficar, nem uma confissão. Era só... Tsukishima sendo Tsukishima, do jeito mais torto possível.
Ele inclinou o corpo um pouco mais para o meu lado, apoiando um braço no encosto atrás de mim. Estava próximo demais agora, quente demais.
— E agora eu fico pensando... — ele continuou, os olhos semicerrados atrás das lentes. — Se você não está fugindo de mim de propósito.
— Fugindo? — minha voz falhou.
Ele aproximou o rosto só o suficiente para eu sentir o hálito de chá quente.
— Você acha que eu não percebo quando você sai mais cedo para não cruzar comigo? — perguntou, calmo, mas os olhos brilhavam. — Não é só o projeto que me faz ir atrás de você, Sarina.
Minha respiração ficou presa na garganta. Não era uma declaração ou um pedido e sim um jeito torto de dizer que eu importava.
— Tsukishima... — tentei falar, mas ele ergueu um dedo, como se quisesse me calar, e o baixou antes de me tocar.
— Eu não sei o que é isso. — disse por fim, mais baixo ainda. — Só sei que quando você fala em ir embora eu fico... irritado. Mais do que deveria.
O silêncio voltou, denso, cortando a sala ao meio. Eu olhava para ele, ele olhava para mim. Nenhum de nós sabia direito o que estava acontecendo, mas pela primeira vez desde que comecei a olhar para ele com outros olhos, senti que não era só eu tentando alcançar alguma coisa.
Chapter 6: 6
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Tsukishima
A casa estava silenciosa de novo. Sarina já tinha ido embora faz uns minutos, deixando no ar aquele cheiro de flor misturado com chá que grudava no estofado. Eu encostei a testa no encosto do sofá, os braços jogados para os lados.
Eu, Tsukishima Kei, conseguindo perder o controle da minha própria rotina.
Inacreditável.
O que eu fiz agora? Me aproximei dela sem ter um plano. Falei mais do que devia, disse que ela estava na minha rotina e o pior é que é verdade.
As "três tentativas".
Era isso que eu tinha prometido pra mim mesmo. Três formas discretas de me aproximar dela sem parecer idiota. Até agora? Zero. Eu só tinha jogado frases tortas, olhares. E hoje, pela primeira vez, eu quase disse mais. Quase.
Passei a mão no rosto, Sarina não fugiu. Não me cortou. Só ficou quieta, olhando, com aquele jeito de quem entende tudo e não diz nada, foi quase pior do que se ela tivesse me rejeitado de vez.
Ela é rápida. Sempre foi. E eu não sei se consigo esconder por muito tempo.
Principalmente porque tem outra coisa que eu ainda não contei.
O Karasuno.
O ingresso pro colégio já está na minha mesa há uma semana. Faltam poucos dias pra entregar os papéis. O mesmo lugar pra onde ela disse que ia. Eu ouvi ela comentando com Yamaguchi sem saber que eu estava perto. E desde então, esse segredo está pesando no meu bolso como uma pedra.
Se eu contar agora, ela vai achar que eu só estou indo por causa dela. E se eu não contar, quando descobrir sozinha, vai achar que eu estava escondendo. De qualquer forma, eu me ferro.
Levantei e fui até a janela. Do outro lado da rua, as luzes dos postes davam um tom dourado na calçada. Por um segundo, imaginei ela ali, rindo de alguma coisa boba, como sempre fazia quando acertava um experimento melhor do que eu.
Suspirei.
Preciso começar de algum jeito. As três tentativas. Algo simples. Um convite, um gesto, uma pergunta. E ver até onde isso vai. Antes que o tempo acabe.
Peguei o celular, sem pensar muito, e digitei uma mensagem curta:
"Sarina, amanhã a gente pode terminar a parte final aqui de novo? Prometo não irritar você."
Apaguei e reescrevi:
"Amanhã, aqui? Última parte do projeto."
Enviei. Se ela topar, é minha primeira chance real.
O celular vibrou quase instantaneamente.
"Pode ser. Mas sem brigadeiro dessa vez, hein?"
Sorri de canto.
Ela não está fugindo. Mas também não está vindo fácil. Ótimo. Eu gosto de um jogo difícil.
Voltei a me encostar na parede, o celular ainda na mão.
Amanhã vai ser minha primeira jogada. E dessa vez, eu não vou perder.
🏐📝🏐📝🏐📝
Arrumei a sala de estar pela terceira vez. Não que precisasse, mas eu precisava ocupar as mãos. O notebook aberto na mesa de centro, os gráficos do projeto prontos. Dois copos com chá gelado ao lado. Eu nunca fiz esse tipo de coisa pra ninguém. Não entendo por que estou fazendo agora.
Toquei no óculos, tentando ajeitá-lo, e respirei fundo quando ouvi a campainha.
— Pode entrar — falei, antes mesmo de abrir.
Sarina apareceu na porta com a mochila no ombro, os cabelos presos num coque meio torto e uma expressão meio ansiosa, meio decidida. O cheiro dela entrou junto, um misto de floricultura e papel novo.
— Oi — ela disse, pousando o estojo na mesa.
— Oi — respondi, tentando parecer indiferente. — Senta aí, já deixei tudo pronto.
Ela sentou ao meu lado, abrindo o caderno. Começamos a revisar os dados, um de cada vez, riscando, reescrevendo. No começo foi normal. Até que eu percebi que estávamos muito perto. O braço dela roçava no meu cada vez que mudava de página. O coração acelerou.
Era agora. Primeira tentativa.
Me inclinei um pouco mais para o caderno e falei baixo, de propósito:
— Você sabe que eu até gosto disso, né?
— Do quê? — ela perguntou, sem levantar os olhos.
— De... trabalhar com você. — Passei o dedo no gráfico. — Você faz eu me sentir desafiado. Pouca gente consegue isso.
Ela finalmente me olhou. Os olhos verdes encontraram os meus, desconfiados, e ela arqueou uma sobrancelha.
— Isso é um elogio ou uma provocação, Tsukishima?
Sorri de canto.
— Talvez as duas coisas.
Ela não desviou. Também não recuou. Apenas voltou para o caderno e rabiscou uma nota no canto.
— Bom saber. — Foi tudo o que disse, mas o tom era quase um sorriso.
Eu respirei fundo. Ela não fugiu. Não deu de bandeja. Exatamente como imaginei.
Continuei revisando, mas cada vez que ela se inclinava para anotar, eu me pegava olhando o jeito que uma mecha do cabelo escapava do coque e caía sobre o pescoço. Meus dedos coçaram para arrumar, mas eu me contive.
— Então... — Sarina ajeitou os papéis — você começa a introdução ou prefere que eu fale primeiro?
— Eu começo. — Respondi rápido demais. Ela arqueou a sobrancelha, desconfiada.
Enquanto passávamos pelas páginas, meu ombro roçava no dela de vez em quando. Pequenos toques, mas que me deixavam mais atento ao cheiro de sabonete do que às fórmulas no papel.
Em certo momento, ela ergueu o olhar e perguntou:
— Está nervoso?
— Com o quê? — fingi indiferença, virando a folha.
— Não sei... você está batendo o lápis na mesa desde que começamos. — O tom dela era leve, mas os olhos fixos em mim. Como se estivesse testando.
Encostei o lápis de propósito.
— Talvez seja você que esteja nervosa.
Ela riu, baixinho.
— Não mesmo.
E naquele instante, tive certeza de que se eu esticasse a mão, ela não se afastaria. Estava ali. Perto demais, esperando alguma coisa — ou talvez eu estivesse apenas imaginando.
Me inclinei para pegar a próxima folha, mas deixei minha mão próxima demais da dela, quase tocando. Ela percebeu. Não recuou, mas também não avançou. Ficou olhando, como se dissesse: "seja você a decidir."
Foi nesse segundo que a campainha soou de novo.
O som ecoou pela casa e Sarina piscou, quebrando o olhar. Eu fechei os punhos, engolindo a frustração. Ela se afastou momentaneamente.
— Tá quase pronto — murmurei. — Depois disso, a gente só apresenta. — Foi essa a minha tentativa de apaziguar a situação.
— Uhum. — Ela anotou mais alguma coisa. — E depois cada um segue seu caminho, né?
Aquilo me acertou mais fundo do que eu esperava.
Levantei devagar, já sabendo quem era na porta. E não me enganei. Sarina ia falar alguma coisa, qualquer coisa, quando ouvi o barulho do portão se abrindo.
— Tsukki! — a voz de Yamaguchi ecoou do corredor.
Sakura logo atrás, cantando alguma coisa.
Revirei os olhos, mas por dentro estava grato e irritado ao mesmo tempo. Eles sempre chegavam na hora exata.
— A gente nem bateu! — Sakura entrou com uma sacola na mão. — Trouxemos lanches.
Sarina fechou o caderno rápido demais, escondendo um sorriso que eu não consegui decifrar. Eu respirei fundo, ajeitei os óculos e tentei recuperar a compostura.
A sacola balançava no braço de Sakura enquanto ela tirava o casaco. Yamaguchi logo atrás, tentando equilibrar uma pilha de revistas.
— Trouxemos onigiri e refrigerante! — ela anunciou, largando tudo na mesa sem cerimônia.
O caderno de Sarina quase foi atingido pela sacola. Ela o puxou para perto de si no último segundo, ainda sorrindo com aquele ar contido. Eu só respirei fundo e contei até três.
— Valeu, mas a gente estava terminando um cálculo aqui — falei, mais seco do que pretendia.
— Ih, olha a cara do Tsukki — Tadashi riu, já acostumado. — Não fica bravo, a gente come quieto e tem para vocês também.
Sakura sentou do outro lado, cruzando as pernas.
— Relaxa, Kei. É só um lanche. Vocês dois parecem tão compenetrados...
Olhei de canto para Sarina. Ela também me olhava, como se dissesse "é agora que você perde a paciência?". Não dei esse gosto. Abaixei a cabeça de novo para o gráfico.
— Últimos ajustes — murmurei, arrastando o caderno mais para perto de mim e dela. — Me ajuda aqui, Sarina. Esse dado do gráfico de crescimento.
Ela inclinou-se para mim, os cabelos roçando no meu ombro. Um gesto pequeno, mas suficiente para eu sentir o cheiro doce dela de novo. Minha mão estava a poucos centímetros da dela no papel.
— Assim? — perguntou, a ponta do lápis riscando o eixo.
— Isso. — A voz saiu mais baixa do que eu esperava. — Perfeito.
— O que vocês estão cochichando aí? — Sakura se inclinou, curiosa.
— Projeto — respondi sem levantar os olhos. — Você e Tadashi cuidam do relatório escrito, lembra?
— Aham... — Tadashi sorriu, percebendo o clima. — Vamos lá, Sak. Deixa eles terminarem.
Sakura bufou, mas pegou uma revista da sacola e se distraiu. Yamaguchi começou a falar de qualquer outra coisa para puxar a atenção dela.
Eu aproveitei. Sem pensar muito, me inclinei um pouco mais para Sarina e falei só para ela ouvir:
— Ainda bem que você topou vir hoje. Eu queria mesmo terminar isso com você.
Ela piscou, surpresa, mas não se afastou.
— Por quê? — perguntou, o tom baixo, quase um desafio.
— Porque eu gosto... quando você tá perto. — A frase escapou antes que eu pudesse medir.
Ela ficou alguns segundos quieta, olhando para mim. Depois voltou para o caderno, escrevendo devagar.
— Então aproveita, Tsukishima — respondeu, com um meio sorriso. — Não vai faltar muito tempo para apresentar.
Meu peito apertou, mas o canto da boca subiu sozinho. Ela não fugiu. E de novo, não me deu tudo de bandeja. Perfeito.
Do outro lado da sala, Sakura mordia um onigiri sem perceber nada. Tadashi fingia que lia, mas eu sabia que ele estava vendo tudo.
A primeira tentativa estava feita.
A segunda precisava vir logo, antes que esse mês acabasse.
Chapter 7: 7
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Sarina
Eu praticamente não dormi nada. Meus pais estranharam minha cara pela manhã, mas o que eu posso fazer se a minha noite foi completamente roubada por sonhos com o Tsukishima? Em todos ele me beijava, a gente construía uma casa e tínhamos dois cachorros e um gato quando adultos. Eu estou surtando!
Como é que pode o garoto dos meus sonhos me dando bola? Eu nunca passei da fase das declarações e rejeições moderadas. Respirei fundo enquanto me arrumava para a escola. Hoje era o grande dia das apresentações e amanhã as condecorações... e tchau colégio antigo, olá férias!
Deixei meu cabelo bem volumoso e arrumado; as ondas estão impecáveis, assim como a minha franja, que parece ter saído direto de um filme de luxo dos anos 80. Ajeitei meu uniforme e me encarei no espelho. Confesso que estou me sentindo muito bonita.
Quando cheguei à cozinha, meus pais elogiaram minha aparência e eu fiquei toda envergonhada. Coloquei as meias, peguei a minha bolsa e respirei fundo. Estava na hora de apresentar o melhor trabalho de ciências em trio que essa escola já viu!
No caminho até a escola, o nervosismo só aumentava. Cada esquina que eu virava me fazia lembrar de Tsukishima no dia anterior, inclinado sobre o meu caderno, a voz baixa e calma. Será que ele vai estar tão sério quanto sempre ou vai me olhar daquele jeito de novo?
Quando entrei no prédio, vi alguns grupos terminando slides e decorando falas. O clima era de pré-apresentação: ansioso, agitado, cheio de cochichos. Apoiei minha bolsa na mesa e sentei, tentando não borrar o gloss incolor que servia mais para hidratação.
"Respira, Sarina. É só um trabalho", pensei, embora meu coração soubesse que era muito mais do que isso.
Daqui a pouco o Tsukishima chega, provavelmente com aquela postura de quem não se importa mas, na hora H, dá conta de tudo. E eu vou ter que ficar ao lado dele, fingindo normalidade, enquanto por dentro ainda estou vendo a gente com dois cachorros, um gato e uma casa.
Era agora ou nunca.
O barulho do corredor me fez dar um salto na cadeira. Eu estava mexendo pela quinta vez no slide final, mais para ocupar as mãos do que por necessidade. Cada vez que passava para o próximo, a imagem dos sonhos de ontem voltava: Tsukishima sorrindo, a gente com dois cachorros correndo no quintal. Meu rosto esquentava só de lembrar.
O estalo da porta me fez levantar os olhos. Ele entrou. Alto, uniforme impecável, a postura sempre calma demais para um dia de apresentação. Tsukishima apoiou o ombro no batente, varreu a sala com os olhos e então me viu. O mundo pareceu diminuir um pouco.
"Respira, Sarina... respira."
Ele caminhou até a mesa. O cheiro de sabonete misturado ao de papel novo invadiu o ar quando ele se inclinou para colocar a mochila no chão. — Trouxe a parte dos gráficos — disse em voz baixa, sem levantar totalmente o olhar.
Assenti rápido demais, sentindo minhas bochechas queimarem. — Ótimo... eu já revisei os slides — respondi, tentando parecer neutra.
Ele puxou a cadeira ao meu lado. O som do metal contra o piso ecoou mais alto do que deveria, pelo menos no meu peito. Cada vez que ele se aproximava, eu lembrava do sonho. O braço dele roçou de leve no meu quando estendeu o laptop. O toque foi quase nada, mas pareceu tudo.
— Esse aqui é o resultado do questionário... — Tsukishima começou, abrindo as planilhas.
Eu me forcei a olhar para a tela, não para o perfil dele. O maxilar marcado, os olhos atrás dos óculos focados nos números. Era impossível não imaginar o que eu tinha sonhado.
— Ficou bem organizado — consegui dizer, a voz saindo mais baixa do que eu queria.
Ele soltou um "hm" curto, típico, mas havia algo no canto da boca dele que não era costumeiro: um quase sorriso, contido, como se ele estivesse tão consciente da nossa proximidade quanto eu.
Ficamos assim alguns minutos, revisando o material lado a lado. A sala, ainda meio vazia, cheirava a nervosismo. Dava para ouvir grupos treinando suas falas. Eu mordi o lábio, ajeitei o cabelo de novo e conferi o tempo no celular.
O clima pré-apresentação estava pesado, mas diferente. Não era só ansiedade pelo trabalho — era também esse campo invisível entre mim e ele, cheio de coisas que eu sonhei, coisas que ele não diz, e um monte de "e se..." que eu não tenho coragem de falar em voz alta mas quero tanto que chega a doer.
Eu ajustei pela terceira vez o laço da minha blusa.
Ao meu lado, Tsukishima revisava o gráfico com a ponta do dedo no touchpad, mas a postura dele estava diferente. Ele não estava apenas concentrado; estava inclinado para mim, próximo o bastante para que eu sentisse o calor do braço dele e ouvisse o ritmo calmo da respiração.
— Você decorou a introdução? — perguntou, mas a voz soou mais baixa, quase íntima.
Assenti.
— Decorei sim. Você?
Ele virou a cabeça devagar, os olhos dourados passando pelos meus. — Acho que sim... mas talvez eu precise que você me ajude a lembrar — disse num tom que não parecia só sobre a apresentação.
Meu coração deu um pulo. A sala estava vazia; só nós dois e o som dos ventiladores. Eu estava prestes a responder — qualquer coisa — quando ele pousou a mão ao lado do meu caderno, tão perto que nossos dedos quase se encostaram.
— Sarina... — começou.
O nome saiu diferente. Não era "Sarina" neutro, era "Sarina" quente, pesado, quase um chamado que fez minha nuca arrepiar.
Antes que eu pudesse entender, a porta se abriu de repente.
— Bom dia! — a voz animada de Sakura cortou o ar, seguida pelo riso fácil do Yamaguchi.
— Oi, Sarina! Oi, Tsukki!
Eu recuei um pouco na cadeira, endireitando as costas e tentando parecer concentrada na tela. Tsukishima recolheu a mão de imediato, pigarreando e ajeitando os óculos como se nada tivesse acontecido.
— Trouxemos café pra vocês — anunciou Yamaguchi, entrando com dois copos. — Parecem tensos.
Sakura passou por trás de nós, curiosa, e se apoiou na mesa.
— Nossa, vocês já estão prontos? Uau... que dupla eficiente! — disse, olhando ora para mim, ora para ele, com um sorriso que eu não soube decifrar.
— Só revisando os detalhes finais — respondeu Tsukishima, a voz de volta ao tom usual.
Eu respirei fundo e forcei um sorriso, fechando meu caderno com calma. Por dentro, ainda sentia o coração acelerado pelo quase-momento que tinha acabado de evaporar.
Yamaguchi sentou numa das cadeiras, abrindo a mochila, enquanto Sakura tirava fotos do cartaz.
🏐📝🏐📝🏐📝
O coração parecia saltar do peito enquanto nos posicionávamos em frente à sala. O projetor ligado, o slide inicial brilhando, e toda a turma olhando. Respirei fundo e olhei para Tsukishima ao meu lado. Ele estava sério como sempre, óculos ajustados, mãos cruzadas atrás das costas, mas seus olhos não me largavam.
— Prontos? — sussurrei, quase inaudível.
— Sempre — respondeu ele, a voz baixa, mas firme.
Eu quase engasguei com a intensidade do olhar dele. Era como se ele estivesse me desafiando a não me perder na apresentação — e, ao mesmo tempo, me chamando para perto de uma forma que eu não entendia. Tadashi também parecia nervoso, por outro motivo é claro, principalmente quando os pediu para começar a falar o que foi realmente inesperado.
— Bom dia, turma! — começou Yamaguchi, sorrindo para todos mesmo que fosse o mais tímido. — Nós dividimos o projeto em partes para ficar mais organizado. Eu vou explicar a metodologia e como coletamos os dados.
Começamos com a introdução. Cada frase falada, sentia Tsukishima atento, inclinando-se ligeiramente, o braço quase roçando o meu quando ajustava os slides. Meu rosto queimava, mas eu mantive a postura. Ele percebeu e deu um leve aceno de aprovação, só para mim.
Tadashi começou a falar sobre os procedimentos, mostrando fotos e tabelas. Minha atenção estava dividida entre os gráficos e o jeito que Tsukishima acompanhava cada movimento meu. Quando Yamaguchi terminou, eu assumi a palavra:
— Nosso projeto analisa o crescimento de plantas em ambientes controlados — comecei, gesticulando para os gráficos. — E como variáveis de luz e água afetam seu desenvolvimento.
Tsukishima completou, firme e direto:
— Os resultados mostram que pequenas mudanças na intensidade luminosa alteram significativamente o crescimento das espécies estudadas.
— Além disso, — Yamaguchi continuou, — monitoramos a frequência de rega e a temperatura ambiente para garantir que os experimentos fossem consistentes. Acreditamos que essas medições ajudam a comprovar a hipótese inicial.
O tom de Tsukishima era sério, mas havia algo no jeito que ele me olhava ao falar que me desestabilizou completamente. Cada vez que nossos olhares se encontravam, eu sentia o calor subir.
Quando passamos para a demonstração prática, ele ficou de frente comigo para ajustar os instrumentos. Minhas mãos tremiam levemente. Ele percebeu, desviou o olhar para o gráfico, mas não disse nada. Era silencioso, mas intenso.
— E, por fim, — ele concluiu, olhando para toda a turma agora, — nossas plantas confirmam a hipótese inicial: pequenas variações fazem grande diferença.
— Exatamente! — Yamaguchi acrescentou com entusiasmo, mostrando os resultados finais. — Conseguimos documentar todas as alterações de forma clara e objetiva.
A sala explodiu em aplausos. Meu peito subiu e desceu rapidamente. Tsukishima se afastou um pouco, mas não completamente. Seu braço ainda tocava o meu ombro quando me virou para a última parte do slide, e eu senti que, apesar de tudo, ele queria que eu visse isso só conosco.
Quando finalmente nos afastamos da frente da sala, Tsukishima se virou para mim com aquele olhar calmo, mas carregado de algo que eu não sabia nomear.
— Bom trabalho — disse, apenas isso.
— Obrigada — murmurei, corando. — Você também.
Chapter 8: 8
Chapter Text
Sarina
Eu só queria chorar.
O que foi que eu fiz para merecer isso? A cabeça latejava de tanto segurar as lágrimas, como se cada batida fosse uma lembrança me martelando. Ter o coração quebrado desse jeito doía mais do que eu tinha coragem de admitir — mas, no fundo, eu repetia para mim mesma que ia passar.
Encarei a estrada com o corpo pesado e a mochila mais pesada ainda. Sabia que só voltaria a pisar em Miyagi quando as aulas do Karasuno começassem. E estava tudo bem. Não precisava de mais problemas além dos que já tinha. Era estranho pensar que tudo parecia estar indo tão bem até agora.
Dois dias antes, depois da apresentação de ciências...
Os Yamaguchis estavam eufóricos. Tinham sugerido comemorar com bolinhos da cantina pelo 10 iminente e eu aceitei sem pensar duas vezes. Aquela injeção de dopamina — essa felicidade que só uma vitória traz — me fez decidir que iria me declarar de vez para Tsukishima. Seria a sexta e última tentativa.
Eu planejei tudo. E como teria que aparecer na escola no dia seguinte, faria isso amanhã. Mas hoje... hoje eu queria deixar pistas. Queria ver como ele reagiria.
Chegamos à cantina felizes, como se a tensão da apresentação tivesse evaporado. Até Sakura, que não parava de tocar nele, parecia uma boa pessoa naquele momento. Mas estava claro que ela e Kei tinham alguma história. Nunca o vi permitir que alguém o tocasse com tanta intimidade.
E esse é mais um dos motivos para tudo acontecer amanhã. Eu não quero ir mais além sem descobrir quem, afinal, Sakura é para Tsukishima.
A cantina estava cheia de risos e o aroma de bolinhos recém-assados deixava o ambiente aconchegante. Yamaguchi parecia radiante, mal conseguia parar de falar sobre o 10 na apresentação. Eu sorria junto, tentando me contagiar pela alegria dele, mas no fundo meu foco estava em outro lugar: Tsukishima.
Enquanto ele conversava com alguns colegas, eu deixei que o olhar deslizasse até ele de maneira quase casual, apenas para observar sua reação. Movi um pouco os cabelos para trás, de forma natural, e sorri baixinho ao perceber que ele ergueu uma sobrancelha — sutil, mas o suficiente para notar que me havia percebido.
— Ei, Sarina, pega um bolinho também! — Yamaguchi estendeu a bandeja para mim.
Eu assenti e alcancei o doce, segurando-o de maneira ligeiramente próxima ao meu corpo, deixando escapar um pequeno suspiro de satisfação. Não era nada de mais, mas era um gesto natural que eu esperava que ele notasse.
Enquanto nos sentávamos à mesa, espalhei alguns materiais e anotações para que parecessem deixados "acidentalmente" perto dele. Meu coração acelerou quando Tsukishima se inclinou ligeiramente, aparentemente curioso sobre o que eu estava fazendo. Mantive a postura relaxada, o olhar aparentemente distraído, mas deixei que meus olhos profundos o encontrassem por alguns segundos antes de voltar para o bolinho na mão.
— Vocês dois brigam tanto quanto comem, hein? — Yamaguchi riu, quebrando o clima silencioso.
Eu apenas ri junto, fingindo desinteresse, mas dentro de mim cada gesto, cada olhar, cada pequeno movimento era calculado. Quando Tsukishima se recostou na cadeira e cruzou os braços, eu inclinei ligeiramente a cabeça, deixando que a luz da cantina refletisse em meus olhos profundos de forma a chamar sua atenção, sem dizer uma palavra sequer.
Ele desviou o olhar rapidamente, mas meu coração já havia disparado. Pequenas faíscas de curiosidade haviam sido acesas.
Sakura se aproximou e tocou levemente o braço dele, rindo de algo que ele disse. Ele não recuou, mas percebi um leve franzir de testa quando me olhou por um instante, como se estivesse comparando a cena comigo. Sorri discretamente, pegando outro bolinho como se fosse casual. Pequenas pistas, pequenas tentativas — amanhã seria o dia em que eu me revelaria de verdade.
E, por enquanto, isso já era suficiente.
🏐📝🏐📝🏐📝
O fim daquela comemoração foi o suficiente para que eu decidisse seguir para a biblioteca. Aproveitei para entregar alguns livros e, como era o último dia, me voluntariei para ajudar a arrumar a bagunça que alguns estudantes costumavam deixar: livros fora do lugar, páginas viradas, pequenos detalhes que ninguém mais notava.
Enquanto organizava as prateleiras, senti uma leve satisfação. Tudo estava em ordem, tudo parecia sob controle, e minha mente divagava sobre o que mais poderia acontecer naquele dia.
Foi quando a porta rangeu ao ser aberta. Por um instante, não dei atenção. Provavelmente era apenas algum aluno que veio atrás de uma obra esquecida.
Mas então aquela voz soou. Aquele costumeiro "Hm" carregado de arrogância e satisfação. Aquele jeito de respirar, tão familiar. Meu coração acelerou, e não houve dúvidas: Tsukishima estava atrás de mim.
Dessa vez, estávamos sozinhos. A biblioteca, antes cheia de murmúrios e passos, parecia agora envolver-nos em um silêncio quase palpável. Cada estante, cada livro, criava um espaço íntimo demais, como se o mundo lá fora não existisse.
Ele se aproximou com passos lentos, medidos, e encostou a mão na prateleira ao meu lado, tão perto que eu podia sentir o calor que parecia impossível de emanar dele. O olhar dele, frio e analítico, percorreu-me dos olhos aos pés. Por um instante, senti o peso de toda a arrogância e a curiosidade dele me atravessar.
— Então... você decidiu se voluntariar — disse ele, a voz baixa, quase provocativa. — Interessante.
— Só estou ajudando — respondi, mantendo o tom casual, enquanto organizava os livros, mas sentindo o corpo reagir a cada passo dele mais próximo.
Ele se inclinou levemente, como se fosse observar melhor o que eu fazia, e então cruzou os braços, encostando-se à estante de frente para mim. O espaço entre nós era pequeno demais para ser confortável, mas grande demais para parecer proposital. E, mesmo assim, o ar parecia carregado, cada respiração minha reverberando de forma quase audível.
— Você gosta de se destacar, não é? — continuou, o tom frio contrastando com o brilho de curiosidade nos olhos. — E parece gostar de me chamar atenção também.
Senti um arrepio percorrer a espinha. Meu olhar se encontrou com o dele, firme, profundo, e por um instante a biblioteca desapareceu. Havia apenas ele, o silêncio, e a sensação de que qualquer movimento poderia mudar tudo.
— Talvez... — murmurei, baixinho, deixando que minhas palavras fossem tão sutis quanto os gestos que ele já começava a notar.
Aquele "talvez" foi suficiente para que Tsukishima arqueasse uma sobrancelha, o canto dos lábios se curvando levemente em um gesto que não era sorriso, mas não era desdém completo. Um convite silencioso à próxima movimentação e eu estou começando a surtar.
Tsukishima se aproximou mais, e eu senti cada passo dele como se o chão tivesse encolhido sob meus pés. Instintivamente, forcei minhas costas contra a estante de livros, como se pudesse me ancorar, mas era impossível ignorar a proximidade. Nunca fiquei tão perto dele.
Ele não encostou em mim. Não precisava. O simples fato de estar tão perto fazia cada músculo do meu corpo reagir. Um frio estranho percorreu minha espinha, misturado a uma eletricidade que eu não conseguia controlar.
Ao invés de tocar-me, elevou a mão com naturalidade e puxou o livro que estava na prateleira acima da minha cabeça. O movimento era simples, quase despretensioso, mas parecia calculado.
— Esse título deveria estar na outra prateleira — disse, a voz baixa, mas clara, carregada daquele costumeiro tom de correção e desdém que, de alguma forma, me fazia prender a respiração.
Todos os meus músculos travaram com a proximidade. Minhas mãos, ainda segurando outro livro, tremeram levemente, e por um instante senti o ar rarefeito, como se cada respiração dele roubasse espaço dentro da biblioteca.
Ele deixou o livro na minha frente, os dedos afastados de forma impecável, mas não conseguia parar de notar o efeito que causava. Meu olhar se prendeu ao dele, tentando manter a compostura, mas algo dentro de mim estava totalmente fora de controle.
— Ah... certo — consegui murmurar, arrumando o livro com mãos que sentiam cada centímetro da presença dele ao meu lado.
Tsukishima inclinou levemente a cabeça, os olhos castanhos percorrendo-me da cabeça aos pés com aquela precisão gélida, mas havia um brilho curioso, quase imperceptível, que fazia meu coração disparar ainda mais.
O silêncio que se seguiu foi pesado, mas não desconfortável — pelo menos para ele. Para mim, era quase insuportável. Cada centímetro entre nós parecia carregar muitas das minhas expectativas e uma tensão que nenhum de nós precisava dizer em palavras.
Senti meu coração acelerado enquanto meus músculos ainda permaneciam tensos, pressionados contra a estante de livros. Cada respiração dele parecia ecoar dentro de mim, cada movimento mínimo atraía minha atenção como se fosse impossível desviar o olhar.
Tsukishima permaneceu ao meu lado, a mão ainda segurando o livro que havia retirado da prateleira. Não havia pressa em se afastar, e a proximidade — apesar de silenciosa e contida — era quase sufocante. Eu sabia que precisava pensar rápido. Esse era o momento perfeito. Se eu queria respostas sobre Sakura, não poderia simplesmente perguntar; teria que soar natural, quase casual, sem parecer invasiva.
— Ei... — comecei, tentando manter o tom leve, quase distraído enquanto organizava os livros à minha frente. — Eu reparei que você e a Yamaguchi Sakura... vocês parecem se conhecer bem. Sempre estão bem à vontade um com o outro... — Minha voz quase sussurrou, mas firme o suficiente para que ele ouvisse.
Ele inclinou levemente a cabeça, os olhos fixos nos meus, percorrendo-me com aquela intensidade habitual. Um silêncio pesado pairou no ar, como se ele estivesse analisando cada nuance da minha pergunta.
— Hm. — Ele fez aquele som típico, carregado de indiferença e curiosidade, mantendo o olhar frio. — Por que quer saber?
Mantive o sorriso discreto, respirando fundo e tentando soar casual, como se fosse apenas curiosidade passageira.
— Só... fico curiosa. Vocês parecem próximos, é tudo. — Meu olhar se manteve nos livros, mas os olhos dele continuavam fixos em mim, e eu senti cada centímetro daquela análise silenciosa.
Ele suspirou levemente, afastando o livro e deixando-o na prateleira ao lado. A distância entre nós permaneceu mínima, mas ele não recuou.
— Sakura é apenas... alguém que compartilha interesses. Não precisa se preocupar com isso.
Senti meu corpo relaxar um pouco, mas um calor diferente tomou conta de mim — não era apenas alívio, era a sensação de que ele estava me permitindo entrar um pouco no círculo dele. E, mesmo com a frieza dele, algo na forma como pronunciou aquelas palavras parecia quase... pessoal. Mesmo assim, aquele fio de tensão que me apertava o peito não sumiu — apenas se acomodou no fundo, como uma brasa que não se apaga.
— Entendi — murmurei, levantando os olhos para encontrá-lo. — Obrigada.
Ele arqueou uma sobrancelha, e por um instante, algo que não era desdém, mas também não era amizade, brilhou no olhar dele. Um desafio silencioso, como se dissesse que eu ainda teria que provar que merecia cada centímetro de atenção.
Ele guardou o livro na prateleira com um estalo suave e deu um passo para trás, abrindo espaço para eu respirar de verdade. Por um segundo, nossas mãos quase se tocaram quando fui ajustar outro volume.
— Obrigada por... — comecei, mas engoli o resto, preferindo não completar a frase.
Ele fez aquele "hm" habitual e virou-se um pouco, como quem já tinha decidido ir embora, mas não antes de lançar um último olhar por cima do ombro. — Não se sobrecarregue com isso. — Não era exatamente um conselho, mas soava como uma forma de despedida.
— Vou tentar — respondi baixinho, forçando um sorriso antes de me abaixar para pegar mais um livro no chão.
Quando ergui a cabeça, ele já tinha saído, a porta da biblioteca fechando devagar atrás dele. O silêncio voltou, desta vez sem a presença dele para ocupá-lo, e só então percebi o quanto minha respiração estava acelerada.
Terminei de arrumar tudo no meu próprio ritmo, empilhando os últimos volumes no carrinho. Mesmo com a resposta dele sobre Sakura ainda ecoando, as dúvidas não me deixavam. Era como se tivesse ganho uma peça do quebra-cabeça, mas o desenho ainda estivesse incompleto.
Recolhi minhas coisas e saí da biblioteca quando o céu já começava a ficar alaranjado do lado de fora. O ar frio do fim de tarde bateu no meu rosto e me fez fechar os olhos por um instante. "Amanhã", pensei. "Amanhã eu descubro o resto."
E com esse pensamento, segui meu caminho para casa, deixando para trás o cheiro de livros antigos, o calor sufocante da proximidade dele e uma pontada de ansiedade pelo que viria a seguir.
🏐📝🏐📝🏐📝
O vento frio do fim da tarde fazia o uniforme balançar de leve, e cada passo parecia mais longo do que o anterior. A rua estava silenciosa, só alguns carros passando ao longe, mas minha cabeça era um redemoinho.
A voz dele, o olhar, a proximidade... tudo voltava em flashes. Eu queria acreditar na resposta que Tsukishima deu sobre a Sakura, mas não conseguia. Era curta demais, vaga demais. Se fosse apenas uma colega, por que ele permitiria tanta intimidade?
Segui andando com as mãos no bolso, o coração num misto de esperança e frustração. "Será que eu não estou vendo coisa onde não existe?", pensei, chutando uma pedrinha pelo caminho. Mas não adiantava: cada vez que lembrava do jeito como ele me olhou na biblioteca, sentia um calor estranho subir pelo corpo.
Quando cheguei na porta de casa, respirei fundo. O cheiro conhecido do lar, os sons familiares do bairro, tudo isso deveria me acalmar, mas só servia para aumentar a ansiedade. Entrei devagar, subi direto para o meu quarto e fechei a porta atrás de mim.
Lá dentro, larguei a mochila no canto e me joguei na cama, os olhos fixos no teto. Era como se a cena na biblioteca estivesse gravada no meu corpo. Sentei, abracei os joelhos e encostei o queixo neles.
— Chega — murmurei para mim mesma. — Não dá mais para enrolar.
Seis tentativas, seis formas diferentes de chegar até ele. Sutilezas, indiretas, olhares. Eu estava exausta. Talvez eu tivesse feito tudo errado. Talvez eu estivesse me sabotando. Mas amanhã... amanhã seria diferente.
Puxei meu caderno, abri numa página em branco e comecei a rabiscar ideias, mas as palavras saíam tortas. Nenhum roteiro parecia bom. Suspirei e fechei o caderno. "Quer saber? Vou falar. Do jeito que sair. Sem plano, sem pistas, sem jogos."
Deitei de costas, respirando fundo, sentindo a coragem se formar devagarinho no meio do medo. O coração acelerava só de imaginar, mas havia uma paz nova em tomar essa decisão. Amanhã, sem máscaras, sem voltas, eu diria a ele o que sinto.
E com esse pensamento, deixei os olhos fecharem, os últimos raios de sol entrando pela janela e me cobrindo como um lembrete silencioso de que o dia seguinte chegaria mais rápido do que eu pensava.
E foi então que tudo mudou...
Naquela manhã eu acordei um pouco mais temerosa do que o dia anterior, como se meu corpo todo sentisse que havia algo errado e de fato devia haver mesmo. Eu fui para escola meio amuada, mas tudo estava bem, recebemos as notas, ficamos felizes comemoramos, ajudamos a limpar nossa sala e os corredores da escola, assim como todos os outros os alunos e quase não vi Tsukishima, quando ele apareceu ainda estava com cara de entediado, ele havia limpado os apagadores junto a Sakura, eu sorri para ele de maneira discreta que retribuiu minimante com um olhar, quando tudo acabou Tadashi já estava ao meu lado.
— Hei Yamaguchi aconteceu alguma coisa? — Questionei e ele negou.
— Não, nós apenas treinamos bastante ontem, ainda bem que tudo acabou. — Ele sorriu e assenti.
— Eu queria falar com o Tsukishima, será que ele está bem?
— Ah está sim o Tsukki só é complicado as vezes. — Deu de ombros, apesar de ser o melhor amigo de Kei sinto que eles esta sendo sincero.
Então me afastai e tomei coragem era a última vez que eu faria isso Tadashi me informou que ele estava na sala de ciências e eu fui até lá, há essa hora está vazia já que todos os alunos estão pelos pátios devido ao encerramento, Eu não bati na porta apenas abrir e sorri, quando fechei e e finalmente olhei para frente meu corpo travou, meu coração disparou e senti até meu ouvidos zumbirem.
Ali na minha frente o garoto para quem eu planejava me declarar estava beijando a prima do seu melhor amigo.
Tsukishima demorou a me perceber assim como Sakura e eu apenas abri a porta atrás de mim e passei.
— Droga. — A voz do loiro ecoou e eu continuei andando. — Satoji espera.
Ele disse conforme vinha na minha direção, eu não queira escutá-lo, peguei as minhas coisas e continuei caminhando com ele atrás de mim, mas quando tentou me tocar eu bati em sua mão.
Era agora ou nunca, a ultima tentativa. Mesmo com os olhos um pouco marejados eu me virei para ele olhando em seus olhos castanhos intensos que mais pareciam âmbar.
— Não. Eu perguntei pra você. Não é legal brincar com o coração dos outros. — Fui direta. — O pior é que e continuei gostando de você, sabe Tsukishima eu realmente estou apaixonada por você, mas agora já era.
— Satoji...
— Não apenas me deixa em paz, seja lá qual for a sua explicação eu realmente não quero mais saber, afinal de contas você não é nenhum idiota e sempre foi perceptivo demais então deve ter entendido que eu gostava de você e poderia apenas ter dito um não ou deixado as coisas claras.
Eu peguei as minhas coisas e segui em frente, ele não tentou me parar ou sequer se explicar, então ou não tinha explicação ou ele usou o jeito Tsukishima de ser e no fundo prefiro assim.
Pois a partir de hoje eu não vou vê-lo nunca mais, o Karasuno me espera e eu vou ter tempo para me recuperar.
Segui para a minha casa e assim que abrir a porta dei de cara com a minha mãe que estava de folga, eu apenas corri até ela e a abracei.
— Mãe... — minha voz se afogou no meio do calor materno enquanto eu chorava. Ela não me questionou; apenas me abraçou de volta, fazendo carinho nos meus cabelos.
No fundo, ter o primeiro amor quebrado sempre vai doer. Mas, de algum jeito, eu sei que vou superar.
Chapter 9: 9
Chapter Text
Tsukishima
Yamaguchi estava envergonhado de novo. Tudo porque eu não paro de provocar o rei solitário no treino - fazer o quê se o Tobio é realmente insuportável? É quase um vício testar os limites dele, ver até onde posso cutucar antes dele explodir.
Mas, para falar a verdade, nem isso me distrai do que realmente me incomoda.
Faz exatamente um mês e meio que as aulas começaram no Karasuno e, até agora, nada dela. Desde aquele dia... desde que Sarina me viu beijando a Sakura dentro da sala de química, ela nunca mais falou comigo. E eu nunca mais a vi.
Maldita hora que resolvi demonstrar que não me importava, mesmo com ela ali. Aquilo não foi por acaso, e eu sei. Foi meu jeito torto de lidar com algo que eu não entendo nem em mim. Mas deu errado - óbvio.
Agora estou no Karasuno, assim como ela. Ou pelo menos eu acho. Não há um único dia em que eu não a procure entre as vozes do ginásio, nos corredores do prédio novo, nas mesas do refeitório. Sempre que alguém com cabelo comprido passa, meu coração dá um pulo antes de eu perceber que não é ela.
Coloquei os fones no pescoço e ajeitei os óculos. O ginásio estava cheio, Yamaguchi puxava assunto para quebrar o silêncio constrangedor.
— Você vai ficar cutucando o Tobio até quando, Tsukki? — perguntou, meio rindo, meio sério.
— Até ele aprender a não ser tão dramático — respondi seco.
Mas minha mente não estava no Tobio. Estava em Sarina. Na última vez que a vi, ela segurava o caderno contra o peito, o olhar magoado — e eu fingindo que nada acontecia.
Quarenta e cinco dias. Um mês e meio inteiro sem nem um vislumbre dela. E isso me incomoda mais do que eu gostaria de admitir.
Respirei fundo e bati a bola no chão, forte.
— Onde você está, Satoji? — murmurei baixo demais para Yamaguchi ouvir.
Ele percebeu, no entanto, que eu estava distante.
—Tá tudo bem? — perguntou.
Assenti com a cabeça, sem olhar.
— Sempre estive — menti.
Mas por dentro, a sensação era de que algo tinha ficado pela metade.
O treino acabou mais cedo do que eu esperava. O professor Takeda resolveu encurtar a parte física para não quebrar ninguém antes do amistoso do fim de semana. Eu e Yamaguchi saímos juntos do ginásio, os dois suados e famintos, o sol já se pondo atrás do portão do Karasuno.
— Bora na conveniência? — Yamaguchi perguntou, ainda jogando a toalha no ombro. — Quero ver se chegou a edição nova das revistas.
— Vamos — respondi, automático. Era o mesmo caminho de sempre, o mesmo cheiro de asfalto quente e vento úmido de final de tarde. Mas, por algum motivo, cada esquina me lembrava dela.
Yamaguchi ficou falando do treino, de como o Tobio estava surtando com o Hinata, de como os calouros estavam se saindo bem. Eu ouvia pela metade, respondendo com "hm" ou "é".
Quando chegamos, a campainha da porta fez aquele barulhinho familiar. O ar gelado da loja bateu no rosto. Yamaguchi foi direto para o fundo, onde ficam os mangás e revistas de herói, enquanto eu fui até a geladeira pegar meu suco favorito.
Estiquei a mão para a garrafa e, sem querer, me lembrei de como Sarina fazia exatamente o mesmo gesto na floricultura — segurando o vaso de crisântemos. Mordi o lábio, irritado com a memória.
— Olha, Tsukki, chegou o volume dez! — Yamaguchi apareceu do nada, empolgado, mostrando a capa brilhante.
— Legal — murmurei, mais seco do que devia.
Ele franziu a testa.
— Você anda distraído, hein? É por causa dela?
Levantei o olhar devagar.
— De quem você está falando?
— Você sabe — ele disse, com aquele sorriso de canto. — Desde que a Sarina sumiu você ficou diferente.
Desviei, pegando um pacote de onigiri só para ter o que fazer com as mãos.
— Não viaja, Yamaguchi.
— Tá bom, tá bom. — Ele ergueu as mãos, rindo. — Mas, se quiser falar, eu tô aqui.
Ficamos alguns segundos em silêncio, só o som do freezer da loja preenchendo o espaço. Yamaguchi voltou a folhear a revista, e eu fiquei parado, olhando para fora, para o reflexo das luzes da loja no vidro.
Será que ela também vinha aqui depois das aulas? Será que eu teria coragem de falar alguma coisa, se encontrasse?
Respirei fundo, paguei meus itens e saí para o ar morno da rua. Yamaguchi me alcançou, ainda falando do enredo do mangá. Eu só pensei: "Você precisa parar de fugir, Kei."
Mas eu ainda não sabia como.
Depois daquele momento eu segui para casa, com meus pensamentos ainda nela. Sakura também iria estudar conosco, mas estava na sala ao lado.
Quando cheguei em casa cumprimentei a todos e subi para o quarto. Queria apenas me enfiar no meu mundo e colocar ordem no turbilhão que minha cabeça estava desde cedo.
Mal tinha aberto a mochila para separar os materiais quando uma sombra apareceu na porta.
— Eu não sabia que tinha voltado — murmurei sem levantar a cabeça.
— Vim fazer uma visita rápida depois da faculdade, mas volto amanhã — respondeu Akiteru, encostando o ombro no batente. Ele não entrou; só ficou ali, como se tivesse medo de quebrar algo se avançasse. — Kei... eu sei que você provavelmente não quer ouvir conselhos ou sermões, mas às vezes é necessário correr atrás das pessoas.
Levantei os olhos.
— Aquela garota...
— Já deu, Akiteru. A Satoji e eu não tivemos nada — cortei antes que ele pudesse ir mais fundo.
— Mas você queria.
Não fiz questão de negar. Só voltei a olhar para os cadernos.
— Eu tinha 14 anos. Não sabia nem o que queria comer, quem dirá se aquela garota era pra mim.
Ele riu com a minha desconversa.
— Fala sério, Tsukki... agora que você tem quinze é muito maduro, né?
Não respondi. Só ajeitei os óculos.
Akiteru suspirou, mas sua voz saiu mais suave: — Olha, não vou insistir. Só... talvez você deva reconhecer que expor os seus sentimentos pra quem te interessa faz uma grande diferença.
Fiquei um tempo encarando as anotações, as palavras dele reverberando como um eco. Não dei uma resposta direta, mas dentro de mim aquela conversa ficou girando junto com as imagens dela sorrindo na sala de aula.
Chapter 10: 10
Notes:
(See the end of the chapter for notes.)
Chapter Text
Tsukishima
Mais uns meses se passaram, jogamos contra o Aoba Jousai e perdemos, treinamos intensamente e continuamos jogando e nos aprimorando mesmo assim eu não a vi e tenho Sakura sempre ao meu lado e de Tadashi o tempo todo.
Estou cogitando seriamente a possibilidade de perguntar ao professor Takeda sobre a ficha escolar dela.
— Tsukki vamos comemorar, já estamos juntos ah uns bons meses.
Neguei.
— Sakura nós não estamos juntos. — Falei sério e ela revirou os olhos, por ter respeito pelo que tivemos, nunca a tratei mal. Mas aonde isso me levou? A perder o contato com a Satoji e tudo mais que está relacionado a ela.
Hoje teríamos um amistoso contra outro colégio e estávamos a caminho, saímos juntos a todos em direção entrada da escola, o sol do entardecer estava incrível quando eu percebi algo que me deixou travado.
Ali na entrada da escola estava ela, a garota que me deixou mais confuso do que nunca. Seus cabelos verdes agora estavam na altura do quadril com a franja bonita e de lado, a pele parecia um pouco mais escura e radiante e ela estava realmente gata com o uniforme da escola.
Sarina Satoji havia voltado e tinha crescido um pouco também.
— Nossa quem é aquela gata? — A voz do Tanaka ficou evidente.
— Ela é realmente muito bonita. — Nishinoya afirmou e não consegui deixar de ficar sério. Na verdade bem sério.
— Ah é a Satoji Sarina, uma amiga nossa. — Sakura informou agarrando o meu braço e apenas franzi o cenho.
— Ah então vamos nos apresentar. — Hinata afirmou, esse tampinha intrometido.
Eu mal consegui respirar direito. A cada passo que eles davam em direção a ela, era como se meu corpo inteiro ficasse rígido.
Sarina levantou o olhar, distraída, provavelmente esperando alguém do time, e de repente ficou imóvel.
O tempo pareceu dar uma pausa.
Ela piscou rápido, como se estivesse tentando entender o que via.
— ...Kei? — a voz dela saiu quase num sussurro, mas eu ouvi.
Eu, por minha vez, forcei a expressão neutra. Por dentro, o estômago revirava.
Hinata, sem noção nenhuma, já estava sorrindo para ela:
— Oi! Você é nova aqui? Sou o Hinata!
Sarina desviou o olhar de mim para o baixinho, ainda surpresa.
— Ah... sou sim. Cheguei essa semana. Satoji Sarina.
Tanaka e Nishinoya se apresentaram, cheios de entusiasmo. Sakura manteve-se colada no meu braço. Tadashi, do meu lado, murmurou um "uau" quase inaudível.
— Você... também estuda aqui? — ela finalmente me perguntou, como se não pudesse acreditar.
Eu dei de ombros, tentando parecer indiferente: — Faz um tempo já.
Ela assentiu devagar, ainda olhando para mim como se eu fosse um fantasma. As mãos apertavam a alça da mochila com força.
— A gente vai ter um amistoso agora, mas... — Yamaguchi interveio, tentando aliviar a tensão — Seria legal você assistir.
Sarina forçou um sorriso, olhando para ele: — Talvez eu assista, sim.
Enquanto isso, Sakura apertava meu braço com mais força, e eu sentia o coração batendo rápido demais para quem queria parecer frio.
Sarina parecia ter mudado bastante até seu olhar para mim era outro. Ela estava um pouco mais séria que o normal, no entanto Shimizu Kyoko se aproximou sorrindo e tocando seu braço.
— Pensei que fosse chegar somente no mês que vem. — Elas se abraçaram causando estranheza em todos.
— Eu até ia, mas o Goshiki não parou de reclamar afirmando que eu poderia acabar me prejudicando então dei ouvidos a ele. Mesmo que eu seja bem responsável.
Shimizu sorriu com a fala de Sarina e eu só consigo pensar em quem diabos é Goshiki?!
— Bom não quero atrapalha-los foi um prazer conhecer a todos mas preciso entregar esse relatório em até vinte minutos. — Ela sequer me olhou.
— Não quer assistir ao jogo depois? — Shimizu perguntou e ela assentiu.
— Você tem o meu telefone Kyo, qualquer coisa me manda o endereço. — Com um sorriso elas se despediram, quando Sarina passou por mim, foi bem perto e eu senti o cheiro do seu perfume tão intenso e gostoso como o que ela usava antes.
Eu fiquei parado por um instante, imóvel. Ela passou bem perto de mim, e o perfume dela — o mesmo aroma doce, quase cítrico que eu lembrava de antes — atingiu minhas narinas com força.
Senti meu corpo reagir antes mesmo de pensar. A pele se arrepia, a respiração ficou mais pesada, e eu precisei desviar o olhar para não parecer completamente perdido.
— Quem é esse Goshiki? — murmurei baixo, para mim mesmo, tentando racionalizar.
Ela estava mais séria, mais confiante, e ainda assim... próxima demais. A forma como me ignorou ao falar com Shimizu me deixou inquieto. Ela parecia completamente no controle da situação, mas não podia evitar que eu estivesse totalmente consciente da presença dela.
Tadashi, Sakura, Hinata e os outros continuavam ali, mas meu mundo parecia ter se reduzido ao instante em que ela passou.
Sakura, claro, percebeu que eu estava estranho e franziu o cenho, mas ficou calada. Ela não tinha noção do que aquele simples aroma e a proximidade de Sarina faziam comigo.
— Vem, Tsukki — Tadashi chamou, tentando puxar minha atenção de volta para a realidade.
Suspirei, ajustei os óculos e tentei recompor a postura. Mas, por dentro, sabia que não seria tão fácil. Ela havia voltado, e a tensão que não havia desaparecido entre nós agora estava mais forte do que nunca.
🏐📝🏐📝🏐📝
O ginásio estava cheio de vozes de alunos que vieram assistir e o som constante da bola batendo no chão. Eu me posicionei na quadra, ajustei os óculos e respirei fundo.
Do canto do olho, consegui ver Sarina. Ela estava na arquibancada, com a postura reta e os cabelos verdes caindo suavemente sobre os ombros. Diferente de antes, parecia mais confiante, mais centrada. Meu peito apertou sem aviso.
— Tsukishima! — Hinata gritou animado, chamando minha atenção para o saque. Eu apenas assenti, tentando me concentrar, mas a cada passe, a cada bloqueio, minha mente voltava para ela.
Sarina acompanhava cada lance, inclinando-se ligeiramente quando a bola se aproximava da nossa quadra. Eu percebi o jeito dela morder o lábio inferior em concentração — um gesto que me fez sentir algo estranho, um calor que eu não conseguia controlar.
Quando bloqueei um ataque do adversário, meus olhos encontraram os dela por um instante. Ela piscou rápido, surpresa e desviou o olhar. Meu coração bateu mais rápido do que deveria.
— Tsukki! — Yamaguchi chamou, apontando para a bola que ia em direção a mim. Forcei o corpo a reagir, mas ainda assim, dentro de mim, a presença dela era magnética.
A cada ponto, eu percebia pequenos detalhes: o jeito que ela cruzava as pernas na arquibancada, os cabelos verdes refletindo a luz do sol que entrava pelas janelas altas, o perfume que parecia me seguir mesmo à distância.
Não era apenas um jogo. Era um teste silencioso contra a minha própria mente. Eu tentando manter a compostura, ela tentando parecer indiferente — mas nós dois sabíamos que não estávamos nem perto de ser indiferentes.
O placar subia, e com cada ponto, meu olhar procurava instintivamente pelo dela. Ela estava lá, e eu não podia negar: a tensão entre nós crescia com cada segundo que passava.
E, de repente, um passe errado meu fez a bola escapar das mãos, e eu senti a frustração me atingir com força. Mas logo depois, um sorriso sutil de Sarina me fez perceber que, por mais que eu tentasse negar, ela tinha percebido meu desconforto.
Parece que ela não está tão indiferente quanto imaginei.
Notes:
Ah lembrando que eu tenho fanfic de conforto emocional com o Maravilhoso do Kuroo, porém é +18.
Chapter 11: 11
Chapter Text
Sarina
Eu nunca imaginei que Tsukishima estaria aqui.
Meu coração disparou só de pensar em vê-lo todos os dias, dividir os mesmos corredores, ouvir sua voz de novo. Não. De novo, não. Em seis meses eu meio que o superei... quer dizer, tentei.
Nas férias conheci Goshiki Tsutomu, um garoto divertido calouro do colégio Shiratorizawa. Nós nos demos muito bem e, há um mês e meio, ele me beijou. Fiquei sem reação, mas, ao lembrar do que vi naquela sala de química no ano passado, me deixei levar. Tive com ele o meu primeiro beijo. Desde então estamos nos conhecendo.
Passei muito tempo longe do colégio, fazendo tudo à distância, justamente porque não queria cair no erro de deixar meu coração sem preparo para encarar Tsukishima pelas ruas. Eu sei que isso beira a covardia, mas eu tinha uma opção e usei. Fora que aproveitei para progredir nas minhas poesias e desenhos, participando de cafés literários e pubs.
Foi em um desses que conheci a senhorita Shimizu. A afinidade foi instantânea; pela primeira vez eu via a possibilidade de ter uma amiga que não estivesse interessada em outra coisa senão na minha personalidade. Kyoko é divertida, inteligente e gosta de contos românticos como eu.
Meu celular tocou, tirando-me dos devaneios. Olhei mais uma vez para a quadra. Mais uma jogada dele, depois olhei para Sakura.
Eles fazem um casal... legal. Tentei convencer a minha mente de que não devo pensar mais nisso. Levantei-me e fui para fora do ginásio antes que as emoções me sufocassem, atendi apenas para escutar a voz de Goshiki:
— Está ocupada?
Olhei para dentro mais uma vez e observei o jogo, depois suspirei.
— Na verdade não — respondi seriamente.
— Ótimo. Então olha pro céu.
Não entendi muito bem até erguer o rosto e encarar as estrelas.
— Está tão lindo... — murmurei.
— Por isso eu estou te ligando. Quer ir ao píer?
Por um minuto pensei bem sobre a proposta. Tinha acabado de anoitecer, então não teria problemas.
— Certo. Eu te encontro lá — respondi, encerrando a ligação. Em seguida, enviei uma mensagem a Shimizu avisando que não esperaria o fim do jogo porque tinha um compromisso. Enviei minha localização também, para que ela soubesse onde eu estava.
Enquanto guardava o celular na bolsa, respirei fundo. O cheiro de suor, madeira envernizada ainda vinha da quadra. E mesmo indo embora, eu sabia que não conseguiria deixar de pensar nele — não ainda.
🏐📝🏐📝🏐📝
O píer estava quase deserto, iluminado apenas por postes baixos e pelo reflexo das estrelas no mar. A brisa noturna bagunçava meus cabelos soltos, e eu apertava os dedos ao redor do corrimão de madeira. O barulho da água batendo nos pilares era um som constante e relaxante.
— Você chegou rápido — ouvi a voz dele atrás de mim, meio sem fôlego.
Goshiki Tsutomu vinha caminhando com o mesmo uniforme de treino, cabelo sempre impecável apesar do vento. Ele carregava uma sacola de papel com duas latinhas de chá gelado.
— Trouxe isso porque achei que você podia querer — disse, oferecendo-me uma. O sorriso era genuíno, tímido, e os olhos brilhavam do jeito característico dele quando fala de algo que gosta.
— Obrigada — respondi, aceitando. Dei um gole, sentindo a frieza na língua.
Ele encostou ao meu lado no corrimão, ainda olhando para o mar. Por um instante não disse nada; parecia estar procurando coragem para falar.
— Sabe... eu fico nervoso com você — confessou de repente, mexendo no cabelo. — Mas gosto de estar aqui. Você é diferente das outras meninas que conheci. Você me ouve, mesmo quando eu falo demais.
A sinceridade dele me fez sorrir de canto. Olhei para baixo, para os meus pés balançando no ar.
— Você também é diferente — admiti. — Me faz sentir mais leve e me escuta muito bem, sem dizer que ou maluca ou sonhadora demais.
Ele soltou um riso rápido, meio envergonhado, e depois virou-se para mim. O vento trouxe o cheiro de mar e o som distante de um navio. Goshiki estendeu a mão, hesitante, e tocou a minha ponta dos dedos.
— Posso? — perguntou baixinho, os olhos ansiosos.
Assenti. O toque dele subiu pelo meu braço como um arrepio suave. Ele se aproximou um pouco mais, encurtando a distância. Seu jeito era um misto de coragem e nervosismo, sem a postura confiante de alguém que faz isso sempre. Quando finalmente se inclinou, foi devagar.
O primeiro toque dos lábios dele no meu foi leve, quente e doce. Um beijo curto, quase uma prova. O segundo veio mais seguro: ele inclinou a cabeça, encaixando-se melhor, mas sem pressa. Eu podia sentir o coração dele batendo rápido pela forma como suas mãos tremiam ao segurar minhas, o corpo ainda levemente afastado para não me pressionar.
Era um beijo tímido, carinhoso, mas cheio de intenção — bem Goshiki. E eu, por alguns segundos, deixei que aquele momento me abraçasse.
Quando ele se afastou, ainda havia um sorriso sem jeito no rosto dele.
— Eu... gostei — disse, passando a mão no pescoço.
Eu respirei fundo, tentando guardar o calor daquele instante sem compará-lo ao passado.
— Eu também — respondi, olhando para o mar.
Ficamos mais um tempo no píer. O vento frio vinha do mar e fazia meu cabelo dançar, mas a gentileza de Goshiki me mantinha aquecida. Sua mão repousava leve nas minhas costas, sem pressa, enquanto eu me permitia encostar a cabeça no ombro dele.
O cheiro de sal, o barulho das ondas e o jeito dele — cuidadoso, divertido — me acalmavam.
— Semana que vem terá um jogo... você quer ir assistir? — perguntou num tom que tentava soar casual, mas deixava escapar a ansiedade.
— Claro. — Assenti com um sorriso sincero.
O rosto dele se iluminou de um jeito quase infantil, aquele sorriso grande que denuncia tudo o que sente. Ele me olhou como se o mundo inteiro tivesse acabado de dar certo.
— Que bom — murmurou, e sua mão subiu um pouco mais, passando pela curva do meu ombro com carinho.
Nos beijamos de novo, ainda na posição em que estávamos: eu encostada no corrimão, ele um pouco de lado, o braço em volta de mim. O beijo começou tímido como antes, mas durou mais — os lábios macios, o toque do nariz no meu, uma respiração profunda que se misturava à minha. Era diferente do que eu tinha vivido, mas havia algo de leve, de limpo, que me fazia sentir segura.
Quando finalmente me acompanhou até a porta da minha casa, a noite já estava mais silenciosa. Ficamos alguns segundos nos encarando, como se nenhum dos dois quisesse terminar. Ele se inclinou de novo, devagar, e me beijou mais uma vez — agora com a mão acariciando minha nuca de forma tímida, mas firme.
— Boa noite, Sarina — disse baixinho, com um sorriso ainda maior que antes.
Eu apenas sorri de volta, entrando em casa com o coração um pouco menos pesado e a cabeça cheia de pensamentos.
Talvez eu tivesse um pouco mais de coragem para encarar Tsukishima amanhã.
Chapter 12: 12
Chapter Text
Tsukishima
O apito final ecoou pelo ginásio e, mesmo enquanto os gritos dos meninos ainda enchiam o ar, minha cabeça estava em outro lugar.
Procurei por ela no meio do público, nos corredores, na porta. Nada.
Sarina tinha sumido como se nunca tivesse estado ali.
Depois do recap da partida e uma passada rápida no vestiário para trocar de roupa, encontrei o pessoal. Mais uma vez não consegui evitar cutucar o Tobio – já virou hábito – e, claro, ouvi Nishinoya e Tanaka questionando alto como um "cara como eu" podia ter namorada. Tive que aturar a Sakura toda sorridente, quase saltitando, enquanto Yamaguchi tentava, sem sucesso, baixar a bola dela.
Despedi-me de todos e segui para casa. Cumprimentei minha família automaticamente, subi direto para o meu quarto e joguei a mochila no canto.
Merda.
Eu não gosto de perder esse tipo de controle e, para piorar, onde diabos a Satoji foi? Será que me evitou?
Passei a mão nos cabelos, respirei fundo e fui para o banheiro. Amanhã ela não vai ter como escapar.
🏐📝🏐📝🏐📝
Mais um dia começava, dessa vez eu adentrei o colégio conversando apenas como Tadashi, mas o que eu queria mesmo era ver até onde o silêncio dela iria.
Entrei no corredor do Karasuno com a mesma calma de sempre, os fones no pescoço, tentando ignorar o barulho dos outros alunos. Era só mais um dia... até não ser.
No meio da multidão, perto dos armários, ela estava lá.
Por um segundo eu realmente achei que fosse um efeito da luz, mas não: era mesmo a Satoji, comprovando que ela não fugiu, estava ali de verdade. O coração bateu num ritmo irritante e eu apertei mais a alça da mochila.
Ela não era mais só aquela menina que eu lembrava de um ano atrás. Estava diferente. Mais... mulher. Os cabelos verde-escuros caíam em ondas pelos ombros chegando até o quadril, refletindo a luz do corredor como se tivessem fios dourados misturados. Estava com um laço vinho pequeno que destacava a pele escura com sardas suaves no nariz e nas bochechas. Os brincos discretos em forma de estrela balançavam cada vez que ela virava a cabeça. E a expressão dela... serena, mas ao mesmo tempo segura, obvio que ela estava se arrumando já que não são permitido brincos e acessórios na escola.
Droga. Ela estava incrivelmente gata.
Engoli seco e tentei não demonstrar nada, mas meus olhos voltavam para ela como se tivessem vontade própria. Senti uma pontada de ciúme de ver Yamaguchi rindo de alguma coisa ao lado dela, como se já fossem próximos novamente.
Ela levantou os olhos e me viu. Por um instante, o tempo pareceu parar. O olhar dela vacilou, como se também não esperasse por mim ali.
Não consegui evitar o comentário seco, o mais neutro que pude:
— Então é aqui que você estava se escondendo...
A boca dela se abriu ligeiramente. A voz saiu baixa:
— Eu não sabia que você estudava aqui...
Eu ergui uma sobrancelha, tentando manter o ar blasé, mas por dentro estava um caos. Respirei fundo, empurrei os óculos no lugar e continuei:
— Bem-vinda ao Karasuno, Satoji.
Ela baixou os olhos e ajeitou a roupa, meio nervosa. Eu me afastei antes que ela percebesse o quanto eu estava olhando para cada detalhe dela.
Mas uma coisa era clara: ela não era mais aquela lembrança distante. Ela estava aqui. Incrivelmente gata. E agora eu não tinha como evitar.
O treino acabou e, como sempre, a galera fazia barulho no vestiário. Nishinoya e Tanaka estavam numa disputa para ver quem falava mais alto, Sakura me olhava com aquele sorriso irritante e o Yamaguchi tentava, em vão, acalmar todo mundo.
Troquei de roupa devagar, fingindo que não estava com pressa, mas por dentro só tinha uma coisa na minha cabeça: Sarina.
Ela tinha assistido o treino — ou parte dele — e sumido. Não consegui evitar ficar me perguntando para onde tinha ido.
Joguei a toalha na mochila e me aproximei do Tadashi.
— Vou indo na frente — falei com desinteresse, como se fosse rotina.
— Quer que eu vá junto? — ele perguntou, sempre preocupado.
Balancei a cabeça.
— Não precisa. Quero ir sozinho hoje.
Ele assentiu, meio desconfiado, mas não insistiu.
Saí pela porta lateral do ginásio e segui pelo corredor externo, com o entardecer já virando noite. O coração acelerava num ritmo irritante; eu detestava essa sensação de estar prestes a fazer alguma coisa sem planejar.
E lá estava ela, na saída do prédio, olhando para o celular.
Os cabelos verdes caíam pelos ombros, balançando com a brisa da noite. O detalhe vinho que ela usava destacava ainda mais a pele escura iluminada pela luz dos postes. Ela parecia um pedaço de outro mundo ali no meio do Karasuno.
Respirei fundo, ajeitei os óculos e andei até ela.
— Satoji. — minha voz saiu mais firme do que eu esperava.
Ela levantou os olhos, surpresa.
— Tsukishima...
— Não vai dizer que ia sair sem falar nada? — ironizei, cruzando os braços, mas na verdade só para disfarçar o nervosismo.
Ela abaixou o olhar por um segundo.
— Eu... não queria atrapalhar.
Suspirei.
— Não me atrapalha. — Fiz uma pausa. — Pra onde você está indo?
Ela hesitou antes de responder:
— Pra casa.
Dei um passo mais perto, ainda mantendo meu tom calmo:
— Eu te levo.
O olhar dela vacilou, confuso.
— Não precisa...
— Não estou perguntando se precisa. — Minha voz ficou um pouco mais baixa, sem agressividade, mas firme. — Vem.
Por um segundo, ela pareceu querer recusar, mas no fim guardou o celular no bolso e assentiu. Começamos a andar lado a lado pelo caminho da saída, a distância entre nós mínima.
O silêncio durou alguns segundos até ela falar:
— Eu falei sério quando disse que não sabia que você estava aqui... no Karasuno.
Olhei para frente, tentando manter o tom blasé:
— Pois é. Surpresa. — Fiz uma pausa. — Você mudou.
Ela riu de leve, mas havia um toque de nervosismo no som.
— Pra melhor ou pior?
Virei um pouco o rosto, deixando escapar um meio sorriso.
— Só posso dizer que está... diferente. Incrivelmente diferente.
Ela piscou, surpresa pela sinceridade. Eu voltei a olhar para frente, sentindo meu próprio coração bater forte.
Eu ainda tinha duas tentativas — ou melhor, duas ideias — planejadas para tentar trazê-la de volta para mim. Quero dizer... reverter a nossa amizade.
E eu não iria desistir tão facilmente.
As ruas estavam tranquilas e o barulho dos nossos passos no asfalto úmido parecia marcar o ritmo da conversa. A noite estava fresca, mas dentro de mim tudo queimava. Era estranho ver Sarina de volta, tão perto de mim e, ao mesmo tempo, tão distante.
— Não precisava me acompanhar. — Ela disse, ajeitando a alça da bolsa no ombro, como se estivesse na defensiva. — Eu sei o caminho.
— Sei que sabe — respondi, enfiando as mãos nos bolsos do casaco. — Mas eu quis.
Ela me olhou de lado, surpresa.
— Você quis?
— Sim — fitei-a de relance, o rosto dela iluminado pela luz amarelada do poste. — Faz muito tempo que a gente não anda assim. Sem brigar, sem trabalho, sem nada no meio.
Ela não respondeu de imediato. Apenas baixou o olhar e continuou andando. O cabelo verde caía sobre os ombros novamente de um jeito que me obrigava a olhar de novo. Estava realmente linda, mais madura... Era impossível não reparar.
Resolvi arriscar a primeira jogada, já que cancelei as outras.
— Você andou sumida — afirmei com um tom mais baixo. — Não foi só mudança de colégio, foi?
Ela respirou fundo.
— Precisei de um tempo... de tudo.
Assenti devagar, fingindo não ter notado o peso da resposta.
— Goshiki, né? — perguntei num tom neutro, como se fosse mera curiosidade. — Shimizu falou que você tem saído com ele. — Menti, meio que eu vi o celular dela quando cheguei pra levá-la para casa, encarei a tela bem e vi o início de uma conversa do garoto falando que ela era linda e que adorou o passeio.
Sarina ergueu as sobrancelhas, surpresa, mas não se afastou, porém não parecia totalmente convencida, ou seja, ela vai descobrir logo sobre minhas intenções.
— E daí?
— Daí nada — dei de ombros. — Só queria saber se você está bem.
Ela se calou outra vez. Andamos mais uns metros até a esquina que dava para a rua dela. Eu parei, obrigando-a a parar também.
— Sarina... — falei seu nome devagar, sentindo o gosto dele. — Eu sei que eu estraguei tudo lá atrás. Eu não vou te pedir desculpa agora, nem inventar uma. Mas eu quero tentar consertar. Pelo menos poder falar com você de novo.
Ela apertou a alça da bolsa com força, o olhar perdido entre a calçada e o meu rosto. Não fugiu, mas também não se entregou.
— Você tem certeza que sabe o que quer, Tsukishima Kei? — murmurou, quase num sussurro.
Dei um meio sorriso, inclinado levemente para ela, sentindo o cheiro familiar do perfume.
— Tenho. Por isso estou aqui. Por isso estou te levando para casa — endireitei a postura, voltando a andar ao lado dela.
O caminho até a porta dela pareceu ainda mais curto. O coração batendo alto, mas por fora eu mantive o tom calmo, quase frio de sempre. Por dentro, eu já tinha decidido:
Esse era só o começo.
O caminho até a porta dela foi ainda mais silencioso depois daquilo. Eu conseguia ouvir o som dos meus próprios passos e o batimento no peito. Quando finalmente chegamos, ela parou diante do portão e virou-se para mim.
— Obrigada por me acompanhar — disse, firme, mas com um leve tremor no canto da boca.
— Eu quis — repeti, encostando no portão com as mãos ainda nos bolsos. — E quis te ouvir, mesmo que você não queira falar comigo.
Sarina franziu o cenho, surpresa.
— Você não era assim.
— Talvez eu tenha aprendido alguma coisa nesse tempo. — ergui um canto da boca. — E talvez eu não queira perder o pouco que me restou de você.
Ela abaixou o olhar, brincando com a chave entre os dedos.
— Eu não sei o que você quer de mim, Kei.
— Eu quero... — parei, respirando fundo. — Quero pelo menos andar do seu lado de novo. Mesmo que seja só até aqui.
Ela levantou os olhos devagar, me olhando de verdade pela primeira vez desde que voltara. O olhar dela não era mais frio; tinha um brilho contido, um toque de saudade misturado à desconfiança.
— Você está diferente. — murmurou. — Mas eu não sei se acredito ainda.
Inclinei um pouco para a frente, a distância entre nós tão pequena que pude sentir de novo o perfume dela.
— Eu não quero que você acredite agora. Quero que veja — falei baixo, quase um convite.
Por um segundo, ela pareceu se perder no meu olhar. Depois respirou fundo, deu meio sorriso de canto — um sorriso que eu lembrava — e balançou a cabeça.
— Boa noite, Tsukishima.
— Boa noite, Sarina — respondi, deixando-a entrar sem tentar mais nada.
Ela entrou em casa, mas antes de fechar a porta olhou para trás, rápido, como se quisesse dizer algo e desistisse. Eu fiquei parado na calçada, o coração acelerado.
Chapter 13: 13
Chapter Text
Sarina
Fechei a porta devagar, como se o barulho pudesse denunciar tudo o que estava acontecendo dentro do meu peito. Encostei as costas na madeira fria, as chaves ainda presas entre os dedos, e soltei o ar que estava segurando desde o momento em que ele me disse boa noite.
Meus joelhos pareciam fracos, como se tivessem corrido uma maratona. Caminhei até a sala, larguei a bolsa no sofá e fiquei olhando para o nada, tentando organizar os pensamentos. Só conseguia ver o rosto dele — tão próximo, os olhos dourados intensos, e aquela maldita calma no jeito de falar, como se tivesse ensaiado cada palavra para me desmontar.
— Eu não quero que você acredite agora. Quero que veja... — repeti o que ele dissera, quase num sussurro para mim mesma.
Fechei os olhos, lembrando do tom de voz dele, do jeito que minhas mãos tremeram quando percebi o quanto estávamos perto. Passei as palmas pelas bochechas, que ainda estavam quentes, e soltei um riso nervoso.
Por que ele tinha que falar assim? Por que tinha que aparecer no Karasuno justo quando eu pensei que tinha reconstruído meu coração e esquecido minha paixão fulminante por ele?
Subi correndo para o quarto, retirei o laço dos cabelos e me olhei no espelho. O reflexo era de alguém tentando se convencer de que estava no controle, mas os olhos... ah, eles me traíam. Carregavam um brilho que só aparecia quando se tratava dele.
Deitei de barriga para cima, encarando o teto. Ao lado, meu celular vibrou, uma notificação simples, mensagem do Goshiki perguntando como tinha sido o treino no novo colégio. Respondi rápido, com palavras curtas, porque minha cabeça já estava em outro lugar. Porque, mesmo tentando, eu não conseguia excluir a presença de Kei daquela noite.
Senti o peso do passado e do presente se sobrepondo: Goshiki com sua doçura tímida, e Tsukishima com aquele jeito torto — irritante e irresistível.
Suspirei, abraçando o travesseiro, meu coração ainda batia acelerado e, por mais que eu tentasse negar, parte de mim sabia: a história entre mim e Tsukishima Kei estava longe de terminar.
Tsukishima
Eu não dormi direito. Não que isso fosse novidade quando estou irritado, mas dessa vez a razão do sono ruim tinha nome e perfume específicos.
Satoji.
Passei a madrugada ouvindo músicas qualquer, rolando de um lado pro outro na cama, pensando no jeito que ela olhou pra trás antes de fechar a porta. Aquilo não saiu da minha cabeça. Era quase como se dissesse "me convença" sem precisar abrir a boca.
Então eu já tinha decidido: não ia parar. A primeira jogada foi ir atrás dela, levá-la até em casa. A segunda... precisava ser ainda mais clara.
Entrei no colégio ao lado do Yamaguchi, fingi que conversava sobre o treino, mas meus olhos já a procuravam. Bastou passar pelos corredores que a vi perto dos armários, conversando com umas colegas. O cabelo verde maldito brilhava sob a luz, e eu respirei fundo só para manter a compostura.
Esperei ela se despedir das garotas, ajeitar o uniforme, e quando finalmente ficou sozinha, caminhei até lá. Não rápido, sem pressão... só no meu passo habitual. Mas determinado.
— Ei, Satoji. — falei baixo, encostando no armário dela com uma mão, como se não fosse nada demais. — Está fugindo de mim hoje também?
Ela franziu o cenho, surpresa, e fechou a porta do armário com calma.
— Não estou fugindo. Tenho as minhas coisas pra fazer.
Inclinei a cabeça, deixando um sorriso torto escapar, eu sou o mestre na arte da provocação.
— Sempre tem.
Ela virou de costas, pronta para andar, mas eu estiquei o braço e encostei na lateral do armário, bloqueando discretamente a saída. Não era invasivo, só... suficiente para encurralar.
— Tsukishima... — me olhou de lado, meio irritada. — Dá pra sair da frente?
— Posso — fingi indiferença, ajustando os óculos com a outra mão. — Mas me responde primeiro.
Ela respirou fundo, cruzando os braços.
— O que você quer agora?
Aí veio a segunda jogada. O jeito torto, sem declarar nada direto.
— Quero ver se você ainda treme quando eu chego perto — falei baixo, a poucos centímetros do ouvido dela.
Sarina travou por um segundo — mínimo, mas eu percebi. Seu olhar vacilou antes de voltar firme para o meu.
— Você está sonhando. — disse firme, mas a voz não saiu tão inabalável quanto deveria.
Sorri de canto, satisfeito.
— Pode ser. Mas não deixa de ser verdade. — recuei meio passo, finalmente liberando espaço, como se fosse minha concessão.
Ela saiu quase apressada, mas segurando o semblante firme. Eu acompanhei de leve, sem forçar a aproximação, o que a deixou mais irritada. Quanto mais ela tenta se convencer de que não ligo... mais eu mostro, do meu jeito, que não vou sumir, não dessa vez.
A segunda tentativa estava feita. Sutil, talvez insuportável para ela, mas era só o começo.
Sarina
Eu entrei na sala com as pernas ainda meio bambas. O corredor inteiro ecoava as palavras dele, rodando na minha cabeça como um disco riscado:
"Quero ver se você ainda treme quando eu chego perto."
A audácia dele. Era típico do Tsukishima! Não bastava aparecer de repente no Karasuno, segurar meu olhar como se nunca tivesse me deixado, ainda tinha que me encurralar no corredor, com aquela calma irritante!
Meus dedos ainda lembravam o frio do armário contra as costas, o corpo paralisado por um instante pequeno demais pra ele não perceber. Maldito. Ele percebeu. Claro que percebeu.
Entrei na sala e fingi indiferença. Fui direto para meu lugar, tirei as coisas da mochila e ajeitei o caderno na mesa. Respira, Sarina. É só mais um dia. Ele não pode te desmontar tão fácil.
Olhei discretamente para a porta — droga. Lá vinha ele. Alto, ombros largos, fone pendurado no pescoço e aquele ar blasé que enganava todo mundo... menos a mim.
Ele entrou sem pressa, caminhou até o lugar dele, ao lado do meu, claro, porque o universo literalmente gosta de brincar comigo e jogou a mochila na carteira com um baque seco.
— Que cara é essa? — perguntou, ajeitando os óculos e me olhando de canto. — Parece que viu um fantasma.
Rolei os olhos.
— É só cansaço, Tsukishima. — respondi, seca.
Ele apoiou o queixo na mão, olhando para a frente com um sorriso torto, como se tivesse acabado de vencer um jogo invisível.
— Estranho... porque parecia outra coisa.
Cruzei os braços, respirando fundo.
— Você vive achando coisas, não é?
— Só quando são óbvias. — disse ele, baixinho, sem precisar olhar diretamente pra mim.
O sangue subiu pro meu rosto antes que eu pudesse controlar. Me escondi atrás do caderno, puxando uma caneta e rabiscando qualquer coisa só para ter onde enfiar os olhos. Podia sentir o olhar dele fixo, quase perfurando meu perfil.
A sala foi enchendo aos poucos, mas dentro de mim a sensação era de que só existiam dois. Eu e ele. O jeito dele de se aproximar sem nunca de fato se entregar; a forma como me provocava como quem cutuca uma ferida só para ver se ainda dói.
E dói. Claro que dói, eu fiquei mal e me senti uma idiota por isso, no passado é claro.
Quando o professor entrou, eu já estava com o coração acelerado demais. Tentei me concentrar na lousa, mas, de repente, senti o braço dele roçar de leve no meu. Minúsculo. Acidental. Mas as provocações de Tsukishima nunca eram só acidente.
Olhei rápido para o lado — e ele estava olhando para a frente, sério, como se não tivesse feito nada. Só que a curva quase imperceptível no canto da boca denunciava tudo.
Fechei os olhos por um instante, tentando recuperar o ar.
Se ele queria jogar desse jeito... tudo bem. Eu sabia jogar também.
Mas, por dentro, eu sabia que tremia. Não queria me enganar de novo e me sentir uma idiota depois.
O sinal do intervalo soou como um alívio. Passei os minutos seguintes mexendo no celular, tentando fugir do incômodo que Tsukishima insistia em causar só de estar ao meu lado.
Entre as notificações, lá estava a mensagem do Goshiki:
"Ei, conseguiu se acostumar ao Karasuno? Estava pensando... que tal sairmos no domingo a tarde? Quero te levar para um lugar que você vai gostar."
Mordi o lábio, respirando fundo. Goshiki não tinha culpa de nada disso. Ele era gentil, leve, um respiro no meio da bagunça que Tsukishima sempre deixava na minha mente. Digitei rápido:
"Domingo não consigo, mas que tal sábado? Podemos tomar um sorvete depois da sua prática."
A resposta veio instantânea, quase como se estivesse esperando a minha mensagem.
"Fechado! Eu conheço uma sorveteria no centro, você vai amar."
Sorri de canto, tentando sentir o calor daquela empolgação genuína dele, mas, no fundo, havia o peso da comparação inevitável. Nunca era justo. Meu peito batia mais forte de um jeito completamente diferente quando se tratava do loiro irritante que estava sentado a dois metros de mim.
Guardei o celular às pressas, forçando a mente a pensar no fim de semana como uma chance de respirar longe de toda aquela tensão. Mas, infelizmente, o resto do dia não pretendia me aliviar.
🏐📝🏐📝🏐📝
As aulas seguintes se arrastaram até que veio química outra vez. Entrei no laboratório tentando disfarçar a ansiedade, apenas para ouvir o professor falar:
— Hoje quero duplas. Mas como alguns colegas estão em atividades extras, vou reorganizar. Satoji, você fica com o Tsukishima.
A alma quase saiu do corpo. Olhei instintivamente para o lado, onde Yamaguchi já ria baixinho, arrastando a bancada para perto da prima. Ótimo. Só podia ser piada.
Me sentei ao lado dele, tentando manter o máximo de distância permitido pela bancada. Ele ajeitou os óculos calmamente, sem me olhar.
— Parece que vai ter que me aguentar outra vez, Satoji. — disse num tom irônico, mas o canto da boca denunciava a piada cruel.
— É só uma aula. — respondi rápido demais, tentando ocupar o espaço com os frascos e anotações, como se pudesse construir uma muralha entre nós.
O experimento começou. Anotações, medidas, movimentos repetidos. Eu tentava ao máximo não encarar o jeito que as mãos dele mexiam com precisão irritante nos instrumentos de vidro. Ele parecia tranquilo demais — o que, vindo do Tsukishima, nunca era bom sinal.
Em dado momento, o professor pediu para ajustarmos o microscópio da bancada. Inclinei-me primeiro, anotando as observações. Só quando afastei a cabeça percebi a proximidade. Ele tinha feito o mesmo movimento e agora estava logo atrás de mim, o ombro roçando no meu.
— Está errado. — murmurou baixo demais, a voz perto do meu ouvido.
— Não está. — resmunguei, tentando soar firme.
Antes que pudesse recuar, senti quando a mão dele passou pelas minhas. Não agarrou, não segurou — apenas cobriu de leve, num toque proposital, guiando meus dedos para ajustar a lente do microscópio.
O choque queimou cada nervo do meu braço. Meu corpo inteiro travou, mas ele não recuou.
— Viu? Assim a imagem fica nítida. — falou normalmente, como se nada tivesse acontecido. Os dedos ainda sobre os meus, quente, firme.
Olhei rápido para ele, indignada. Ele só ergueu uma sobrancelha, como se estivesse esperando que eu protestasse. O maldito sorriso de canto também estava lá, discreto, provocador.
Afastei minha mão rápido, como se tivesse me queimado.
— Dá pra ser profissional por cinco minutos? — sussurrei, sentindo o rosto esquentar inteiro.
Ele deu de ombros.
— Estou sendo. Só estou te mostrando como faz.
O coração martelava no peito enquanto eu desviava o olhar, tentando me concentrar no relatório. Mas a sensação da mão dele ainda ardia em mim, pulsando pelas veias.
E no fundo, entendia que aquilo não tinha sido um "acidente" de jeito nenhum e se Tsukishima estiver apenas brincando comigo eu nunca mais olharei na cara dele.
Chapter 14: 14
Chapter Text
Sarina
Assim que o último sinal tocou, decidi que não olharia para trás. Nem para ele. Principalmente depois do que aconteceu no laboratório.
A sensação da mão dele sobre a minha continuava ali, pulsando, como se tivesse marcado a pele. Tentei sacudir a cabeça várias vezes, enfiar os livros na bolsa o mais rápido que pude, mas nada fazia aquela cena sumir: o jeito calculado dele, a calma irritante e aquele olhar depois do toque. Não tinha sido acidente. Tsukishima nunca faz nada por acaso.
Saí do prédio e respirei fundo, como se o vento da tarde pudesse limpar qualquer rastro dele. O celular vibrou.
"Sábado confirmado então? Já estou ansioso. Pensei no sorvete de pistache que você comentou."
Era o Goshiki.
Um sorriso escapou mesmo sem eu perceber. Ele tinha esse efeito: leve, bobo, doce. Nada de joguinhos ou provocações. Só a pureza de alguém que estava feliz de verdade por me ver. Respondi rápido:
"Sábado, sim. Depois do treino. Quero meu pistache, hein!"
Em poucos segundos ele mandou um emoji exagerado de braços fortes e outro de sorvete. Ri baixinho, guardando o celular no bolso.
Era disso que eu precisava. Leveza. O oposto do que Tsukishima me dava. O Goshiki não ficava tentando arrancar reações de mim nem me cercava com frases tortas. Ele só... estava ali. E funcionava.
🏐📝🏐📝🏐📝
As aulas seguintes foram um desafio de concentração. Fisicamente eu estava presente. Mentalmente, era um caos. Cada vez que eu fechava os olhos, sentia de novo o calor daquela mão sobre a minha no microscópio.
Na aula de matemática até tentei me distrair rascunhando um poema no canto do caderno. As palavras falavam de escolhas: o passado que insiste em puxar e o presente que aponta um caminho novo. Mas quando percebi, a letra que desenhava era quase o sobrenome dele. Tsukishima.
Fechei o caderno com força, irritada comigo mesma.
Para piorar, quando o intervalo chegou, Yamaguchi estava no pátio com a prima e Tsukishima surgiu no corredor, alto demais para que eu simplesmente o ignorasse. Ele encostou na parede, braços cruzados, e por um momento parecia que esperava por mim.
Segurei firme a alça da minha mochila e atravessei o corredor tentando passar indiferente.
— Vai pra onde com essa pressa toda, Satoji? — a voz dele veio calma, mas carregada de insinuações.
Sem olhar para trás, respondi seca: — Pra qualquer lugar onde você não esteja.
Ouvi o "hm" típico dele, aquela provocação curta cheia de sarcasmo, mas consegui seguir em frente sem ceder. Quando cheguei à sala seguinte, minhas pernas ainda tremiam.
Me joguei na carteira, o peito subindo rápido. Como alguém podia ser tão irritante e, ao mesmo tempo, tão... magnético e bonito?
Respirei fundo, encarando meu celular outra vez. Na tela, a notificação de Goshiki ainda brilhava.
"Não esquece da fita."
Olhei para a mensagem como quem olha para uma âncora, uma promessa de estabilidade. E, decidida, sussurrei para mim mesma:
— Não vou deixar o Tsukishima desestabilizar o que eu comecei. Eu te superei Kei e não vou cair na sua jogada novamente.
Só que, no fundo, eu sabia. Ele não precisava dizer nada, não precisava se aproximar ou tocar de novo naquele dia. O estrago já estava feito.
E a parte de mim que ainda não conseguia soltar o passado, sabia que o sábado não seria tão simples quanto o Goshiki imaginava.
Foram dois dias. Dois simples dias.
E mesmo assim Tsukishima conseguiu me ocupar mais do que deveria.
Na quinta, ele simplesmente se impôs. Todo instante parecia uma brecha que ele sabia explorar. A cada vez que o professor chamava por trabalho em grupo, o destino dava um jeito de colocá-lo do meu lado — e ele fazia questão de não desperdiçar.
Na sala de física, mais uma vez, se inclinou próximo demais para me mostrar um cálculo. Seu braço encostou sutilmente no meu e, quando recuei um pouco, ele apenas murmurou com aquele tom irônico de sempre:
— Relaxa. Não sou contagioso.
Enquanto eu me ajustava na cadeira, tentando disfarçar o rosto quente, ele lançou um olhar torto, provocador, como se o simples fato de eu ter me mexido fosse uma vitória para ele.
Na sexta, o jogo dele mudou de tática.
Ele não me cercava tanto fisicamente, mas sabia onde cutucar. Com frases curtas, afiadas, parecia medir cada reação minha.
— Concentrada assim, parece até que está fugindo da realidade. — disse em plena aula de literatura, inclinando apenas a cabeça para me encarar.
— Estou escrevendo, coisa que você não faz. — retruquei, firme. Ele sorriu de canto.
— Talvez eu só esteja prestando mais atenção em você.
Arregalei os olhos, surpresa com a ousadia, mas ele já tinha desviado o olhar, voltando a rabiscar qualquer coisa no caderno como se fosse a coisa mais banal do mundo.
Nos dois dias, o mesmo ciclo: provoca, deixa queimar e recua.
Eu ia para casa todas as tardes com o coração correndo mais rápido do que eu podia controlar, e o perfume dele, sempre sutil, parecia impregnar em mim mesmo depois que estava longe.
E agora... era sábado. O dia do meu encontro com o Goshiki.
Fiquei longos minutos encarando o espelho.
Prendi o cabelo num laço discreto, deixando algumas mechas soltas para moldar meu rosto. Maquiagem leve, batom delicado. Escolhi um vestido simples, mas que me fazia sentir bonita sem exagero — azul, para contrastar com meus olhos verdes.
Enquanto passava um perfume floral, inevitavelmente me lembrei de Tsukishima comentando que eu "cheirava como se viesse direto de uma floricultura". Mordi o lábio, irritada por lembrar disso justo agora.
Sacudi a cabeça, repetindo para mim mesma: — Hoje é com o Tsutomu. Hoje é diferente!
O celular vibrou com a mensagem dele: "Estou te esperando no ponto. :)"
Peguei a bolsa, respirei fundo e saí, determinada a viver algo leve.
🏐📝🏐📝🏐📝
O ar de sábado carregava o frescor de início de outono, e o sol dourava as ruas de um jeito quase romântico. Quando cheguei, ele já estava lá: Tsutomu Goshiki, postura ereta, cabelo impecável e aquele sorriso leve que iluminava o rosto.
— Sarina! — acenou com a mão, entusiasmado, como sempre.
Eu sorri, acenando de volta. Só de olhar, já dava para sentir o contraste.
Com o Tsukishima, cada gesto é uma guerra. Com o Goshiki... parecia apenas ganhar flores.
— Que bom que veio! — disse, ajeitando a bolsa nas costas. — Eu pensei na sorveteria no centro como falei com você. Dizem que o pistache é ótimo, mas se você quiser outro sabor, eu seguro as suas escolhas.
Ri da tentativa dele de soar confiante, mas a insistência doce arrancou de mim um sorriso genuíno.
— Hoje quero o de pistache mesmo. — respondi, caminhando ao lado dele.
Na sorveteria, a conversa fluiu fácil. Goshiki falava do treino na Shiratorizawa, reclamava da rigidez de Ushijima, orgulhava-se por estar no time e ria de suas próprias trapalhadas. Eu ouvia e ria junto, encontrando uma calma que não sentia havia muito tempo.
Quando o sorvete chegou, ele esperou eu provar a primeira colherada só para me perguntar ansioso:
— E então? Melhor do que imaginou?
Assenti, rindo.
— Está perfeito.
Ele comemorou como se tivesse marcado um ponto decisivo em quadra e por alguns minutos eu consegui realmente esquecer.
Mas não demorou para que, no reflexo do vidro da sorveteria, eu associasse a postura dele à de outro. A altura, a determinação... e de repente o sorriso de Goshiki se contrastava com o meio sorriso torto que ainda me queimava a memória.
Balancei a cabeça, voltando ao presente. Goshiki estava falando de planos para as férias, do quanto queria que eu conhecesse melhor seus colegas. Ele nunca me prendia com mistérios ou silêncios carregados; ele se abria, sem receios.
E foi nesse contraste que meu peito apertou:
Com Goshiki havia leveza, doçura e possibilidades.
Com Tsukishima havia intensidade, provocação e algo que eu não sabia nomear... mas que era impossível ignorar.
Naquela noite, quando Goshiki me levou até em casa e se despediu com um beijo simples na testa, senti a paz que ele me trazia, mas, ao fechar a porta do meu quarto e encostar na parede, o corpo inteiro lembrou do toque dos dedos de Kei sobre os meus no microscópio.
Suspirei, jogando-me na cama. Dois mundos. Duas formas de sentir.
Quanto mais leveza o Goshiki oferecia... mais pesado o Tsukishima parecia puxar dentro de mim.
Tsukishima
O domingo inteiro parecia normal. Treino qeut odos aceitamos de última hora, provocações com o Tobio, comentários do Tanaka e Nishinoya e a paciência do Daichi se esgotando, Sugawara e Asahi rindo e o sorriso calmo da Shimizu ao lado de Yachi.
Normal.
Mas nada do que vinha de fora realmente batia.
Porque, por dentro, eu estava irritado.
E não era um "irritado" qualquer — daqueles que passam com música nos fones ou leitura de uma revista. Não.
Era o tipo de incômodo que cava um buraco no estômago.
Sarina não apareceu no Karasuno no sábado. Ótimo, direito dela. Mas... eu vi.
Eu vi quando o sobrenome Goshiki piscou na tela do celular dela dias atrás e no treino, entre um saque e outro, ouvi Sakura comentando com Tadashi que a Satoji "iria sair para encontrar alguém do Shiratorizawa para tomar sorvete".
Eu não preciso ser gênio para unir os pontos.
Goshiki.
Esse nome não saía da minha cabeça. O maldito do Shiratorizawa, que provavelmente fica tremendo de ansiedade nos treinos, tinha conseguido mais do que eu — estar sozinho com ela. Ela, que ainda me olhava daquele jeito carregado, confuso e tenso.
Meus dedos bateram contra a coxa em um ritmo impaciente.
"E se ele não for só amigo? E se ela já tiver me trocado pela tal idiotice que ele deve oferecer?"
Mordi o lábio, irritado. A cada vez que essa hipótese surgia, a raiva me subia quente pelo pescoço.
Respirei fundo. Vez ou outra olhava pro Yamaguchi, mas até ele percebeu que não era boa hora para me cutucar. Tadashi se enfiou no canto com sua revista de super-herói e me deixou sozinho com os pensamentos.
E eu não parava de repassar a mesma cena na cabeça: Sarina sorrindo docemente, segurando um sorvete, enquanto o maldito do Goshiki dizia alguma piada boba que a fazia rir.
Eu sabia como ela ria, o quanto esse som me desmontava e só a ideia de outra pessoa provocar aquele riso fazia minha mandíbula travar.
🏐📝🏐📝🏐📝
No caminho de volta do treino, enfiei as mãos nos bolsos, ajeitei os óculos e caminhei rápido. Mas doía admitir: perdi espaço.
Alguns meses longe dela e alguém já tinha entrado onde eu deveria estar.
Se fosse qualquer colega idiota, eu não me importaria. Mas aquele nome, aquele maldito nome ligado ao Shiratorizawa, já me ardia como se fosse um rival declarado.
Como se ele tivesse conseguido ultrapassar algo que eu sempre mantive pela metade.
E eu me odiei por perceber que estava enciumado.
Suspirei e murmurei baixo:
— Satoji... você não vai se livrar de mim tão fácil.
Estava decidido. Se até agora eu tinha me aproximado com frases tortas e olhares calculados, a terceira tentativa teria que ser mais forte, mais direta. Um golpe certeiro.
Porque se eu não fizer nada, esse tal de Goshiki vai acabar sendo mais do que "um simples amigo". E isso é algo que eu definitivamente não vou permitir.
A segunda-feira parecia normal para qualquer um no Karasuno. Alunos apressados pelos corredores, professores carregando pilhas de provas, o cheiro familiar de giz no ar.
Mas para mim não havia nada de normal.
Eu já tinha decidido: hoje seria o dia. A terceira jogada e dessa vez, não ia deixar escapar.
Passei a manhã fingindo indiferença. Nas aulas, rabisquei o caderno, cortei Hinata com comentários sarcásticos, provoquei Tobio só para ver a cara dele se contorcendo, e até aguentei Sakura falando demais sem uma careta. Mas tudo isso era disfarce.
Minha mente estava só nela.
No intervalo, ouvi de Shimizu que a Satoji tinha se oferecido para ajudar a organizar alguns livros extras na biblioteca depois da aula, acho que essa era a parte favorita dela desde o fundamental e para mim era perfeito.
Lugar vazio, silêncio, e o mesmo cenário em que já tínhamos nos cruzado antes. Só que eu não deixaria a cena acabar como daquela vez.
🏐📝🏐📝🏐📝
O fim da aula chegou. Fingi que saía pelo portão com os outros, mas voltei pelo corredor lateral. A biblioteca estava meio vazia, apenas meia dúzia de alunos espalhados. No canto, exatamente como imaginei, ela estava ali. As mãos delicadas passavam pelas prateleiras, os cabelos verdes descendo em ondas até quase o quadril, balançando cada vez que ela se inclinava.
Eu tinha uma visão privilegiada e tanto.
Me aproximei devagar. Coloquei a mão na estante ao lado da dela, bloqueando a saída, como quem não deixa a presa escapar.
— Situação familiar, não é? — murmurei, baixo, bem perto dela após me curvar.
Ela congelou por um instante, as mãos ainda segurando um livro. Depois virou o rosto lentamente para me encarar.
— Tsukishima... não começa.
Sorri de canto.
— Calma, Satoji. Eu não vim aqui pra repetir a mesma coisa. Vim justamente pra fazer diferente.
Ela franziu o cenho, tentando manter a compostura.
— Diferente como? Vai inventar mais provocações só pra me deixar confusa?
Inclinei a cabeça, aproximando um pouco mais o rosto, até ela recuar discretamente contra a estante.
— Não. — respondi, firme. — Só vou deixar claro que não gosto da ideia de você sorrindo desse jeito... com outro.
Os olhos dela se arregalaram, surpresa.
— Isso não é da sua conta.
Dei um riso curto, sem humor.
— Talvez não seja. Mas eu ainda percebi. — Minha voz baixou mais, grave. — E eu não vou simplesmente assistir você deixar que alguém ocupe o espaço que deveria ter sido meu desde o começo.
O ar entre nós ficou pesado. A respiração dela acelerou, e eu percebi cada detalhe: o brilho indignado nos olhos verdes, o rubor crescente nas bochechas.
Ela tentou passar por mim, mas eu movi a mão, bloqueando de novo.
— Você acha mesmo que vai se livrar de mim, Sarina? — perguntei, a centímetros do rosto dela. — Eu deixei passar uma vez. Mas agora... agora é diferente.
Segurei sua cintura e notei seu olhar disperso assim como sua tensão, ela realmente não sabe como agir. Sarina abriu a boca para responder, mas hesitou. Pude ver os pensamentos dela girando, a raiva misturada ao nervosismo, e aquilo me alimentava ainda mais.
— Não vou deixar fácil. — concluí, recuando só o suficiente para soltar o caminho, mas sem tirar os olhos dela.
Ela respirou fundo, ajeitou o livro nas mãos e passou por mim sem olhar para trás. Mas eu percebi: as mãos dela tremiam.
Sorri, ajustei os óculos e fiquei sozinho entre as prateleiras. Dessa vez, eu tinha certeza que tinha mexido não só no presente dela... mas também naquele lugar onde ela ainda não conseguia me apagar.
Chapter 15: 15
Chapter Text
Sarina
Saí da biblioteca praticamente correndo, os livros apertados contra o peito como se fossem muralhas capazes de segurar o que borbulhava dentro de mim. O corredor estava silencioso, mas dentro de mim o barulho era ensurdecedor.
Respirei fundo, mas não adiantava.
A cena se repetia sem parar, gravada na pele como fogo.
O toque dele bloqueando minha saída. O corpo dele próximo demais, o calor que emanava como se preenchesse o espaço inteiro, a mão firme na minha cintura.
"Não vou deixar fácil."
Fechei os olhos por um instante, encostando-me contra a parede fria do corredor.
Se naquela hora, naquela estante, ele tivesse reduzido um único centímetro mais... se o rosto dele tivesse descido até o meu...
Meu corpo inteiro respondeu à lembrança com um arrepio traiçoeiro.
As minhas mãos tremeram só de imaginar as dele voltando a me tocar, guiando como no microscópio — firmes, decididas, sem dúvida do que queriam.
E pior, minha mente ousou ir além.
O contorno dos lábios dele estava vívido demais na memória. Eu me peguei pensando como seria sentir essa proximidade se ele tivesse me beijado ali, naquele silêncio pesado, entre estantes de livros e a respiração quente dele contra meu rosto.
Mordi o lábio com força, tentando dissipar o calor que subia. Uma parte de mim queria gritar de indignação, outra queria que ele tivesse realmente feito isso. Meu coração, covarde, inclinava-se mais para a segunda.
Sacudi a cabeça, irritada comigo mesma. Goshiki. Pensei como numa súplica. Goshiki não me fazia tremer nessas explosões desconfortáveis. O toque dele era leve, cheio de cuidado, cada gesto medido para não me sufocar. Era acolhimento.
Mas com Tsukishima... era como se eu fosse ser consumida.
O pior de tudo era admitir: parte de mim queria ser consumida. Queria ser totalmente destruída por essa tensão e ver onde isso me levaria.
Continuei andando até a saída, quase tropeçando no próprio ritmo. As palavras dele ainda vibravam nos meus ouvidos: "espaço que deveria ter sido meu... agora é diferente."
E, dentro de mim, uma voz que eu tentava enterrar sussurrava: e se fosse? E se você correspondesse ou tomasse a inciativa? Não eu já fiz isso seis vezes e em todas elas tomei um toco.
Ainda assim um calor indevido percorreu meu corpo inteiro só de imaginar a cena que não aconteceu. Os lábios dele nos meus, o jeito impaciente e, ao mesmo tempo, calculado. A certeza de que nenhum beijo de Goshiki — por mais doce que fosse — teria o mesmo impacto.
Encostei na porta da sala antes de entrar, respirei fundo e sussurrei só para mim: — Tsukishima... por que você tinha que voltar?
Depois, ergui o queixo, tentando recuperar a compostura mas o coração denunciava a verdade: por mais que eu tivesse prometido a mim mesma não me abalar com ele, estava balançando.
Cada vez mais rápido, cada vez mais fundo.
Tsukishima
Desde a biblioteca, algo nela mudou.
E eu, que sempre me orgulhei de ser observador, não deixei passar nada.
Nos dias seguintes, foi quase engraçado ver como ela tentava disfarçar. Mas o corpo não mente — e Sarina, principalmente, era transparente demais para esconder de mim.
Na terça-feira, por exemplo, quando nos sentamos próximos na aula de matemática, percebi o jeito que ela mordia a tampa da caneta sem necessidade alguma. Os olhos tentavam se fixar no quadro, mas sempre fugiam para a lateral. Para mim.
Quando me pegava encarando-a de volta, ela corava rápido, desviava e rabiscava o caderno como se isso apagasse a reação.
Na quarta, foi ainda mais claro.
No corredor, ela vinha em minha direção, distraída, e acabei passando propositalmente rente à parede para que tivéssemos de atravessar o mesmo espaço estreito. Nossos ombros se encostaram, de leve. Ela travou por meio segundo, o suficiente para eu captar a respiração acelerando.
Sorri de canto e sussurrei: — Continua tremendo, Satoji.
Ela soltou um "não enche" rápido demais, o rosto em chamas.
Mas o rubor no pescoço denunciava e aquele tom arrebatado da voz não era de raiva. Era de nervosismo.
🏐📝🏐📝🏐📝
Passei o resto dos treinos carregando essa imagem comigo. Em quadra, não errei nem metade dos toques, mas minha cabeça estava focada em outra coisa.
Em vez do bloqueio, reverberava o jeito como ela recuara na biblioteca, pressionada pela estante, olhos arregalados, mas sem força para me empurrar de verdade. O jeito que respirava fundo, como se o ar dela tivesse desaparecido na minha presença.
E eu imaginava. Imaginava se, naquele mesmo instante, eu tivesse realmente quebrado a barreira... se tivesse descido os lábios até os dela.
Só de pensar, o estômago revirava e minhas mãos fechavam-se involuntariamente em punhos.
Não foi preciso mais do que dois dias para eu ter certeza: ela estava tentando resistir, mas o corpo dela já me respondia. Não importava quantos sorrisos o maldito Goshiki arrancasse dela fora daqui. Quando Sarina estava diante de mim, a reação era visceral.
Irritação, nervosismo, calor... e algo a mais escondido naquele olhar verde.
Meu olhar seguia cada detalhe pequeno:
— o tremor sutil nos dedos quando ela segurava o lápis;
— o arrepio evidente no braço quando minha manga roçava a dela;
— o rubor que subia pelo rosto toda vez que eu deixava minha voz baixa, próxima demais.
Ela podia até tentar disfarçar. Eu via tudo.
No fundo, uma parte de mim se irritava. Não com ela — mas com o Goshiki. Imaginar aquele garoto tocando o cabelo dela, arrancando risadinhas, se aproximando com aquela postura nervosa de Shiratorizawa... só me deixava mais convicto do que já sabia.
Eu não ia deixar espaço para ele.
Na quinta, tomei minha decisão. A biblioteca foi a terceira tentativa — e deu certo. Agora era a hora de ir mais longe, mais direto.
Ela estava caindo, mesmo sem admitir e eu estava pronto para provar que aquilo não era só provocação.
Inclinei os óculos no nariz, ouvindo os gritos de Nishinoya ecoar ao fundo, quase irritado com tanto barulho. Mas minha mente estava fria, calculada.
Ela treme quando eu chego perto e em breve... ela vai tremer porque sou eu quem está mais perto do que qualquer outro poderia estar.
Sarina
Eu não sabia mais como organizar meus pensamentos.
Cada vez que fechava os olhos, era como se estivesse de volta àquela biblioteca, entre as prateleiras silenciosas, sentindo o corpo dele próximo demais, a respiração pesada, a voz baixa dizendo que "dessa vez seria diferente."
Senti minhas mãos tremerem só de lembrar. A mente me torturava com possibilidades: E se ele tivesse me beijado ali? Uma parte de mim odiava pensar nisso.
Mas outra — a que queimava em silêncio — tinha certeza de que teria correspondido.
Era esse o meu caos: com o Goshiki havia doçura, leveza... mas com Tsukishima havia fogo. Um fogo que eu não sabia se podia segurar, mesmo se me queimasse no processo.
🏐📝🏐📝🏐📝
Na sexta, Shimizu me chamou discretamente no intervalo.
— Sarina, você tem assistido alguns treinos, certo? — Assenti, meio surpresa.
— Pensei se não teria interesse em ajudar também dessa vez fixamente. Estamos começando os preparativos para os torneios e ter mais uma mão seria útil.
Antes que eu processasse direito, Yachi Hitoka, a menina novata de expressão doce e nervosa entrou bem no meio, apoiando-se em Shimizu.
— Ela vai ser nossa nova gerente — Shimizu completou, sorrindo para a garota. — Eu queria que Sarina considerasse também. Vocês poderiam dividir algumas tarefas: acompanhar relatórios, cuidar da parte organizacional, dar suporte básico como água, uniformes, anotações... nada pesado demais e eu posso instruí-las nesse meu último ano.
Fiquei sem palavras por um momento. Um convite assim era inesperado. Minha boca se abriu para responder, quando a voz de Sakura se elevou pelo ginásio.
— Ué? E eu? Eu estava aqui o tempo todo, ajudando, disponível! Por que estão convidando outras e não a mim?!
A energia mudou. Shimizu, com sua calma inabalável, respondeu firme:
— Porque não precisamos de mais gente, Yamaguchi. Apenas de quem pode contribuir de forma objetiva.
O silêncio que veio depois pesou. Sakura fechou a boca, contrariada, enquanto o Yamaguchi desviava o olhar e Tanaka e Nishinoya cochichavam baixinho para quebrar o clima. Eu fiquei estática, surpresa pelo modo direto de Shimizu — mas, no fundo, grata.
Ela então voltou-se para mim e para Yachi, com um sorriso discreto:
— Pensem nisso com calma. Vocês duas podem ser realmente importantes para o time.
Mais tarde, sentei na arquibancada para observar o treino.
Era impossível não notar a energia do Karasuno: Hinata explosivo gritando a cada bola, Kageyama e sua precisão, Tanaka e Nishinoya como vozes do caos e suas ótimas jogadas, Asahi impondo presença quando precisava, e o Daichi segurando a disciplina como base firme.
E, claro... Tsukishima.
Cada bloqueio dele era calculado, mas eu via algo diferente. O jeito como ele erguia a mão após um ponto, o meio sorriso discreto, até o olhar para Yamaguchi no fundo da quadra.
Ele parecia... mais leve.
Yamaguchi percebeu também. No intervalo, subiu até a arquibancada para beber água e, ao me notar ali, comentou baixinho:
— O Tsukki está diferente, não acha?
— Diferente como? — perguntei, desconfortável.
Tadashi sorriu de canto, cúmplice.
— Não sei... parece menos pesado, sabe? Normalmente ele joga como se estivesse entediado do mundo. Hoje não. Hoje ele parece... motivado.
Engoli em seco. Eu sabia exatamente o porquê, era por minha causa.
Na quadra, ele levantou os olhos por um instante. O olhar dourado encontrou o meu e, como em um reflexo, o coração disparou.
Desviei a tempo, fingindo mexer na mochila. Mas não adiantava, a tensão estava lá, ainda mais forte.
A cada passo dele, a cada bloqueio, minhas pernas tremiam, lembrando da proximidade, das palavras na biblioteca, da ideia maldita de como seria se ele realmente me beijasse. O calor indevido subia pelo meu corpo, denunciando o quanto aquela possibilidade me perseguia.
Balancei a cabeça, mordendo o lábio, eu não podia ceder. Mas cada vez que olhava para a quadra, entendia melhor: O problema não era ceder ao Tsukishima. O problema era que, no fundo, parte de mim já tinha cedido...
O fim de semana chegou rápido demais.
Levantei tarde no sábado, tentando recuperar as horas de sono perdidas entre lições, treinos observados e... ele. A cada vez que fechava os olhos, a cena na biblioteca insistia em voltar. O calor das mãos dele, a forma como me encurralou, o olhar que parecia me atravessar.
Mas hoje não era dia para isso.
Hoje era dia de leveza.
Peguei o celular e reli a mensagem do Goshiki:
"Os meninos do Shiratorizawa também vão. Pensei que poderíamos ir todos juntos ao cinema. Depois, talvez, passear por aí. Quero que você relaxa, Sarina."
Sorri de leve. O jeito dele de se preocupar era sempre tão simples, direto. Não havia enigmas, não havia provocações escondidas como em cada frase de Kei. Era reconfortante ter alguém que se deixava entender logo de cara.
Vesti uma saia azul de cintura alta e uma blusa branca leve, prendi o cabelo num semicoque deixando algumas mechas soltas caírem ao redor do rosto. Um batom rosado completou. Olhei no espelho e repeti para mim mesma:
— Hoje é sobre você. Só sobre você.
🏐📝🏐📝🏐📝
O grupo se reuniu na frente do cinema. Reconheci alguns rostos do Shiratorizawa: Semi, que sorria com confiança, Reon conversando animado com Goshiki, e até o próprio Tendou, que fazia piadas exageradas já na fila, foi fácil lidar com eles depois que os conheci pessoalmente.
— Sarina! — Goshiki acenou, radiante ao me ver. Veio até mim correndo, meio atrapalhado, mas com os olhos brilhando. — Você está incrível... digo... muito bonita hoje.
Senti meu rosto esquentar e agradeci baixinho. Ele não escondia, não disfarçava — apenas dizia o que sentia. E isso me deixava sem jeito.
Entramos juntos. O grupo ocupou quase uma fileira inteira. Tendou não parava de brincar em voz baixa, Semi ria de vez enquanto e Goshiki, ao meu lado, tentava discretamente compartilhar a pipoca.
— Quer? — disse, oferecendo o balde. Peguei um punhado, sorrindo.
— Só um pouco.
— Pode pegar mais, tem bastante. — Ele insistiu com aquela doçura envergonhada.
Assisti ao filme, mas minha mente não se firmava. A atmosfera leve, as risadas do grupo, a naturalidade com que Goshiki comentava bobagens no meu ouvido... tudo isso deveria me confortar. Mas.... De vez em quando, sem querer, eu imaginava como seria se fosse Kei ao meu lado.
Tsukishima seria o oposto: não dividiria a pipoca tão gentilmente, provavelmente faria um comentário ácido sobre o filme e, ainda assim, eu estaria consciente de cada respiração dele ao meu lado.
Mordi o lábio, irritada, afastando esses pensamentos. Chega, Sarina. Aproveita o que tem agora.
Quando o filme terminou, o grupo saiu animado para comentar. Tendou imitava algumas cenas, Reon elogiava o enredo junto a Semi, e Goshiki... caminhava ao meu lado, discretamente encostando a mão na minha como se pedisse permissão silenciosa.
Não recuei. Deixei.
Ele corou levemente, mas não disse nada, assim como os companheiros dele que provavelmente perceberam. Apenas sorriu, simples.
Era isso: com ele nunca havia jogo. Só havia presença.
Ainda assim, enquanto caminhava pelas ruas iluminadas, ouvindo as conversas ao redor, não pude impedir que parte de mim desejasse o contrário. Desejasse a tensão, o frio na espinha, a respiração perdida.
Desejasse o que apenas o Tsukishima sabia provocar.
Suspirei, escondendo a contradição por trás de um sorriso para Goshiki.
Meu dilema ainda não tinha fim.
Tsukishima
Eu não tinha a menor vontade de sair naquele sábado à noite. O treino já tinha me drenado, e tudo o que eu queria era relaxar com meus fones e algum documentário sobre dinossauros ou algo útil, mas o Tadashi insistiu.
— Vamos, Tsukki! É uma loja nova, disseram que tem action figures limitadas. Você sempre reclama que não tem nada interessante por aqui.
Revirei os olhos.
— Isso é o que você chama de "programa"? Comprar plástico caro? — Ele bufou, segurando a mochila no ombro.
— E você chama de "vida social" ficar trancado no quarto? Anda logo. Vai ser rápido.
Acabei cedendo. Não porque estava animado, mas porque era impossível dizer não quando ele ficava naquele jeito persistente. Então seguimos até o centro. A loja até que era interessante: prateleiras cheias, quadrinhos raros, alguns pôsteres bons de colecionar. Fingindo algum desinteresse, mexi em algumas capas enquanto Tadashi parecia uma criança olhando tudo pela primeira vez.
— Olha essa edição, Tsukki! — ele mostrou, quase socando o gibi na minha cara.
Afastei com calma.
— Tadashi... não somos mais crianças. — Mas acabei pegando para "dar uma olhada".
Quando saímos da loja, tínhamos duas sacolas: uma dele e outra... minha. Claro.
O ar da noite estava fresco. Estávamos comentando sobre os preços absurdos quando eu parei seco. Foi automático.
Do outro lado da rua, entre as luzes dos postes e o movimento tranquilo, estava ela.
Sarina.
Apenas dizer que a notei era pouco. Era como se toda a rua tivesse silenciado. O cabelo verde, solto em ondas, refletia a luz leve. Mas o detalhe que me acertou como um soco foi o que vinha junto: a mão dela entrelaçada com a dele.
Goshiki. O prodígio nervoso e barulhento do Shiratorizawa, sim eu pesquisei. Sorria para ela como se tivesse ganho na loteria. E ela, para o meu tormento, estava sorrindo de volta.
Por dentro, o estômago virou. Minha mandíbula travou e a sacola quase amassou de tanta força que eu fechei a mão. Mas por fora? Nada.
Empurrei os óculos de leve, ajeitei a postura e continuei andando, como se tivesse visto apenas um transeunte qualquer.
— Tsukki... — Tadashi chamou em voz baixa, surpreso. — Era a Satoji, não era?
— E daí? — respondi, seco.
— Você não vai falar nada?
— Por quê? — olhei para ele de canto, indiferente. — A vida é dela.
O silêncio dele pesou mais do que qualquer reclamação. Ele me conhece demais para acreditar nessa frase. Tadashi me observava com aquele olhar desconfiado, mas não insistiu.
Segui em frente, cada passo mais pesado que o anterior, enquanto por dentro a mesma cena queimava como uma ferida: ela, linda, com aquele sorriso reservado a alguém que não era eu.
Goshiki estava ocupando o meu espaço. E, por mais que eu finja, isso me consumia.
Mas ela não precisava saber. Ninguém precisava saber.
Por enquanto.
Sarina
A noite fluía bem demais para que alguma coisa a atrapalhasse.
Eu e Goshiki ríamos de uma piada boba do Tendou enquanto caminhávamos pelo centro da cidade, meu cabelo havia se soltado. O movimento era leve, muitos casais aproveitavam o frescor do início de outono, e eu tentava me convencer de que este era o lugar certo para estar.
A mão dele estava firme entrelaçada à minha — quente, nervosa, mas sincera. Cada palavra dele, por mais simples que fosse, soava como um elogio tímido.
Era reconfortante e bonito. Até que meu coração parou.
No meio da rua movimentada, sob a luz de uma vitrine, eu vi.
Alto demais para não perceber, cabelos loiros e óculos ajustados com aquele gesto costumeiro. Tsukki ao lado dele, Yamaguchi, segurando sacolas de uma loja.
Por um instante, o tempo congelou. O olhar dele encontrou o meu. Dourado, direto, frio por fora... mas que eu conhecia bem demais para não entender o que se escondia ali.
Meu peito queimou.
Logo na sequência, ele desviou. Continuou andando como se absolutamente nada tivesse acontecido. Sem mudar a expressão. Sem sequer dar uma reação que comprovasse que existiu alguma coisa e ainda assim, meus passos perderam o ritmo.
— Sarina? — a voz doce de Goshiki me puxou de volta. Ele franziu o cenho, preocupado. — Está tudo bem?
— Sim... claro. — forcei um sorriso, apertando a mão dele de volta. — Só me distraí.
Mas por dentro estava longe de bem. A simples presença de Tsukishima, mesmo por alguns segundos, tinha reorganizado tudo dentro de mim de forma caótica. O calor do olhar dele, o peso do silêncio, o contraste doloroso entre o que ele dizia e o que deixava escapar... tudo veio à tona.
Sacudi a cabeça discretamente. Chega. Hoje é Goshiki. Só ele.
Depois que nos separamos do resto do grupo, ele sugeriu:
— Quer passar no parque antes de eu te levar em casa?
Não vi problema. O parque à noite estava quase vazio, iluminado apenas por postes baixos e pela luz prateada da lua. O som do vento corria pelas árvores e o lago refletia as estrelas. Era bonito, quase mágico.
Nos sentamos num banco de madeira. A conversa foi leve, sobre filmes, sonhos, coisas bobas da rotina. Até que veio o silêncio. Não desconfortável — um daqueles silêncios bons, que não precisam ser preenchidos.
Foi então que senti, a mão dele deslizou pela minha, tímida, mas confiante. Goshiki virou-se para mim, os olhos brilhando de expectativa, como se pedissem permissão.
Meu coração disparou, e eu não recuei. Consentir era fácil com ele — não havia tensão.
Ele se inclinou devagar, e nossos lábios se tocaram outra vez. O beijo foi suave, demorado dessa vez, como se ele tivesse encontrado coragem dentro de si. O braço dele passou pelas minhas costas, trazendo-me para mais perto, mas ainda mantendo cuidado, como se eu fosse quebrar. Os lábios eram macios, o toque carinhoso.
E eu correspondi.
Mas o corpo, traidor, não deixava esquecer. Enquanto os lábios de Goshiki me cercavam de doçura, a lembrança voltava: a respiração próxima demais de Tsukishima na biblioteca, a voz grave prometendo que "faria diferente", a sensação de que, se fosse com ele, nada seria suave — seria incêndio.
O beijo terminou, e Goshiki sorriu.
— Você é especial, Sarina. — disse, tímido, encostando a testa na minha com carinho.
Sorri de volta, genuinamente tocada pela sinceridade dele. Mas, no fundo, senti a contradição me apertando o peito.
No parque, com o moreno do Shiratorizawa, havia calma, segurança, leveza. Mas bastava uma lembrança do loiro do Karasuno para estremecer tudo dentro de mim.
E eu sentia que essa guerra interna estava longe de acabar e que eu estou começando a me embolar e que não quero me machucar ou sacanear alguém.
Eu só preciso pensar.
Chapter 16: 16
Chapter Text
Tsukishima
O Domingo foi silencioso. Silencioso por fora, pelo menos.
Em casa, permaneci no quarto, fones por perto, revista aberta sobre a mesa. Mas não importava quantas vezes eu tentasse me distrair com as páginas, a mesma cena voltava — cruel, repetitiva.
Sarina com o cabelo brilhando sob a luz da rua, e a mão dela presa à de Goshiki. Como se aquele lugar tivesse sido sempre dele. Como se nunca tivesse havido espaço para mim.
Mordi o lábio com força, ajeitando os óculos a cada vez que o reflexo no celular me irritava.
O pior não foi vê-la com ele. Foi vê-la sorrindo. Aquele sorriso leve — o mesmo que, por anos, eu quis que fosse só meu.
Fechei os olhos, reclinei na cama, mas a raiva não passava. Não era ciúme adolescente, era mais fundo. Um incômodo visceral de saber que alguém de fora, que mal entende o que significa construir laços, estava entrando justamente onde eu nunca tive coragem de cravar o espaço.
Todas as vezes que a pressionei, todas as vezes em que encurtei a distância, ela tremeu. Não de medo. Mas de algo muito pior para mim: de receio de ceder.
Suspirei fundo, arrancando os fones da mesa e jogando de lado.
Não importava quantas vezes eu repetisse que não ligava, era inútil. Eu já tinha passado por provocações, olhares e indiretas. Agora só restava uma coisa e eu teria que fazê-la ver.
Na Segunda-feira cheguei cedo no Karasuno, mas não pela rotina.
O ginásio estava cheio de vozes, os treinos em andamento, e por mais que Hinata gritasse, por mais que Tanaka fizesse escândalo, só o que eu esperava era ela entrar.
E quando entrou... O peito apertou mais forte do que admito.
Sarina parecia exatamente como na última vez que a vi: cabelo verde arrumado em ondas soltas, uniforme impecável, mas o olhar... havia um peso ali. Talvez fosse só cansaço, talvez o fim de semana cheio. Mas eu reconhecia. Era a mesma expressão de quando alguém tenta esconder algo e falha.
Ela não demorou a me notar. Seus olhos encontraram os meus, e ela desviou rápido demais, fingindo mexer nos livros. Isso já bastava para mim.
Durante o dia, aguardei. Cada aula passando como mero protetor até o instante em que finalmente consegui o que queria: ela sozinha.
O corredor que levava à sala de materiais da escola estava vazio. Sem Tadashi, sem Sakura, sem professor. Só ela, organizando algumas pastas antes de sair.
Aproximei-me sem aviso. O eco dos meus passos a fez virar.
— Tsukishima... — a voz saiu num misto de surpresa e alerta.
Encostei na porta, bloqueando a saída com uma calma fria.
— Você vai continuar fingindo mesmo depois de tudo?
Ela franziu o cenho, apertando a pasta contra si.
— Fingindo o quê?
Dei um passo à frente.
— Que não sente nada.
O silêncio engoliu o corredor. Só o barulho das nossas respirações preenchia o espaço. O olhar dela vacilou, e eu aproveitei.
— Eu já tentei de todos os jeitos. Cheguei perto, afastei, provoquei... e você sempre reage. Você treme. Sempre. — minha voz baixou, firme. — Mas continua insistindo que não é nada.
Ela tentou rebater.
— Eu... eu estou com o Goshiki.
— Não me interessa. — cortei, com frieza. — Porque sei o que acontece quando é comigo.
Dei mais um passo, encurralando-a contra a parede, exatamente como na biblioteca — mas sem máscaras agora. Minha mão apoiou-se na parede ao lado de sua cabeça, a outra segurou de leve o canto da pasta para que ela não a usasse como escudo. O rosto estava próximo o suficiente para sentir o perfume dela de novo, o mesmo que martelava desde o maldito sábado.
— Eu me afastei de tudo só pra não perder isso. — sussurrei, encarando fundo os olhos verdes dela. — Mas agora estou aqui e não vou recuar.
O tempo pareceu congelar. Os olhos dela se arregalaram, o corpo inteiro rígido, mas a respiração denunciava: rápida, descompassada, quase implorando pela proximidade que ela jurava não querer.
Inclinei mais perto, o nariz quase roçando o dela.
— E se eu te beijasse agora...— murmurava, quase um desafio. — Você conseguiria mesmo negar?
A garganta dela travou. E eu soube, como sempre soube, que nenhuma resposta seria suficiente.
— Pois eu não vou mais perguntar. — finalizei, a voz grave, cada palavra um corte. — Eu vou mostrar até você parar de fugir.
Afastei apenas um centímetro, apenas para que ela sentisse que ainda havia saída — mas o fogo já tinha sido aceso.
O peito dela subia e descia rápido, a respiração descompassada. Os dedos dela apertavam a pasta como último refúgio, mas eu já tinha quebrado tudo.
Inclinei mais, devagar, até que o nariz quase tocasse no dela. A boca dela se abriu, como se fosse responder... e aí eu fiz.
Não nos lábios, no canto.
Pressionei um beijo no limite da boca dela, ardido e premeditado o suficiente para roubar completamente o ar dela e deixar que o corpo todo entrasse em colapso.
Os olhos dela se arregalaram. O rubor subiu instantâneo pelo rosto. Recuei apenas um centímetro, o sorriso torto curvado no meu rosto, a respiração quente ainda colada à dela.
— Viu? — murmurei, baixo, provocador, com a voz arranhada pelo desejo que eu segurava.
Por um instante, ela ficou imóvel. Sem resposta. Só a pele tremendo, só os olhos tentando se agarrar a qualquer defesa que tinha caído por terra.
Inclinei o rosto mais uma vez, próximo, mas não a beijei e baixei o tom, arranhado.
— Até aí você me deixa entrar.
Ela ficou imóvel, olhos verdes atordoados. Eu afastei o braço, liberando a passagem.
— Isso não acabou, Satoji. — disse firme. — Agora você já sabe.
Afastei o braço, liberando a passagem. Ela respirou fundo, como alguém que sai debaixo d'água pela primeira vez, os olhos verdes atordoados, sem conseguir disfarçar nada.
Eu ajeitei os óculos calmamente, como se nada demais tivesse acontecido, e saí do corredor.
Mas por dentro... eu tinha acabado com os jogos sutis.
Agora ela tinha provado o suficiente para entender que não conseguiria fugir, principalmente quando eu sei o que sente.
🏐📝🏐📝🏐📝
Sarina
Meu coração parecia um tambor descompassado, a boca seca. Kei nunca tinha sido tão intenso comigo — e, no fundo, era tudo o que eu sempre quis.
Fui para a aula tentando fingir normalidade, mas cada palavra do professor parecia ecoar sem sentido. Quando o sinal tocou, respirei fundo e segui para o ginásio. Hoje eu e Yachi começaríamos de verdade o treino para sermos gerentes do Karasuno ao lado da Shimizu. O treinador Ukai pediu que dividíssemos a quadra para o treino de passagens rápidas; ajudamos, ouvimos instruções, rimos juntas. O tempo passou leve.
Só até a hora de ir embora. Eu conversava com Shoyo, Yachi e Kageyama quando me afastei para pegar minha mochila e ouvi a voz dele atrás de mim.
— Vou te levar para casa. — Tsukishima disse, simples.
Meu corpo inteiro tremeu. Deus, era agora, se ele me beijasse ali, na saída do ginásio, eu não ia conseguir recuar. Eu ia derreter nos braços dele!
Eu parei, a mochila apertada entre as mãos. Meu coração batia tão alto que eu tinha certeza de que qualquer um poderia ouvir. E lá estava ele — Tsukishima — parado na porta do ginásio, mãos nos bolsos, olhando para mim com aquele ar neutro que só ele sabia carregar.
— Anda logo, não tenho o dia todo. — a voz dele soou calma, mas os olhos estavam fixos em mim, atentos de um jeito que me fez engolir em seco.
Forcei meus pés a se moverem e caminhei até ele. Saímos lado a lado, o sol do fim de tarde pintando a rua de dourado. Eu sentia, de vez em quando, o braço dele roçar no meu. Nada ostensivo. Mas cada toque era como uma faísca correndo pela minha pele.
— Então... — arrisquei, tentando cortar o silêncio com minha voz quase apagada.
— Então nada. — ele rebateu sem me olhar, mas eu juro que vi o canto de sua boca se curvar num sorriso quase invisível. — Eu disse que ia te levar pra casa, não disse?
Não consegui segurar o sorriso que escapou de mim. O caminho seguiu tranquilo, mas havia algo no ar — como eletricidade suspensa entre nós, toda vez que ele ficava desse jeito ou estava na defensiva ou armando alguma coisa.
Quando chegamos perto da esquina de casa, ele parou. Pela primeira vez, virou-se inteiro para mim. O olhar por trás dos óculos... era diferente. Menos distante, menos defensivo, mais próximo.
— Você está... — ele hesitou por um instante; aquele tipo de hesitação não parecia vir dele. — Está bonita hoje.
Meu rosto queimou na hora.
— Obrigada... — foi tudo o que consegui dizer.
Ele inclinou levemente a cabeça, e a franja dourada caiu sobre os olhos. Então deu um passo à frente, diminuindo a distância entre nós. Sua mão encostou de leve na minha, num gesto silencioso, mas que dizia tudo.
— Posso? — a voz saiu baixa, quase um sopro que arrepiou minha pele.
Só consegui assentir.
No fim do caminho, Tsukishima se inclinou e seus lábios tocaram os meus. O beijo começou firme, mas em segundos se incendiou em algo muito mais profundo. Senti meu corpo reagir instintivamente, subindo na ponta dos pés para alcançar melhor a boca dele, como se a mínima distância entre nós fosse insuportável. Foi quando a mão de Tsukishima em minha nuca me puxou de vez, erguendo-me um pouco mais, prendendo-me contra ele.
O mundo simplesmente desapareceu. Só existia o calor dele, quente e arrebatador, tomando conta dos meus lábios num ritmo intenso e voraz, como se cada toque fosse um impulso que ele não conseguisse mais conter e estivesse esperado temo demais. Meu peito colava ao dele, e ainda assim parecia pouco — eu precisava de mais, sempre mais.
A respiração dele misturava-se à minha, entrecortada, quente demais, fazendo minha pele arder por inteira. Apertei os dedos contra a camisa dele, agarrando como se fosse meu único ponto de equilíbrio, enquanto o beijo se aprofundava, denso, exigente. Havia ali uma fome guardada, reprimida por tempo demais, que agora explodia sem freio.
Era avassalador, quase desesperado, e ainda assim carregava uma clareza brutal: naquele instante, Tsukishima não estava me deixando dúvidas. Não era apenas um mero desejo e sim uma decisão de não se conter mais, de não me afastar nunca mais.
Quando ele se afastou, ainda estava perto o suficiente para que eu sentisse sua respiração contra a minha.
— Chegamos. — disse no tom neutro de sempre, mas os olhos... os olhos dele brilhavam de outro jeito. — Vai entrar?
Pisquei algumas vezes, ainda sentindo meus lábios formigarem. Meu coração batia tão rápido que parecia impossível processar o que tinha acabado de acontecer. Ele ainda estava ali, parado diante de mim, como se nada tivesse mudado... mas o jeito como me olhava dizia o contrário.
— Eu... vou entrar, sim... — minha voz saiu trêmula, quase falhando, e um sorriso tímido escapou antes que eu pudesse segurar.
Ele arqueou uma sobrancelha, ainda tão próximo que eu podia sentir sua presença quase como um campo elétrico ao meu redor.
— E vai me deixar aqui fora depois de me fazer andar até aqui? — o tom era típico do Tsukishima, provocador. Mas havia algo diferente: o sorriso discreto que suavizava as palavras e o brilho no olhar.
Soltei uma risada nervosa e mordisquei o lábio inferior, como se isso fosse me ajudar a manter o controle do que sentia.
— Quer entrar? — perguntei quase num fio de voz.
— Não hoje. — a resposta veio baixa, carregando um peso estranho. O olhar dele escorreu sobre mim, dos óculos até os pés, e a franja dourada deslizou diante dos olhos. — Só queria ter certeza de que você chegaria bem... e de que entendeu.
Meu peito apertou
— Entendi o quê? — eu sussurrei, sem nem reconhecer minha própria voz.
Ele se inclinou, tão perto que senti sua respiração quente contra a minha orelha.
— Que eu não vou mais evitar, Sarina.
Meu corpo inteiro estremeceu. O calor subiu rápido, espalhando-se pelo rosto, pelo peito, pelas pontas dos dedos, meu quadril, por trás dos meus joelhos. Quando ele se afastou, havia um meio sorriso nos lábios — um sorriso que guardava um monte de ideais. Virou-se como se fosse apenas mais um dia comum.
— Amanhã eu passo por aqui antes do treino. — disse, natural, como se não tivesse acabado de virar meu mundo de cabeça para baixo com a boca.
Respirei fundo, sentindo-me derreter ali mesmo.
— Kei... — o chamei antes que desse mais passos. Ele parou, olhou por cima do ombro. — Obrigada.
Ele não disse nada. Apenas fez um gesto curto com a mão e continuou andando, ele entendeu bem o que eu quis dizer a que me referi. Fiquei parada na porta, imóvel, ainda com o beijo aceso em minha boca. Sem dúvidas alguma coisa entre nós tinha mudado de vez.
Quando entrei em casa fiquei sem saber o que fazer, subi direto para o meu quarto, fechei a porta devagar, como se todo o prédio pudesse ouvir o barulho do meu coração. Encostei as costas na madeira e deslizei até sentar no chão, ainda com a mochila nas mãos.
Respirava fundo, tentando colocar os pensamentos em ordem, mas cada vez que fechava os olhos só vinha a imagem dele se inclinando, a mão firme na minha cintura, o jeito como os óculos dele escorregaram um pouco quando nos beijamos.
Levei os dedos aos lábios. Ainda sentia o formigamento quente, quase um choque. Não era só um beijo... foi o beijo mais avassalador da minha vida. Não tinha comparação com nada, nem com Goshiki, nem com as histórias que eu escrevia nas minhas poesias. Tsukishima não era só intenso; ele queimava.
Levantei e larguei a mochila na cadeira, indo direto para frente do espelho. Meu rosto ainda estava corado, o cabelo um pouco bagunçado. Sorri sozinha, envergonhada e feliz ao mesmo tempo.
— O que você fez comigo, Kei... — murmurei para meu reflexo.
Tentei respirar fundo, mas o peito subia e descia acelerado. Senti uma pontada doce no estômago — uma mistura de nervosismo e desejo de ver de novo aquele olhar frio, decidido, que me derreteu inteira.
Deitei na cama, abraçando o travesseiro. O quarto estava silencioso, só a minha respiração ecoando. E pela primeira vez, depois de muito tempo, não tive medo de admitir: eu queria de novo. Queria aquele beijo, aquela intensidade. Queria ele.
Fechei os olhos e deixei que a lembrança tomasse conta — a boca dele na minha, os dedos longos na minha nuca, o mundo sumindo ao redor. O sorriso escapou sozinho, tímido, mas real.
Ali, no escuro do quarto, percebi que não tinha mais volta eu estava de volta aos tempos em que estava completamente apaixonada por Tsukishima Kei.
Tsukishima
Fechei o portão da casa dela devagar, como quem não quer romper o feitiço do que acabou de acontecer. Ainda sentia o calor dos beijos nos meus lábios enquanto atravessava as ruas até minha casa. O coração ia mais calmo agora, mas o corpo inteiro parecia cheio de dopamina.
Continuei andando depois de virar a esquina, tentando manter o passo firme, como se nada tivesse acontecido. Mas por dentro... meu corpo ainda estava em chamas.
Merda... eu fui meio grosso. Como sempre. Mas, de algum jeito, ela parecia gostar disso quando vinha de mim. Não se ofendia, não se afastava. Pelo contrário... encarava de frente, como se enxergasse além da casca dura que eu uso pra manter os outros à distância.
O beijo me voltou inteiro à memória, forte demais pra ser ignorado. Os lábios dela — tão quentes e carnudos que ainda queimavam nos meus. O jeito como se colocou na ponta dos pés, desesperada pra me alcançar, e como eu não aguentei... puxei-a, só pra sentir mais, só pra tê-la colada em mim. O corpo dela contra o meu ainda ardia, impregnado na pele, como se o calor tivesse me marcado.
Passei a língua rápida pelos lábios, sentindo o gosto que ainda parecia estar lá. Queria mais. Muito mais. Aquilo não tinha sido suficiente — nunca seria. Ela tremeu contra mim, e aquele arrepio foi como abrir uma porta que eu não estava disposto a fechar. Eu não ia deixar brecha nenhuma pra me afastar dela de novo.
Respirei fundo, ajeitando os óculos como sempre faço quando preciso disfarçar alguma coisa. Mas não consegui enganar a mim mesmo: o coração martelava no peito, e, dessa vez... não quis ignorar.
No fim das contas, eu sei que não vou conseguir evitar você, Sarina.
E, sinceramente... não quero.
Quando abri a porta de casa, o cheiro de jantar já vinha da cozinha. Tirei os tênis no hall, subi os degraus dois de cada vez e ia direto para o quarto quando a voz do Akiteru me pegou.
— Ei, Kei! — ele apareceu na porta do quarto dele, apoiado no batente, com aquele sorriso malandro. — Você sabe que tá com batom na boca, né?
Parei no meio do corredor, os olhos arregalando por reflexo.
— Quê?! — levei a mão à boca de imediato, sentindo o gosto doce ainda ali.
Akiteru riu.
— Tá todo borrado... pelo visto foi um treino bem "intenso" pra gerente nova, hein?
Virei o rosto, tentando esconder o rubor que subia.
— Cala a boca...
Ele deu de ombros e sumiu para o quarto, ainda rindo. Fiquei parado um instante, encostado na parede. A vergonha inicial bateu como uma onda curta, mas logo desapareceu.
Fechei os olhos, lembrando da boca da Sarina encostando na minha novamente, do cheiro do perfume dela, dos dedos apertando minha camisa. Em vez de vergonha, uma satisfação quente se espalhou pelo peito. Um sorriso pequeno e involuntário curvou meu rosto.
Passei a língua pelos lábios para sentir de novo o gosto e fui para o quarto, fechando a porta devagar. Joguei a mochila no canto, deitei na cama e, pela primeira vez em meses, não tentei afastar as imagens da cabeça. Eu queria que elas ficassem.
Foi complicado dormir, tive muitos sonhos e muito a pensar, ela tinha me falado que estava com o Goshiki, mas o que de fato significa estar? Estavam sério ou simplesmente se conhecendo?
Respirei pesado, que saber que se dane. Eu não tô nem aí para o que aquilo significa, não quando Sarina correspondeu.
Goshiki que lute.
Fechei meus olhos calmamente eu fiquei de passar lá amanhã, mas se ela estiver tão linda quanto tem estado todos os dias... eu não respondo por mim. Já esperei tempo demais — e sei que ela também anseia por isso.
O despertador tocou mais cedo do que eu gostaria. Tomei banho rápido, mas a cabeça só rodava numa coisa: o que eu faria se ela abrisse a porta do jeito que abriu ontem, os olhos verdes ainda tremendo?
No caminho para a casa dela, o sol ainda era fraco, mas o coração já estava acelerado. As mãos enfiadas no bolso do moletom, tentando parecer frio. Mas cada passo era uma contagem regressiva.
Quando cheguei, ela já estava na porta, como se me esperasse. O cabelo preso de um jeito displicente que deixava escapar algumas mechas pelo rosto, o uniforme justo demais para eu ignorar.
— Bom dia... — ela disse, num tom mais suave que de costume.
— Bom dia. — respondi, seco, mas meu olhar demorou um segundo a mais no dela.
Caminhamos lado a lado pela rua estreita. Ela falava sobre os preparativos do treino, sobre Yachi, sobre como Shimizu estava a ajudando. Eu só ouvia metade. A outra metade estava ocupada demais imaginando o toque da mão dela na minha, o corpo dela ao alcance.
No meio do caminho, ela parou de repente para ajeitar a mochila. O cabelo balançou e a fragrância que vinha dela bateu em cheio no meu peito. Foi o suficiente para eu perder o ritmo.
— Sarina... — chamei, a voz mais baixa do que queria. Ela levantou o rosto, surpresa. — Ontem... — dei um passo mais perto, os dedos quase encostando no ombro dela. — Eu fui duro demais com você.
Ela sorriu de leve, sem desviar os olhos.
— Não foi. — disse baixinho. — Eu me acostumei com esse seu jeito Tsukki, mas se quiser ser um pouco mais carinhoso quando falar comigo eu aceito. — Ela piscou divertida e meu corpo inteiro se inclinou para frente, automático, como se fosse uma força puxando. A rua estava vazia, só os sons distantes de carros. Ela mordeu o lábio inferior, e eu soube: se eu me aproximasse mais um centímetro, não teria volta.
— Não faz essa cara... — murmurei, encostando a testa de leve na dela. — Você não sabe o que isso faz comigo.
Ela respirou fundo, os olhos semicerrados.
— Sei, Kei... sei muito bem.
A respiração dela roçou nos meus lábios, e por um segundo esqueci tudo. Só nós dois ali, a tensão vibrando entre os corpos.
A respiração dela batia contra a minha boca, quente, curta. Eu sentia cada músculo do corpo gritar para atravessar de vez essa distância, acabar com essa espera.
— Chega... — murmurei, quase para mim mesmo. Passei a mão pela nuca dela e a puxei de uma vez, sem hesitar. O choque do corpo dela contra o meu me fez perder o fôlego. E então beijei.
Não foi um toque leve; foi um mergulho. A boca dela se abriu sob a minha, faminta, urgente. Nossos narizes se roçaram, as respirações se misturaram até virarem uma só. Meus dedos subiram pelo cabelo dela os soltando e segurando firme para não deixá-la escapar; a outra mão encontrou sua cintura e a trouxe para mais perto.
Ela respondeu do mesmo jeito, as mãos espalmadas contra meu peito, subindo até meu ombro. Um arrepio percorreu minha espinha quando senti as unhas dela pressionarem de leve minha camisa.
Eu a beijei mais fundo, inclinado para dominá-la, deixando que todo o tempo que esperei desde ontem se transformasse em movimento: um beijo longo, denso, que queimava e acalmava ao mesmo tempo, claro que se alguém passasse por aqui estaríamos ferrados, muito ferrados.
Quando finalmente afastei o rosto um pouco, ainda com a testa encostada na dela, minha voz saiu rouca, entrecortada:
— É isso... era isso que eu não conseguia mais segurar.
Ela ficou imóvel um segundo, os olhos arregalados, a boca úmida ainda tremendo. Então soltou um suspiro profundo, quase um gemido contido, e sorriu de um jeito que eu nunca tinha visto.
Eu não disse mais nada. Segurei a mão dela e seguimos andando, mas dessa vez com os dedos entrelaçados, o coração batendo descompassado.
— Vamos — murmurei, a voz ainda rouca. — Os professores não vão gostar nada se nos atrasarmos.
Começamos a caminhar lado a lado, os dedos entrelaçados. A cada poucos passos eu olhava para ela: a boca ainda úmida, as bochechas quase em tom cereja. Ela evitava meu olhar, mas sorria com o canto dos lábios.
Não resisti. Puxei-a suavemente para um beco mais calmo, encostando-a de leve na parede, só para ter de novo aquele cheiro, aquele calor. Inclinei-me e beijei outra vez. Desta vez mais lento, explorando, saboreando cada segundo. A língua encontrou a dela num roçar suave; senti o corpo dela relaxar, os dedos se enroscarem na gola da minha blusa.
Afastei apenas o suficiente para respirar, o nariz ainda roçando no dela. Ela riu baixinho, nervosa, e eu aproveitei para beijar o canto do sorriso, depois o queixo, depois subir de novo até os lábios.
Continuamos andando. A cada esquina eu puxava-a de novo, prendendo-a um segundo contra mim para mais um beijo curto, um selinho, um roçar de boca que fazia o coração acelerar de novo. Ela retribuía todos, cada vez mais entregue, a mão firme na minha.
Quando o portão da escola finalmente apareceu, paramos. A rua estava silenciosa. Segurei-a pela cintura e puxei devagar, o corpo dela encostando no meu mais uma vez. Beijei-a outra vez, desta vez profundo, lento, deixando claro que não era um adeus apressado.
Ela suspirou contra a minha boca, apoiou a testa na minha e sussurrou um "boa aula" quase inaudível. Eu sorri torto, ainda sem soltar sua cintura.
— Boa aula... — respondeu, a voz baixa, antes de me dar mais um selinho rápido.
— Sabe que não precisa ficar com vergonha, eu sou todo seu Sarina. — Sussurrei notando o rosto dela adquirir ainda mais cor, só então soltei-a, já sabendo qual era a resposta.
Chapter 17: 17
Chapter Text
Sarina
Entrei pelo portão com os joelhos bambos, como se tivesse corrido uma maratona. Era só um beijo, mas parecia que o mundo inteiro tinha mudado de lugar. O corredor do Karasuno continuava o mesmo, os uniformes, os avisos no quadro de recados... mas tudo estava diferente dentro de mim.
O toque da mão do Kei ainda estava na minha cintura, como se tivesse ficado uma marca invisível. A boca ardia, quente, e cada vez que eu lembrava do jeito que ele me puxava para perto, meu estômago dava um salto.
Shimizu me chamou de longe e eu levantei a mão, sorrindo de um jeito que não consegui conter. Ela arqueou uma sobrancelha, notando o rubor.
— Treino pesado? — brincou, como se fosse só sobre os preparativos.
— Alguma coisa assim... — respondi, tentando disfarçar.
Fui direto para o depósito, peguei as pranchetas, as bolas, os coletes. Yachi veio atrás de mim, toda animada. Falava sobre as listas e o amistoso da semana seguinte, mas as palavras vinham como ecos. A cabeça ainda estava no beco, no caminho, no cheiro do moletom do Kei.
Sentei no banco para amarrar os tênis e respirei fundo.
— Concentra, Sarina — murmurei para mim mesma. — É só treino.
Mas a imagem dele inclinando-se, os óculos escorregando um pouco, a boca quente na minha, voltava inteira. Nunca ninguém me beijou daquele jeito. Era intenso, urgente, como se o mundo fosse acabar.
Levantei-me rápido, pegando uma bola para entregar ao treinador Ukai. Precisava me ocupar, antes que alguém percebesse o quanto Tsukishima me desestabilizou.
Tsukishima
Do outro lado do ginásio, encostado na parede, eu observava. Os meninos montavam o aquecimento, Hinata já gritava com Kageyama, Tanaka e Nishinoya faziam graça. Mas eu só via ela.
Sarina andava de um lado para o outro, prancheta na mão, o cabelo preso, mechas soltas balançando quando ela se inclinava para pegar alguma coisa. Ela tentava parecer normal, mas eu conhecia. O jeito como evitava meu olhar, o toque dos dedos na boca de vez em quando.
A visão fez meu peito se apertar. Um orgulho silencioso me atravessou: aquilo não era só fantasia da minha cabeça. Ela estava sentindo também.
Ajustei os óculos e virei para o Yamaguchi.
— Vou pegar água lá fora. — disse, mas a voz saiu mais baixa do que eu esperava.
— Tá... não demora, Tsukki — ele respondeu, já distraído com a bola.
Saí do ginásio, o ar frio batendo no rosto. Encostei no muro, fechei os olhos um instante, lembrando dos lábios dela de novo. Passei a língua pelos meus e sorri sozinho.
De agora em diante, não tinha mais espaço para os jogos de antes ou meras tentativas. Eu ia continuar assim, aos poucos, até ela não conseguir mais fugir.
📝🏐📝🏐📝🏐
O treino foi pesado. Ukai fez a gente suar como nunca, as meninas também ajudavam, carregando bolas, organizando coletes, passando instruções. Era aquele caos organizado típico de Karasuno.
Quando finalmente fomos liberados, estiquei o pescoço procurando por ela. Nem Sarina nem Shimizu estavam mais na quadra.
— Onde será que a Shimizu foi? O treino fica tão sem beleza sem ela. — Tanaka comentou, já com aquele olhar bobo.
— É verdade, não podemos esquecer da Yachi e da Satoji, ela também é tão linda. — Nishinoya completou, e eu só revirei os olhos, segurando a vontade de retrucar.
Pouco depois as duas voltaram. Shimizu parecia a mesma de sempre, mas Sarina estava diferente. O cabelo um pouco bagunçado, o rosto mais pálido, os olhos baixos. Não era vergonha tímida; tinha algo errado, eu percebi na hora.
Sakura apareceu do nada, sorrindo exagerado e vindo direto para mim.
— Tsukki, o que acha de irmos tomar um sorvete? — ela cantou.
— Não. — respondi seco. Ela fez uma careta, murmurando que eu estava mais grosso do que o normal, mas eu não tinha paciência. Yamaguchi, sempre no meio, colocou a mão no ombro dela.
— Deixa ele, Sakura, hoje não é o dia dele.
Na verdade, não era o meu dia porque algo dentro de mim não desligava do que eu tinha visto. Sarina tentava sorrir, mas o corpo falava mais alto: os ombros tensos, a pressa para arrumar as coisas e ir embora, o jeito de manter as mãos na frente do corpo como se quisesse se proteger.
Ela não ia me contar. Eu sabia. Mas eu também sabia que tinha alguma coisa errada. Ajustei os óculos, respirando fundo.
"Tudo bem, Satoji... não precisa me dizer agora", pensei. "Mas eu vou te levar para casa. Vou ficar de olho em você, mesmo que você não peça."
Quando a bagunça do ginásio diminuiu e todos começaram a guardar o material, eu fiquei observando Sarina de canto. Ela dobrava o colete, guardava as garrafas, mas os movimentos estavam diferentes — lentos, tensos. Ela não ergueu os olhos para mim em nenhum momento.
Nishinoya e Tanaka ainda falavam algo sobre o que poderíamos fazer para nos divertir, mas o som já estava distante. Eu só via ela.
Caminhei até onde estava Shimizu, que falava algo no ouvido da Sarina, provavelmente uma última instrução antes de irem embora. Esperei até Shimizu se afastar e parei a poucos passos.
— Sarina. — minha voz saiu mais baixa do que pretendia. Ela ergueu o rosto rápido, surpresa.
— Kei...?
Ajeitei os óculos.
— Eu te levo para casa.
— Não precisa... — ela começou, a voz meio frágil.
— Precisa sim. — interrompi sem deixar espaço para discussão. — Você não está bem.
Ela ficou alguns segundos calada, mordendo o lábio, até enfim concordar com um aceno discreto. Joguei a mochila no ombro e seguimos lado a lado pelo corredor.
Do lado de fora, o fim da tarde já caía, o vento soprava leve. Eu mantinha as mãos nos bolsos, mas o olhar nela.
— Aconteceu alguma coisa? — perguntei, sem encará-la diretamente.
— Nada... só estou cansada. — ela respondeu rápido demais.
Não insisti.
— Certo. — foi tudo o que disse, mas minha voz saiu mais macia.
Seguimos em silêncio por algumas quadras. Eu diminuí o passo para acompanhar o ritmo dela, sem parecer óbvio. Ela olhava para frente, o rosto um pouco mais corado pelo vento frio.
Quando chegamos próximo à esquina da rua dela, arrisquei:
— Sabe que pode me chamar se precisar, né?
Ela virou o rosto, surpresa com o tom.
— Sei... obrigada, Kei.
Assenti, mantendo o olhar firme por um instante. Por dentro, a vontade de encostar nela, de abraçar, de roubar outro beijo era enorme. Mas eu me segurei. Agora não era hora de pressão nem de intensidade.
Só hora de mostrar que eu estava ali.
Quando chegamos à porta da casa dela, ela começou a procurar as chaves na bolsa. Parou um instante, mordeu o lábio inferior. Eu fiquei ali, a um passo de distância, vendo o quanto ela tentava disfarçar.
— Sarina... — chamei baixo.
Ela levantou os olhos, um pouco assustada.
— Oi?
— Respira. — falei quase num sussurro. Sem esperar muito, encostei a mão no ombro dela, deslizando até o braço num gesto lento, um carinho que não invadia, mas dizia "eu estou aqui". — Você não precisa ficar se forçando comigo.
Ela piscou, surpresa com a mudança de tom. Por um momento deixou escapar um sorriso pequeno, tímido.
— Eu sei. Obrigada... — murmurou.
Eu não disse mais nada. Tirei as mãos dos bolsos e, com cuidado, segurei a mão dela por um instante, entrelaçando os dedos. O calor da pele dela estava frio pelo vento, e eu apenas apertei de leve, passando o polegar sobre o dorso num carinho curto.
— Se cuida hoje. — minha voz saiu rouca, mas calma.
Ela respirou fundo e respondeu num tom baixinho:
— Você também, Kei...
Antes de soltar, inclinei-me devagar e encostei os lábios no alto da cabeça dela. Não foi um beijo urgente; foi um toque demorado, quente, quase um afago. Ela fechou os olhos e suspirou, relaxando um pouco.
— Até amanhã — falei por fim, ainda perto.
— Até amanhã... — ela respondeu, os olhos brilhando, e entrou em casa devagar.
Fiquei um segundo parado no portão, as mãos de volta no bolso. O coração ainda acelerado, mas a sensação era diferente: não era pressa, era cuidado.
Sarina
Eu estava péssima, havia menstruado no meio do treino do meninos, eu estava tão feliz e eufórica que as coisa se adiantaram. Peguei meu celular para conferir o calendário, apenas para ter a certeza de que estava dois dias adiantado, tudo porque eu fiquei muito emocionada, agora estou com vontade de chorar e comer doce.
Minha sorte foi que o sangue não pingou na quadra e que a Shimizu tinha remédio para a cólica que eu comecei a sentir do nada, por que meu corpo fica todo estranho?! Eu só queria ter uma menstruação normal e não ficar sensível instantaneamente e sentir que eu era culpada até por existir. Para completar tinha o Tsukishima, ficar perto dele daquele jeito não estava ajudando não quando eu queria beijá-lo loucamente e fazê-lo sentar do meu lado só para eu deitar no colo dele.
Que coisa ridícula Sarina, você nem sabe se o Kei gostaria desse tipo de contato. Respirei fundo e segui para o meu quarto, meus pais estão sempre trabalhando demais então passo bastante tempo sozinha, mas isso não me impediu de fazer o que devia ser feito e após tomar um banho e colocar um absorvente de fluxo intenso e tomar meus remédios, preparei meu chá e fui arrumar as coisas, fiz tudo me arrastando mais fiz, no fim liguei a tv e coloquei um filme que eu queria muito ver: Madagascar, eu consegui chorar com a mordida na bunda do Martim.
Meu deus eu sou um desastre! Meu celular tocou e vi que haviam duas mensagens uma de Goshiki e outra de Tsukishima.
Ain droga eu ainda tenho que resolver as coisas com o Goshshiki!
Abri primeiro a mensagem de Tsukki.
Tava aqui pensando, está afim de tomar um sorvete?
Meu estômago embrulhou. Eu não queria sair, só queria o conforto do meu sofá, meu chá, meu cobertor. Digitei devagar, mordendo o lábio:
Eu estou precisando de um conforto quentinho, o sorvete fica para a próxima.
O status "digitando..." apareceu logo em seguida. Depois "apagou". "Digitando...". "Apagou." Meu coração batia mais rápido a cada vez, mas nenhuma resposta chegou. Suspirei, apertando o celular contra o peito.
Abri a mensagem de Goshiki.
Eu adorei o nosso último fim de semana, estava pensando, se quando o treinador liberar eu posso ir te ver.
Respirei pesado. Tsutomu era tão doce, tão gentil. Uma pontada de culpa me atravessou, porque só de ler o nome dele não senti o mesmo calor que sentia com o Kei.
Preciso falar com você.
Enviei. Sei que ele vai ficar curioso, mas prefiro dizer pessoalmente. Melhor encarar do que arrastar isso.
Deitei de lado no sofá, abraçando a almofada com força. A TV seguia com o filme, mas eu só conseguia ouvir meu próprio coração, os dedos coçando para abrir a conversa com Tsukki de novo. "Digitando... apagou..." apareceu mais uma vez. Meu peito apertou.
"Kei..." pensei, fechando os olhos. "Se você aparecer aqui agora, eu não vou conseguir te mandar embora."
O som da campainha me fez levantar a cabeça do sofá. Olhei para o celular — nenhuma mensagem do Kei. Franzi o cenho. Quem poderia ser a essa hora?
Arrastei-me até a porta ainda de meias, abraçando o cobertor nos ombros. Quando abri, meu coração deu um salto.
— Kei?!
Universo eu estava brincando... Ele estava ali, alto como sempre, o moletom cinza com o capuz jogado para trás. Nas mãos, uma sacolinha de papel e um copo térmico de vapor subindo. O ar frio da rua entrou junto com ele.
— Você disse que precisava de conforto quentinho... — a voz saiu baixa, um pouco rouca, como se estivesse tentando parecer casual. — Então eu trouxe.
Abri mais a porta, surpresa demais para falar. Ele entrou, fechando atrás de si. Da sacola tirou uma barra grande de chocolate e uma caixinha de bombons; do copo térmico, chá ainda fumegante.
— Não sabia se preferia doce ou chá — murmurou, estendendo para mim. — Então trouxe os dois.
Meus olhos arderam de repente. Peguei o copo com as duas mãos, sentindo o calor atravessar os dedos. — Obrigada, Kei... você não precisava.
Ele encolheu os ombros, desviando um segundo o olhar, mas logo voltou a fitar meu rosto. — Queria.
Ficamos um instante assim, no corredor da minha casa, eu de cobertor e cara amassada, ele com o chá e chocolate. O cheiro quente do chá subia e me fazia sentir um pouco menos miserável.
— Vem... — falei baixinho, abrindo caminho para a sala. — Tá frio aqui.
Ele entrou. Largou a mochila no canto e se sentou ao meu lado no sofá sem pedir licença, como se já soubesse que podia. Passou a mão de leve pelo meu ombro, puxando o cobertor para me enrolar melhor.
— Você tá com uma cara péssima, Satoji. — disse sem ironia, quase num tom preocupado. — Tá tudo bem?
— É só cólica... — confessei, baixinho. — Shimizu me salvou no treino. Mas eu tô muito sensível hoje.
Ele fez um som breve de compreensão e não perguntou mais nada. Apenas deixou a mão na minha nuca, os dedos frios fazendo um carinho leve, circular. O gesto me desmontou um pouco por dentro; nunca imaginei Tsukishima sendo carinhoso desse jeito.
— Relaxa — ele murmurou. — Só toma o chá.
Obedeci. Dei um gole, quente, doce, e suspirei. Ele continuou fazendo cafuné, agora passando os dedos pelos fios do meu cabelo, até que eu encostei a cabeça no ombro dele quase sem perceber. Ele não afastou; pelo contrário, ajeitou o braço para me abraçar melhor.
— Viu? — ele disse, num sussurro quase inaudível. — Eu posso ser carinhoso quando você deixa.
Sorri fraco contra o moletom dele, o cheiro familiar me acalmando. Na TV, o pinguim de Madagascar cantava, mas meu mundo inteiro estava no calor do chá, no chocolate sobre a mesa e no braço do Kei me envolvendo com cuidado.
Ali, pela primeira vez no dia, a vontade de chorar deu lugar a um alívio quente. Eu só queria ficar assim um pouco mais.
Tsukishima
Eu sabia que tinha alguma coisa errada e não demorei a entender o quê.
Sarina estava estranha, eu analisei todas aquelas reações dela, depois quando cheguei em casa e parei para pensar lembrei que quando Sakura ficava menstruada ficava um porre do inferno, Sarina por outro lado só não falou comigo.
Abri uma aba no meu navegador e fiz umas pesquisas. Ela precisava de chocolate, companhia e algo quente. Eu estava entretido que nem vi quando meu irmão bateu na porta.
— Tsukki... — Ele parou de falar. — Pelo visto está ocupado, um filme também ajuda.
Akiteru saiu sem dizer mais nada e eu respirei fundo, tomei um banho, me vesti e saí de casa. Passei na conveniência e comprei alguns chocolates e um chá quente e depois fui até ela.
Quando sarina me recebeu com seus olhos brilhantes eu senti meu peito arder e quando ela me pediu para entrar e ficar com ela sentindo-a encostada em meu peito, eu percebi que em todos os anos que nos conhecemos nunca ficamos assim.
Eu me sentei no sofá, ainda com as coisas. Sarina ajeitou o cabelo atrás da orelha, um gesto pequeno mas que eu sempre reparava. Sem falar nada, tirei o chocolate, abri um dos tabletes e estendi para ela.
— Aqui. — Minha voz saiu mais baixa do que eu pretendia.
Ela pegou, as pontas dos dedos roçando nas minhas. Quando mordeu o primeiro pedaço, suspirou de alívio. O som me arrancou um sorriso involuntário. Peguei o copo de chá e entreguei para ela.
— Quente, cuidado.
Sarina sorriu para mim, um sorriso cansado, mas que me desmontou. Ela fez um gesto para eu me aproximar. Sentei ao lado, e quando percebi ela já estava encostando a cabeça no meu peito. Minhas mãos ficaram paradas no ar por alguns segundos antes de se moverem por conta própria: uma pousou em seu ombro, a outra subiu devagar até seu cabelo, começando um carinho leve, quase automático.
O calor do corpo dela, o cheiro de shampoo misturado com chocolate... tudo me atingia de uma vez. Eu nunca tinha estado tão perto dela sem uma barreira de ironia ou brincadeira ou aquela vontade infernal de beijá-la. Passei os dedos pelas mechas do cabelo dela, desenhando círculos no couro cabeludo, e senti Sarina relaxar de verdade, o corpo inteiro afundando contra mim.
— Melhor assim? — perguntei baixo, os lábios quase encostando em sua testa. Ela assentiu, sem abrir os olhos, um som suave escapando da garganta.
Continuei o carinho, agora descendo para as costas, movimentos lentos, sem pressa. A cada toque ela se aninhava mais, e eu sentia meu peito arder, não só de preocupação, mas de algo que eu tentava ignorar havia tempo.
Com Sarina encostada em mim, chocolate no colo e chá quente na mesa, eu percebi que aquele pequeno gesto — estar presente — significava muito mais do que qualquer piada ou provocação que eu costumava fazer e era isso que eu queria de agora em diante.
Eu continuei o carinho no cabelo dela, o polegar deslizando de vez em quando pelo contorno do rosto, afastando uma mecha que insistia em cair. Sarina abriu os olhos devagar e me olhou. Aquele olhar não era de brincadeira nem de ironia, era calmo e ao mesmo tempo tão intenso que meu coração acelerou.
— Obrigada por vir... — a voz dela saiu baixa, quase um sussurro.
— Eu não ia conseguir ficar em casa sabendo que você precisava de mim — respondi, sem pensar muito.
O silêncio que se seguiu não foi desconfortável. Era cheio de coisas que nenhum dos dois tinha coragem de dizer. Eu senti os dedos dela tocarem de leve no meu peito, como se testasse o espaço entre nós. Sem perceber, aproximei mais o rosto, a testa quase encostando na dela.
— Tsukki... — ela murmurou, o nome saindo diferente, mais suave.
Eu deslizei os dedos do cabelo dela para o queixo, erguendo-o levemente para que ela me olhasse. Ficamos assim, a respiração se misturando. Não era um beijo apressado nem roubado. Era apenas um gesto natural, inevitável. Encostei os lábios nos dela com cuidado, um toque leve, quente, lente que a fez suspirar.
Sarina correspondeu no mesmo ritmo, a mão subindo para o meu pescoço, os dedos roçando na nuca. O beijo ficou ali, curto, doce, sem pressa. Quando nos afastamos um pouco, ela encostou a testa na minha e sorriu, ainda com os olhos fechados.
— Era disso que eu precisava hoje — sussurrou.
Eu passei o polegar pelo canto dos lábios dela, ainda sentindo o gosto do chocolate misturado ao beijo, e sorri de volta, mais tímido do que gostaria de admitir.
Depois do beijo, o clima entre nós ficou diferente, mas não desconfortável. Era uma calma boa. Sarina riu baixinho, limpou o canto dos olhos com o dorso da mão e se levantou para pegar outra barra de chocolate.
— Quer dividir? — ela perguntou, já quebrando os pedaços.
— Claro — respondi, aceitando sem cerimônia.
Colocamos Madagascar 2, depois o 3. Em algum momento fizemos pipoca, ela pediu pizza pelo aplicativo e fomos amontoando tudo na mesa de centro. O sofá virou um verdadeiro acampamento: cobertas, almofadas, chocolate, chá, pipoca e pizza.
Eu não lembrava a última vez que tinha ficado assim, sem pressa, só aproveitando a companhia de alguém. Ela ria de algumas cenas, se emocionava com outras, encostava no meu ombro, depois no peito. Aos poucos, a naturalidade tomou conta: minha mão ficou apoiada no braço dela, o polegar passando distraído pelo antebraço enquanto assistíamos.
Quando dei por mim, o sol já tinha ido embora. A janela estava escura, a luz da TV iluminando o rosto dela. Sarina bocejou, deitou de lado com a cabeça no meu colo e continuou a ver o filme, os olhos meio pesados. Eu fiz um carinho leve nos fios do cabelo dela e senti o corpo relaxar.
— Vai acabar dormindo aí — murmurei.
— E você não vai? — ela retrucou com um sorrisinho sonolento.
Não respondi. Continuei passando a mão no cabelo dela, sentindo o peso do dia e o calor da cena. A última coisa que lembro é do cheiro do chá misturado com chocolate, do barulho da TV e do corpo dela encostado no meu. Sem perceber que acabei pegando no sono junto com ela.
Chapter 18: 18
Chapter Text
Sarina
Tsukishima me beijava intensamente eu acabei arfando enquanto o envolvo com minhas mãos, ele estava entre minhas pernas enquanto eu estou sentada na mesinha dele, minhas mãos foram em suas costas e ele sorriu satisfeito.
Em pensar que íamos a praia, mas aí começou a chover e agora estamos aqui no quarto dele esperando Yamaguchi e Sakura chegarem para fazer uma noite do terror, a mão de Tsukki apertou minha coxa com vontade e respirei pesado.
— Acho que... — Ele riu irônico.
— Nem pensar em fugir Satoji. — Kei sussurrou antes de beijar meu pescoço e eu me tremia todinha por dentro, minha pele arrepiou completamente e devolvi arranhando de leve as costas dele que franziu o cenho antes de atacar meus lábios novamente.
A campainha tocou e respiramos fundo. Nos afastando lentamente.
Em pensar que tudo mudou ainda mais depois daquela noite em que ele passou comigo, há dois meses atrás. Naquele dia eu estava frágil, e ele apareceu com chocolate e chá quente. Foi o começo dessa virada entre nós; um detalhe atrás do outro, um cuidado, um toque, até chegar aqui.
Acordar com Tsukishima no meu sofá foi, de longe, uma das coisas mais fofas que já me aconteceram. A sala ainda estava meio escura, só um fio de luz entrando pela janela, e o silêncio cortado pelo barulho leve da TV desligada em stand by. Eu estava deitada com a cabeça no peito dele, o braço dele meio caído sobre mim, como se, mesmo dormindo, não quisesse me deixar escapar.
Havia um cobertor de casal sobre nós. Reconheci na hora que tinha sido minha mãe quem colocou — ela sempre fazia essas pequenas gentilezas sem falar nada. Quando ergui o olhar, vi a bancada da cozinha: café recém-passado, pão quentinho, frutas cortadas num pratinho, chá e bolinhos típicos. Era a cara dela deixar um café da manhã pronto e sair para o trabalho.
Olhei de novo para o Kei. O cabelo estava ainda mais bagunçado, os óculos tortos sobre o nariz, e mesmo assim ele parecia tranquilo, vulnerável. Um sorriso pequeno escapou dos meus lábios. Passei a ponta dos dedos de leve pela manga da blusa dele, sentindo o tecido sob a minha pele, tentando gravar na memória essa cena inteira.
Era engraçado: naquela noite eu estava um caos, cólica, vontade de chorar e comer doce, e agora estava ali, aninhada, com o coração calmo e aquecido. E o motivo de tudo isso estava roncando baixinho no meu sofá.
Aproximei o rosto, dei um beijo leve no ombro dele, bem discreto, só para eu mesma sentir. Não queria acordá-lo de repente, mas a verdade é que eu não queria que esse momento acabasse.
Fomos para a escola depois disso. Tsukki estava calado, e eu sabia que devia estar pensando no que aconteceu ontem, assim como eu. Nós dois temos esse péssimo hábito de não falar tudo o que sentimos. Eu estou completamente apaixonada por ele, mas isso não me impede de ficar na retaguarda. Da última vez que demonstrei demais acabei ficando vulnerável demais... mas agora é diferente. Tenho quase dezesseis anos, ele também. Não somos mais crianças.
A rotina seguiu igual: ele andando com Yamaguchi, a Sakura importunando como sempre. Não me deixou aflita nem nada, mas não deixa de incomodar. Não sou eu quem tem que colocar limite nesse tipo de situação, é ele. Às vezes me pego imaginando como seria se ele me visse com Goshiki me abraçando ou encostando em mim sem cerimônia. Tsutomu, pelo menos, é educado, tem bom senso, só me toca quando estamos sozinhos... mas, mesmo assim, não é legal. Eu não quero isso pendente.
E por falar nele, marquei para o fim de semana. Não quero adiar mais essa conversa, principalmente depois de ter passado a noite ao lado do Kei. Só de lembrar do calor do braço dele me envolvendo, do jeito que ele me olhou antes de adormecer, sinto meu coração acelerar de novo. Preciso resolver logo, antes que a confusão dentro de mim vire um labirinto sem saída.
Tsukishima
O treino daquele dia estava puxado. Ukai fez todos suarem a camisa; nós, como gerentes, corríamos de um lado para o outro organizando bolas, cones e hidratação. Sarina mantinha o sorriso e as instruções com Yachi, mas eu notava os olhares dela atravessando a quadra quando Sakura vinha falar comigo. Era impossível não perceber.
Quando finalmente encerramos e todos começaram a guardar as coisas, fui na direção dela.
— Vamos? — perguntei simples, apoiando a mochila no ombro.
Ela assentiu, mas andou um pouco mais rápido, como se tentasse fugir do assunto. Eu dei um meio sorriso.
— Ficou com ciúmes, né? — falei num tom leve, mas a provocação estava ali.
— Ciúmes? — ela arqueou uma sobrancelha. — Se fosse o Goshiki no seu lugar, você também ficaria.
Ri baixo, acompanhando o passo dela.
— Então admite que ficou. — Ela bufou, apertando a alça da bolsa.
— Não tem nada pra admitir.
A gente saiu do ginásio e andou pela rua já quase vazia. O vento frio da tarde bagunçava um pouco o cabelo dela. Eu me aproximei mais, até que não havia mais ninguém por perto. Encostei de leve os dedos no queixo dela, obrigando-a a me olhar.
— Sabe qual é a diferença, Satoji? — minha voz saiu baixa, mais rouca. — É que esse Gosh-alguma-coisa nunca vai conseguir deixar você assim.
Antes que ela respondesse, puxei-a pela cintura e encostei a boca na dela. O beijo firme, lento o suficiente para fazê-la arfar contra minha boca e me agarrar pelo uniforme. Eu sentia os dedos dela se fechando no tecido das minhas costas, a respiração curta.
Afastei apenas o suficiente para encarar o rosto corado dela, ainda com o polegar passando na pele quente do queixo. Suspirei fundo, sem tirar o olhar dela.
— Viu? — murmurei, o canto da boca subindo num meio sorriso arrogante. — Eu sempre tenho razão.
Ela mordeu o lábio inferior, ainda sem fôlego, os olhos verdes brilhando para mim. Por mais que ela tentasse esconder, o efeito que eu tinha sobre ela era exatamente o mesmo que ela tinha sobre mim e isso estava longe de acabar.
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Sarina
Tsukishima realmente me tira do sério. Às vezes eu quero socar aquele rosto perfeito, às vezes eu quero beijar, outras vezes eu só quero que ele pare de ser tão gato assim. Enfim, são muitas sensações juntas. Depois daquele beijão na rua eu decidi dar o troco: assim que chegamos à porta da minha casa, eu o agarrei e puxei para mim, ficando na ponta dos pés como sempre. Tsukki se abaixou de leve, as mãos dele apertando minha cintura, e nós nos beijamos outra vez, intenso, quente, do jeito que faz a gente perder a noção do tempo.
Quando finalmente consegui me soltar, entrei em casa com o coração acelerado, já pensando na conversa que teria amanhã com Tsutomu. Nós ainda trocamos algumas mensagens naquela noite, mas nada se compara ao cara-a-cara. Eu sei que preciso resolver isso.
Não contei para ninguém. Ninguém precisa saber. Mas eu realmente preciso me posicionar. Conversei com minha mãe sobre situações hipotéticas, e ela me deu um conselho que grudou na minha cabeça:
"Basta se colocar no lugar dos outros. Se você não quer passar por esse tipo de situação, pense como se sentiria e não faça isso com alguém."
Minha mãe é sábia quando não está dizendo que eu pareço uma das Sailors. E ela está certa. Desde o momento em que Tsukki me beijou, tudo mudou, e Tsutomu merece mais do que isso.
O sábado amanheceu com aquela luz meio preguiçosa entrando pela janela. Abri os olhos devagar e por um segundo quase esqueci que tinha uma conversa marcada para hoje. O celular na cabeceira já piscava com notificações. Suspirei, me espreguicei e fui direto para o chuveiro.
A água morna caindo sobre mim ajudou a organizar os pensamentos. Eu precisava estar calma, clara, não enrolar o Tsutomu. No fundo ele não merecia enrolação. Enxuguei o corpo devagar, coloquei um hidratante leve e depois fiquei um tempo em frente ao armário. Nada parecia certo.
Acabei optando por um vestido simples, de tecido leve, que eu gostava de usar no calor. Solto, mas ainda assim bonito. Um toque de blush, rímel discreto, cabelo preso num coque bagunçado que deixava algumas mechas soltas no rosto. Não estava me arrumando para seduzir, estava me arrumando para encarar uma verdade.
Quando terminei, o celular vibrou de novo. Era uma mensagem do Tsukishima.
Tsukki: Bom dia, Satoji. Já acordou?
Eu mordi o lábio, os dedos pairando sobre o teclado.
Eu: Bom dia... sim, acabei de me arrumar.
Segundos depois, outra mensagem dele:
Tsukki: Vai sair?
Olhei para o espelho, suspirei. Ele sabia ou pelo menos intuía.
Eu: Vou resolver umas coisas. Depois te conto.
Três pontinhos apareceram, sumiram, voltaram. Ele digitava e apagava. No fim mandou:
Tsukki: ... Tá. Boa sorte então.
Um pequeno sorriso escapou.
Eu: Obrigada.
Bloqueei a tela do celular, respirei fundo e conferi minha bolsa: documentos, um lenço, batom, carteira. Peguei o celular de novo — mais uma mensagem dele:
Tsukki: Não demora, tá?
Meu coração deu uma batida estranha. Respondi rápido:
Eu: Prometo que não.
Desliguei a tela antes que ele pudesse escrever de novo. Precisava estar inteira para o que vinha a seguir. Saí do quarto, calcei as sandálias e, com um último olhar para o espelho, desci as escadas. Era hora de ir encontrar Tsutomu. Eu respirei fundo e olhei mais uma vez no celular. Goshiki tinha respondido minha mensagem com um "pode me dizer pessoalmente". Era agora ou nunca.
Marcamos num café perto da estação. Quando cheguei ele já estava lá, sorrindo como sempre. Por um instante me senti ainda mais culpada — ele não merecia isso.
— Oi, Sarina — ele disse, abrindo um sorriso caloroso. — Achei que você não viria.
— Eu não ia deixar você esperando — sorri de volta, nervosa. — Precisamos conversar.
Sentamos. Ele pediu um suco, eu pedi chá. Fiquei mexendo na xícara sem coragem de olhar direto.
— Tsutomu... — comecei devagar. — O último fim de semana que passamos juntos foi muito bom, de verdade. Eu gosto muito de você. Mas eu preciso ser honesta. Eu acabei me interessando por outra pessoa e eu jamais conseguiria ficar com você escondendo isso. Você merece tudo de bom e alguém que goste de você na mesma intensidade.
Ele ficou em silêncio alguns segundos, os olhos fixos no copo. A expressão dele mudou de surpresa para um aperto contido.
— Entendi — ele disse, a voz um pouco mais baixa. — Se essa é a sua escolha, eu não posso fazer nada.
Depois levantou os olhos e forçou um meio sorriso.
— Só espero que esse idiota do Karasuno seja um cara legal. Se ele estiver no time de vôlei... não vou pegar leve com ele!
Eu ri baixinho, aliviada com a forma como ele lidou.
— Ele é... diferente. Mas é um cara bom — respondi. — Obrigada por entender.
Levantei e me inclinei para ele, dando um beijo leve na bochecha.
— Você vai encontrar alguém incrível, Tsutomu.
Ele assentiu, desviando o olhar para o balcão.
— Cuida de você, Sarina.
Saí do café com o coração apertado, mas também mais leve. Era justo com ele e comigo. O ar frio da manhã bateu no meu rosto como um choque. Apertei a bolsa contra o peito e respirei fundo, tentando organizar o turbilhão de sentimentos. Não era fácil encarar Tsutomu, pois pareceu que eu só usei ele, quando na verdade estávamos bem no início, mas eu precisava ser honesta. Agora era seguir em frente.
Caminhei alguns metros até a esquina. O celular vibrou. Era uma mensagem curta do Tsukishima:
Tsukki: Já acabou?
Meu estômago deu um salto. Digitei com os dedos trêmulos:
Eu: Acabei. Estou saindo agora.
Ele não respondeu. Quando levantei os olhos, lá estava ele, do outro lado da rua. Moletom preto, capuz para baixo, as mãos nos bolsos. O cabelo claro brilhava no sol fraco. Não sei se ele me seguiu ou se só passou "por acaso", mas só de vê-lo ali senti um calor estranho subir pelo corpo.
Atravessou a rua com calma, parando a poucos passos de mim.
— Você demorou. — disse simples, mas a voz baixa tinha um tom que me arrepiou.
— Era uma conversa importante. — respondi. — Eu precisava fechar esse ciclo.
Ele assentiu, os olhos sérios, mas um canto do lábio subiu num meio sorriso.
— Então fechou?
— Fechei. — confirmei.
Ficamos em silêncio alguns segundos, só o barulho distante dos carros. Ele deu um passo para mais perto.
— Ótimo — murmurou, inclinando o rosto. — Porque agora eu não preciso me segurar mais.
Antes que eu pudesse perguntar o que queria dizer, Tsukishima me puxou pela cintura. O choque do corpo dele contra o meu fez o ar escapar dos meus pulmões. A boca dele desceu sobre a minha num beijo quente, lento no começo, depois profundo, faminto. O gosto do chá ainda estava na minha boca; o calor da respiração dele se misturou ao meu, fazendo minhas pernas ficarem bambas.
Ele me apertou mais, as mãos firmes nas minhas costas, e eu agarrei a camiseta dele para não cair. O mundo sumiu por um instante: só o calor, o cheiro, a língua dele explorando a minha, o peito dele subindo e descendo rápido.
Quando se afastou um pouco, a testa encostada na minha, estava com o olhar arrogante de sempre — mas os olhos queimavam.
Eu arfava, tentando recuperar o fôlego. O rosto dele estava a centímetros do meu, o sorriso torto ainda ali e sei bem o motivo.
— Idiota... — murmurei, mas minhas mãos continuavam presas na gola dele.
Ele inclinou de novo e me beijou outra vez, um beijo mais curto, mas tão intenso quanto o primeiro, antes de se afastar devagar.
— Vamos? — perguntou, como se nada tivesse acontecido.
Assenti, ainda sem fala, sentindo o coração bater fora de ritmo. Seguimos juntos pela rua, os dedos roçando um no outro até se entrelaçarem naturalmente.
E agora estamos aqui, nos beijando intensamente antes dos outros chegar.
Kei afastou a testa da minha, os olhos ainda presos nos meus. A respiração dele batia no meu rosto, quente. A mão na minha coxa escorregou para minha cintura, mas ele parou ali, como se estivesse lutando contra si mesmo.
— Você não faz ideia do que causa em mim me dando tanta liberdade, se soubesse não ficaria desse jeito — murmurou, a voz baixa e rouca.
Eu engoli seco, sentindo cada músculo do meu corpo reagir ao toque dele. Ele se inclinou e roçou os lábios nos meus mais uma vez, um beijo profundo, intenso, mas desta vez mais lento, como se quisesse memorizar. Senti a língua dele pedindo passagem e, sem pensar, cedi. Um arrepio subiu pela minha espinha; minhas mãos deslizaram pelas costas dele até a nuca, puxando de leve.
Ele sorriu contra minha boca, satisfeito, e eu quase ri também — até que a campainha tocou.
Paralisamos. A respiração ainda entrecortada, os olhos colados. Ele encostou a testa na minha de novo e suspirou:
— Droga... — murmurou. — São eles.
Com um esforço que parecia doer, Kei se afastou um pouco. Eu deslizei da mesinha para o chão, ajeitando a saia. Ele passou a mão pelos cabelos, tentando parecer normal.
— Vamos respirar — ele disse, abrindo um meio sorriso cúmplice.
Eu sorri de volta, tentando controlar o rubor no meu rosto, ainda com os lábios formigando. O toque dele, o olhar dele... era impossível esquecer que tudo isso tinha começado de um jeito tão simples, tão inesperado.
Do corredor, ouvi a voz de Yamaguchi e Sakura chamando:
— Kei! Sarina! Trouxemos os filmes!
Troquei um olhar rápido com Tsukki; a cumplicidade silenciosa dizia mais do que qualquer palavra.
— Vamos — ele murmurou. — A noite do terror está só começando.
Ajeitei o cabelo o mais rápido que pude, tentando não pensar que ainda sentia os dedos dele na minha cintura. Kei respirou fundo e abriu a porta, me dando espaço para ir na frente enquanto ele vinha atrás e bem lentamente. Yamaguchi entrou sorrindo, com uma sacola de pipoca industrializada na mão, e Sakura veio logo atrás carregando refrigerantes.
— Vocês estão muito quietos — Sakura comentou, arqueando uma sobrancelha, desconfiada.
— A gente estava escolhendo os filmes — Kei respondeu, aquela calma estudada de sempre, sem nem olhar para mim.
Sentei no sofá, cruzando as pernas, tentando parecer relaxada. Ele colocou os DVDs sobre a mesa e, por um segundo, nossos dedos se tocaram de novo. Meu coração deu um salto, mas ele apenas continuou organizando as coisas como se nada tivesse acontecido.
— Então, qual é o primeiro? — Yamaguchi perguntou.
— O clássico — disse Sakura, levantando a capa de um filme de terror. — Vocês dois vão aguentar?
Kei soltou um meio sorriso. — Quem sabe...
Eu apenas ri, tentando esconder o nervosismo. Enquanto eles arrumavam o projetor e fechavam as cortinas, eu me recostei, respirando fundo. Era quase impossível acreditar que, minutos antes, eu estava presa naqueles braços, recebendo aqueles beijos.
Kei sentou-se ao meu lado. Não encostou em mim — não na frente deles — mas o joelho dele roçou no meu por um instante. Pequeno, imperceptível para qualquer um, mas suficiente para incendiar de novo minha pele.
A noite do terror podia estar começando para todos nós. Para mim, a sensação era de que o verdadeiro suspense estava ao meu lado, olhando para a tela com aquele ar blasé, enquanto, no fundo, me deixava cada vez mais fora do meu eixo.
Já fazia semanas desde a noite do terror.
Desde então, tudo entre mim e o Kei parecia viver num segredo: olhares roubados nos intervalos, mensagens escondidas de madrugada, encontros curtos depois dos treinos. Terminar de vez com o Tsutomu me deu um alívio estranho — a culpa continuava ali, mas era leve. A verdade é que meu coração já tinha escolhido, mesmo quando eu ainda fingia não saber.
O ginásio do Karasuno estava silencioso naquela tarde. Era sábado e só restavam bolas espalhadas e um cheiro de madeira encerada no ar. Eu empurrei a porta com o ombro e respirei fundo, tentando ignorar o frio na barriga.
Ele estaria ali. Sempre estava, mesmo que Kei nunca ficasse até mais tarde ou quando Kageyama e Hinata insistiam em ficar, ele passou a ser mais presente depois que nós começamos a ficar direto.
Kei estava agachado perto da rede, guardando algumas bolas. A luz filtrava pelas janelas altas, dourando o cabelo dele de um jeito quase irreal. Quando levantou o rosto e me viu, largou a bola e ficou parado. Não sorriu, mas os olhos dele brilharam de um jeito que só eu reconhecia.
— Achei que não ia vir — disse, com aquela voz baixa que me arrepiava.
— Disse que vinha — respondi, cruzando os braços para parecer mais segura do que eu estava. — E que ia te mostrar como um bloqueio de verdade se faz.
Provoquei, ele soltou um riso curto. Sempre que eu tentava provocá-lo, era assim — como se por dentro estivesse se divertindo mais do que mostrava. Antes que eu chegasse até a rede, ele atravessou a quadra em passos longos.
Quando parou na minha frente, tão alto, tão perto, meu coração disparou. Ele segurou minha mão de repente e a puxou para junto dele.
— Para com isso, Sarina — murmurou, baixinho. — Toda vez que você fala comigo assim eu...
Ele não terminou. Apenas encostou a testa na minha. A respiração dele batia quente no meu rosto; eu podia sentir cada músculo do meu corpo querendo se inclinar para mais perto. Então ele me beijou.
Foi um beijo carregado de tudo o que tínhamos segurado durante aquelas semanas: calor, urgência e até mesmo um carinho escondido. A mão dele desceu da minha mão para a cintura, apertando de leve. Eu me apoiei nos ombros dele, subindo na ponta dos pés para alcançar melhor. Senti o corpo inteiro reagir — um arrepio subiu pela minha espinha.
— Se alguém entrar agora... — murmurei entre beijos, rindo, porque era impossível não rir.
— Que entre — ele respondeu sem se afastar, os olhos dourados queimando nos meus. — Já não me importo.
Aquilo me fez perder o fôlego de outro jeito. Eu deslizei os dedos pela nuca dele, puxando de leve. O beijo seguinte foi mais lento, mais profundo. Ele me apertava como quem finalmente se permitia sentir.
Quando finalmente nos afastamos, ambos estávamos ofegantes. Eu senti os lábios formigando. Ele passou o polegar no canto da minha boca, e aquele toque suave contrastava com a força do beijo.
— Vamos ter que contar uma hora ou outra — disse, quase um aviso, mas a voz soava mais doce do que dura.
Eu assenti, ainda sorrindo, mesmo com o coração acelerado.
— Uma hora ou outra — repeti. — Por enquanto, é só a gente.
Ele arqueou uma sobrancelha, um quase sorriso surgindo. Depois se inclinou e me puxou de volta, desta vez para um beijo mais suave, quase cúmplice. O ginásio vazio ecoava com nossas respirações e risadas baixas.
No fundo, eu sabia que algo novo estava apenas começando.
Fim

(Previous comment deleted.)
QueentheVampire on Chapter 1 Wed 29 Oct 2025 11:21PM UTC
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