Chapter 1: Fura-neve (prólogo)
Chapter Text
Kelly Clarkson - Where Have You Been (Tradução ...www.youtube.com › watch
– Sai daqui, Ekko – Jinx sussurrou em resposta ao olhar desesperado de seu velho amigo. A essa altura do campeonato, ela já não sabia se ele era real ou se estava apenas delirando de novo com fantasmas de seu passado.
De verdade, ela não se importava. Já não se importava mais. Com nada. Fosse imaginação ou não, tudo estava fadado a acabar naquele fatídico momento. Era assim que deveria ser. Era assim que seria. Tudo terminaria do jeito que tudo começou: com uma bola de fogo devastando tudo e todos ao redor… ela inclusive. Ela, principalmente. Enfim, pagaria pelos seus crimes. Em poucos segundos, livraria o mundo de sua presença agourenta. Vingaria todos aqueles que se foram por sua culpa – Silco, Vander, seus irmãos…, Isha. Libertaria todos aqueles Zaunitas que ficaram, de uma vez por todas, do infortúnio de viver sob seu manto de azar, afinal, a vida já os castigara o suficiente. Sua irmã já sofrera o suficiente, faria isso por ela também. Vi merecia ter um final feliz, mesmo que fosse ao lado de Cait, era o mínimo para compensar anos de mágoa e loucura. Vi foi o que restara de sua família, e sua morte, a protegeria de um destino trágico, do desgosto de ter que aturar uma lunática como irmã. Boom , e tudo sumiria… um simples boom e daria seu suspiro final com a consciência de que, pelo menos uma vez na vida, a última que fosse, faria a coisa certa. E o certo a se fazer era quebrar o ciclo. Ela estava decidida. A bomba seria seu último ato, e nada a impediria. Não estava com medo, não estava triste, estava aliviada e pronta. Assim, tranquila como uma criança se entrega ao sono, fechou os olhos, respirou fundo e … silêncio. Por Janna, há quanto tempo não esperava por isso. Rompendo o silêncio quase sagrado naquele esconderijo, Jinx puxou o pino e… boom!
– Espere! - gritou Ekko com todo o ar de seus pulmões e acionou quase que instantaneamente o mecanismo de seu Z-Drive. De repente, a figura apática de Jinx, quase que num piscar de olhos, estava de novo em sua frente.
– Tarde demais, Ekko – repetiu Jinx como se fosse a primeira vez, sem despregar os olhos na bomba em suas mãos por um segundo. Boom , outra explosão, que foi imediatamente impedida por ele.
Ekko, quase sem fôlego, decidiu usar outra abordagem. Sabia que devia ser cauteloso, mas incisivo ao mesmo tempo. Precisava desesperadamente cativar sua atenção, de alguma forma. Por mais doloroso que fosse ver a pessoa mais importante de sua vida tentar se matar em looping, bem em frente ao seus olhos, reviveria aqueles 4 segundos quantas vezes fossem necessárias para mantê-la ali, com ele. Não poderia se dar ao luxo de fracassar, ele havia feito uma promessa e desde que voltara à sua realidade não pensava em outra coisa: não desistiria dela, não dessa vez.
– Eu só quero falar com você Pow… Jinx – disse com uma determinação impressionante, sem soltar a máquina por um só segundo. Boom . Ekko persiste, voltando os segundos, sem parar.
– É sempre uma dança com você, né? – desabafou, gotas de sangue escorrendo de sua testa – Eu acho que vou sentar aqui um pouco - suspirou - ver se consigo convencer uma velha amiga a não explodir a gente.
Suas palavras surtiram efeito em Jinx, ela o olhou de lado, e em seguida, tocou na bomba. Ela não tinha parado para pensar, mas talvez, só talvez, se aquele Ekko ao seu lado fosse real, a última coisa que gostaria é acabar explodindo mais um rosto conhecido.
– Tô cansada de conversar - Jinx se inclina para frente, em direção ao abismo escuro. Sem booms dessa vez.
4 segundos voltaram de novo. Para Ekko, aqueles eram os segundos mais longos de sua vida e os mais importantes também. Ele acabara de sair de uma realidade onde tudo era mais bonito, mais otimista, mais glorioso, onde tinha tudo o que sempre quis: um lar, uma família, o amor de Powder... e de repente estava de volta à sua realidade. Como quem acorda de um sonho bom demais para ser verdade, só podia lamentar. Mas ele não tinha tempo para lamentações. Jinx não tinha esse tempo. Como um lapso, lembrou-se do porquê voltou: para salvar seu lar, sua família e Powder… ou Jinx, o nome já não importava mais, voltara para salvar a garota que sempre amou. Ele voltou por ela, e se para isso ele tivesse que correr contra o tempo e ser seu Garoto Salvador de novo, ele o faria, por ela.
– Ekko, sério, vai embora! Não vê que não aguento mais?! – ela gritou entre lágrimas, sua voz quebrando – Tô cansada de arruinar tudo, eu não quero sua ajuda, eu não quero mais nada… só sumir! Por que nem isso eu consigo?!
– Jinx, me escuta, por favor, só por um segundo… – Ekko começou, se aproximando dela com cautela – Eu aprendi com alguém, alguém muito especial, que me disse que não importa o que aconteceu no passado, o importante é continuar lutando, porque sempre há alguém por quem vale a pena lutar.
– Quem te disse isso? Como você… – suspirou derrotada – Por que tá aqui, Ekko?
– Hmm, você não acreditaria se eu te contasse, mas… acho que não temos mais nada para perder, certo? Eu te conto, mas por favor… sai de perto da margem. Por favor – seus olhos quase suplicavam.
Jinx ficou imóvel por um instante, mas olhou para a engenhoca que Ekko segurava com tanta apreensão. Seus olhos se voltaram aos pequenos macaquinhos que se mexiam de dentro do vidro. Um detalhe curioso… um detalhe muito familiar. Dirigiu seu olhar de volta a Ekko e depois de outro suspiro, decidiu dar ao velho amigo o direito de fala.
– Satisfeito? – Jinx revirando os olhos, deu um passo para trás, recuando seu movimento suicida – Agora desembucha. É bom que valha a pena!
– Estive com Professor Heimerdinger em outra linha temporal – com uma expressão de vitória no rosto que não conseguiu conter, começou a explicar – Nós acabamos indo parar lá depois que Jayce… um amigo – se interrompeu ao perceber que ela o olhava com um julgamento claro – nos mostrou o núcleo da Hexcore. Enfim… fomos para lá e só conseguimos voltar com ajuda dessa máquina.
– Humph , e depois eu que sou a maluca! Você não está falando coisa com coisa. Não perca seu tempo, adeus Ekko! – Jinx retrucou ameaçando pular mais uma vez.
– NÃO! – seu grito estridente paralisou Jinx, seus olhos abertos o encaravam de canto de olho – Eu não tô maluco. Eu realmente estive lá e… tudo era tão real, tudo tão… incrível! Você teria adorado conhecer aquela Zaun… iluminada, limpa, pacífica e… tínhamos amigos lá, Benzo, Vander, Silco, eles até voltaram a se falar…ah! E Mylo e Claggor estavam lá também!
– Hah, acredite no que você quiser, mas não me venha com esse papinho de conto de fadas. Não tem graça! Só um universo sem mim poderia ser tão feliz assim. Está sonhando de novo, Ekko! Vê se acorda!
– Mas Jinx... estou dizendo a verdade! – Ekko insistiu – Eu estava lá, eu vi com meus próprios olhos, eu senti na pele! Você também estava lá! Você era feliz, você era amada… todos te admiravam! Todos viviam me dizendo da grande sorte que eu tinha…
– Sorte, comigo? Conta outra! – Jinx fez uma careta sarcástica – E a Vi e a namoradinha dela, eram felizes também? – perguntou com amargura em sua voz.
– É que… elas não estavam lá. Naquela explosão… quando éramos crianças, as duas… – Ekko respondeu inseguro com a reação de Jinx.
– Há, eu sabia, mesmo em outro universo estamos separadas. Porque não estou surpresa? – Jinx não estava mais gritando, mas sua voz ainda estava cheia de desesperança.
– Ei, mas você seguiu em frente! Todos seguimos. Todos sentiam muito orgulho e admiração por você por isso… você era um exemplo do que Zaun poderia ser: resiliente, talentosa, forte!
– Então, nesse seu sonho eu era tudo isso, hmm? Você sempre foi iludido, sabia? Vivendo nas nuvens com visões boas demais para serem verdade, utopias. Até parece, eu um exemplo, só se for de psicopata, assassina, destruidora de sonhos, “o que não ser quando crescer”... a lista é longa, mas posso continuar se quiser – respondeu, virando de costas para Ekko agora, seus braços trêmulos entrelaçados sobre o peito.
– Não, Jinx – Ekko falou com calma, se aproximando com hesitação, sempre com hesitação. Observou suas costas nuas. Tão pálidas, sujas, machucadas, sangue ainda escorria de uma recente cicatriz. – Você pode ter cometido erros no passado, todos nós cometemos, mas isso não faz de você um erro. Veja só, olhe ao redor. Veja quantas coisas engenhosas você construiu, você é uma inventora e tanto! Jinx, olhe para Zaun! Vander e Silco passaram a vida tentando unir uma cidade mais desunida de toda Runeterra, e você conseguiu em questão de meses! Tem murais seus pelas paredes, você é um símbolo de resistência. Apesar de tudo, você... é essencial.
– Você também com essa coisa de símbolo? – respondeu frustrada, fitando-o firmemente nos olhos agora, o violeta cintilante fervendo dentro de si – Não sei o que veem de tão demais em mim, eu nunca fiz nada disso de propósito, Ekko, eu só quis… eu só quis proteger… só quis proteger… – subitamente a figura distorcida de Isha a encarava, x em seu olhos, cinzas por toda parte. A garotinha corria de um lado ao outro, travessa, traiçoeira . – Não importa mais, olha o que aconteceu… eu nem sei onde ela tá! – a ideia de que Isha se fora para sempre ainda era algo que negaria com todas as suas forças, apesar da mais nova versão assombrada, recém recrutada sua patrulha particular de carrascos – E tudo porque ela quis ser como eu. Não, Ekko. Eu não sou uma heroína, nunca fui. Sinto muito, mas não é agora que vou ser – Jinx desviou a cabeça, os olhos cheios de lágrimas, as pernas quase sucumbindo.
Seu olhar dissociado, distante, focava na garotinha de capacete brincando de pontaria com as mãos, atrás de Ekko. Ele só a observou, outra vez mil questões vagavam adoidadas em sua mente: de quem Jinx está falando, afinal. De repente sentiu como se algo o espreitava pelas costas, Jinx não desviava os olhos no horizonte. Em alerta, seus olhos seguiram e virou-se para deparar-se com… nada. Mas que raios ela está olhando?
– Jinx? – Ekko murmurou, confuso, numa tentativa vã de retomar o fio da conversa. "Quem é 'ela'? Do que ela tava falando?". Mas não teve coragem de perguntar.
Então apenas olhou ao redor. O esconderijo dela… era diferente do que esperava. Acolhedor, até. Luzes coloridas pendiam das vigas, almofadas espalhadas pelo chão, e em cada canto… rabiscos. Vibrantes, distorcidos. Infantis. E ainda assim, havia algo perturbador naquela doçura.
Virou-se, parando diante de um espelho — rachado, deformando seu próprio reflexo em mil fragmentos. Mas o que realmente o fez congelar foram as pinturas ao lado: duas palmas estampadas na parede, uma em rosa, maior; outra menor, azul. Ele não sabia porquê, mas aquilo mexeu com ele. Um tremor instintivo percorreu sua espinha.
"De quem era aquela mãozinha menor?" A confusão crescia, se apertava em seu peito como um nó que não se desatara.
E Jinx… ainda segurava a bomba. Não baixava a guarda. Talvez nunca baixasse.
– Seja qual for seu joguinho não vai funcionar comigo, tá? Eu nem sei porque você está aqui para início de conversa, não devia estar salvando o mundo com seus amiguinhos insetos ou coisa assim. Outro dia mesmo, você queria me ver morta! – Isha fazia caretas pelas costas de Ekko, ao lado de Mylo, Claggor, Silco, Vander, Vi… todos circulavam à sua volta, afrontosos e maliciosos. Um verdadeiro circo de horrores.
– Não, não, vocês também não! PAREM, PAREM COM ISSO, PARA POR FAVOR! – Jinx não se conteve, estava no seu limite, tapou os ouvidos até os dedos esbranquiçar, enquanto batia a bomba contra sua têmpora. Rangendo os dentes, completamente absorta em uma crise. Ekko, não pensou duas vezes, precisava intervir. Fosse lá o que ou com quem estivesse falando, preferiu ignorar. Ele não pararia até que ela parasse e com uma urgência impressionante, foi exatamente o que ele fez.
– Jinx, para com isso! Está se machucando, PARA! – Agarrou a garota por trás, que resistia ferozmente à contenção, dando chutes no ar e gritos que Ekko jamais esqueceria.
Sua resistência, no entanto, não seria maior que sua insistência e lá ficou, abraçado sobre a pele fria da garota como uma criança segura seu ursinho. Com cautela, segurou suas mãos pequenas trêmulas e geladas - e nossa como estavam geladas. Englobou-as com todo o seu calor. Aos poucos, ela foi se acalmando, podia sentir seus músculos cedendo, a tensão esvaindo. Sentindo as pontas de seus cabelos curtos roçando suas bochechas, junto ao peso de seu corpo inteiro, não pôde deixar de sorrir, aliviado.
Ele conseguiu silenciar seu caos, conteve a crise. Sentir seu corpo cálido sobre suas costas era uma sensação tão estranha, mas tão… boa. Ele existia, afinal, estava ali com ela, estava ao seu lado outra vez. Mas por que? Por que agora? Não sabia responder, mas naquele momento, ela não queria também. Estava segura outra vez e sua mente clareou como o dia. Não se sentia assim desde…. Isha. A lembrança foi como um caldo de água fria à dura realidade que àqueles braços envolventes a fizeram, mesmo que por alguns segundos, esquecer. Seus dedos afrouxaram somente o bastante para soltar a bomba, que tilintou estatelada no chão. Não precisava dela, pelo menos ainda não, não por enquanto.
– Olha – Ekko respirou fundo e voltou a falar, sem suavizar o toque em momento algum – Eu sei que nem sempre fui pacífico com você, e por isso também tive meus motivos, mas nada disso importa agora, porque isso era antes de…
– Antes de quê, menino do tempo? – Ekko a soltou gentilmente, apenas para se virar de frente à ela, sem soltar suas mãos de seu agarro reconfortante.
– Antes de eu perceber o quão importante você é para mim – Ele a olhou no fundo dos olhos, se atentando a cada detalhe daquele rosto tão familiar, tão perfeito. Como pode ter odiado tanto àquele rosto? – antes de eu perceber o quanto senti sua falta, de seu sorriso, da sua voz, das suas… da gente – Jinx o observava rendida àquele tato tão nostálgico, aqueles olhos castanhos, tão profundos e impenetráveis, tão difíceis de esquecer. Como conseguiu ignorá-los por tanto tempo? – Desde aquele dia no esconderijo de Silco, jurei que nunca mais pensaria nisso, que te odiaria com todas as minhas forças, mas… foi difícil e eu simplesmente cansei de fingir ser forte o bastante. Eu… eu não te vejo mais como uma inimiga, Jinx, eu só não consigo te odiar tanto assim. Só quero minha melhor amiga de volta.
– Oh Ekko, você… realmente sente isso? Eu mudei, não sou mais aquela garotinha tola de antes, eu… piorei. Não sou boa para ninguém, só desiste, tá? Vai ser melhor assim – Jinx relutou em se afastar do seu doce toque, mas o fez mesmo assim. Ela sabia como aquilo terminaria se baixasse a guarda novamente. Como terminou todas as outras vezes, com Vi, com Isha…
Ekko com uma confiança súbita a alcançou e abraçou de novo, dessa vez mais forte, como se isso pudesse a impedir de fugir dele. Suas mãos a envolveram num gesto caloroso, aquecendo o corpo gélido de Jinx, seu rosto pousou em seu ombro e a agarrou sutilmente como se fosse algo frágil, mas precioso. Frente a frente. Ele sentiu seus olhos se fecharem e sua boca tremer, e por um momento desejou que ficassem assim, juntos para sempre.
– Eu sei, você já sofreu muito Jinx, você sofreu tantos traumas e tudo isso sozinha. Não é à toa que você é bom… você! Não, Jinx! Eu não vou cometer o mesmo erro. Eu não vou mais desistir de você. Não vou nunca mais desistir de você outra vez! Você nunca mais vai sofrer sozinha, ouviu?
Jinx, por outro lado, ficou atônita, totalmente paralisada. Seus olhos arregalados, a cintila em seu sangue fervendo, seu coração disparado e o corpo tão fraco quase cedeu. De repente, sem que percebesse lágrimas escorreram de seus olhos, como se sentimentos reprimidos transbordassem sem seu consentimento. O abraço a envolveu e por mais estranho que fosse, ela gostou, como gostou do outro. Droga, Ekko. Odiava a sensação de gostar daquilo, mas não podia negar que talvez não estivesse tão sozinha quanto pensasse. E se morrer era deixar aquela doce sensação para trás, talvez ela não quisesse mais isso, pelo menos não naquele momento.
– Ekko, você é mesmo muito irritante, sabia? – Jinx sussurrou quebrando o silêncio, e ainda com lágrimas nos olhos – Posso sempre contar com você para arruinar os meus planos. Sempre bancando o garoto salvador, né? – ela esboçou um sorriso e o fitou com carinho.
Ekko não pôde deixar de rir com o comentário, e repousando a mão sobre sua bochecha, enxugou suas lágrimas.
– Alguém precisa ser.
Passados alguns minutos de puro silêncio, os dois se sentaram no chão, Ekko garantiu que ficassem longe de explosivos e beiradas, só para garantir.
– E me conta, como eu era no seu sonho? – Jinx perguntou em tom casual.
– Realidade alternativa!
– Aff, tanto faz, só me responde!
– Hmm... – Ekko pensou por um momento, antes de continuar – Naquela realidade alternativa, – enfatizou com graça o termo – éramos digamos assim… mais sadios. Você tinha a pele mais macia, mais corada... sua franja era meio bagunçada, e você usava dois coques no cabelo. Ah! E tinha uma mecha rosa
– Rosa, né? – Jinx murmurou baixinho para si mesma, instantaneamente se lembrando da irmã mais velha. Seu coração apertava forte.
Ekko pegou um pedaço de papel jogado no chão e com um lápis desenhou um retrato daquela Powder. Ele traçou o papel com carinho e com todo o cuidado de não esquecer os detalhes que ainda estavam frescos em suas lembranças.
– Pronto, não está perfeito, mas já dá para você ter uma ideia! - Ekko entregou o papel, um pouco nervoso por uma reação.
– Puxa! Bem, parece que eu tenho bom gosto em qualquer universo mesmo – Jinx disse com um sorriso, tentando disfarçar a dor tocando o papel – Ela parece feliz… é bonita!
– Ah, e como! – Ekko tagarelou, corando instantaneamente ao perceber a rapidez com que havia falado.
– Nossa! – Jinx deu uma risada divertida – Falando assim até parece que você gosta dela. Tem algo que preciso saber?
– Não, o quê? Não... peraí! – Ekko interrompeu, seus olhos brilhando com uma faísca travessa e suas bochechas fervendo. Como ela sabia do beijo? Não tinha como ela saber? Embaraçado e gaguejando, lembrou-se com quem estava falando, é claro que ela estava caçoando com sua cara e conseguindo. Mas o feitiço ainda podia virar contra o feiticeiro – Jinx, você está com ciúmes?
– Ah, por favor! – Jinx respondeu com um riso nervoso, afastando a ideia, ruborizando quase tão rápido quanto Ekko – Não tem como ter ciúmes de uma pessoa que nem mesmo existe. E, além disso, supostamente somos a mesma pessoa. No fim das contas, não tenho que ter ciúmes do meu… amigo.
– Amigo? – Ekko repetiu, a palavra caindo da boca dele de forma quase disfarçada. Ele não conseguiu esconder o sorriso de alegria e virou para ela – Ouvi certo ou tô enlouquecendo? Você realmente disse amigo?
– Disse. Não é o que somos? Amigos... ou já se arrependeu? – Jinx perguntou, com um sorriso inseguro, com medo de ter dito demais.
– Não, claro que não – Ekko respondeu rapidamente, o sorriso nervoso no rosto. – Só... não pensei que não fosse ouvir essa palavra de novo tão cedo.
– Hmm, e essa geringonça, para que serve, é alguma arma letal, bomba nuclear ou o quê? – Jinx perguntou, querendo mudar de assunto o mais rápido possível, não sabia o porquê mas essa intimidade parecia boa, e isso a assustava um pouco. Ela logo se levantou e ficou andando em direção oposta à Ekko.
– Não, Jinx, nem tudo são bombas, sabia? – Ekko respondeu, rindo um pouco – Aliás, você devia saber. Foi você que me ajudou a montar. Se não fosse por você, ainda estaria preso lá.
– Eu? Eu construí isso aí? – Jinx olhou para ele, os olhos arregalados, incrédula – Por isso, os macacos... ela pensou atônita, começando a acreditar.
– Sim senhora e respondendo sua pergunta, nós o apelidamos de Z-Drive. É um dispositivo que volta no tempo 4 segundos, mas é muito perigosa para usar sem propósito.
– Por que não mais? 4 segundos parece tão… pouco.
– Ah, acredite em mim, muitas coisas podem acontecer em 4 segundos, vidas podem ser… poupadas – hesitou em continuar quando se lembrou que sem essa máquina, Jinx não teria sido salva e tudo teria sido em vão. Não conseguia parar de pensar que no fundo, Powder, aquela que conhecera em outro universo, ajudara a salvar Jinx, mesmo que sem querer.
– Uau, então é verdade! – Jinx exclamou, os olhos brilhando, rindo consigo como se até pensar nisso fosse um absurdo – Chefinho, você tinha razão. Existe mesmo uma outra eu, e ela é… boa!
– É claro que sim, Pow Pow! – Ekko disse com um sorriso satisfeito. Quis retribuir seu apelido de infância com o que Vi usava para chamá-la.
– Ai… não me chame assim tá, me dá calafrios! – exclamou, rindo, mas com um leve arrepio – Ahhh, faz anos que não escuto isso!
– Tudo bem… Pow Pow – disse em tom provocativo, até que, de repente, foi golpeado por uma chave de fenda, que Jinx havia jogado rapidamente.
– Venha, vamos sair daqui – Ekko se levantou, ainda sorrindo, seguindo em sua direção.
– O quê? Pra onde? – Jinx pulou assustada.
– Tem um lugar que eu queria que você conhecesse. Vai te fazer sentir melhor, garanto - disse a puxando-a gentilmente pela mão, mas ela parou.
Ekko percebeu que algo a perturbava e por um instante temeu que tivesse sido precipitado demais. Há pouco tempo atrás, Jinx estava decidida a tirar sua própria vida, tão convencida que quase o conseguiu, seis vezes, por mais que ninguém além dele mesmo soubesse das outras tentativas. Agora, ela estava lá, ainda abalada, retraída, envolta em sua mente, mas estava lá. Isso já era um baita avanço. Mas talvez, ele estivesse se esquecendo do que aconteceu para deixá-la naquele estado, do que aconteceu enquanto ele estava fora. O que aconteceu entre ela e Vi, com Caitlyn, e até com aquela tal “ela” ainda não identificada. Talvez ela não estivesse pronta para se abrir para ele, e não seria justo forçá-la a nada.
– Sabe Jinx, eu não sei o que aconteceu com você enquanto eu estive fora, mas… gostaria que soubesse que quando quiser… se você quiser… bom… pode conversar comigo. Somos amigos de novo, estou aqui para você – Ekko disse com uma ternura comovente.
Ela não disse nada, só olhou para baixo, como se não estivesse pronta para encará-lo naquele estado. Ela não conseguia entender, porque ele estava sendo tão legal com ela, depois de tudo o que ela fez com ele, com os Fogolumes, com Zaun. Ela abraçou os próprios braços, buscando algum consolo ou quem sabe aquele calor de mais cedo.
– É que, eu não entendo. Por que está sendo tão legal comigo? Nós dois sabemos bem que não mereço sua bondade ou seu perdão, e eu… – suspirou – eu não quero sua misericórdia.
Ekko se entristeceu ao vê-la assim, era difícil enxergar uma Jinx tão cabisbaixa, tão desbotada, justo ela que sempre foi uma explosão ambulante de cores e energia. Ele a quis abraçar novamente, dizer tudo o que sempre quis dizer, desde o dia em que a conheceu. Dizer que ela era a garota mais incrível, bonita e criativa que já conheceu, e que não passaria nem mais um segundo sequer longe dela. O garoto contorceu os lábios e tirou seu casaco. Ele gentilmente o colocou sobre as costas da amiga e esperou que aquilo que lhe aquecesse um pouco.
Jinx ficou perplexa, mas não pode deixar de se encolher no agasalho. Era quentinho, confortável, suave, e tinha o cheiro de Ekko, uma mistura de grama fresca e hortelã. Sensações boas que ela não pôde deixar de notar. Antes que pudesse processar, Ekko tirou uma mecha de seu cabelo da frente de seus olhos e levantou seu queixo.
– Não tem nada a ver com misericórdia, Jinx. Eu… só percebi que o tempo é algo muito precioso, cada segundinho vale tanto quanto uma vida inteira. E, sei lá… de repente eu parei para pensar que enquanto vivermos no passado, remoendo memórias, presos aos nossos erros, e ao que poderia ter sido, não vamos nunca conseguir seguir em frente, entende? - Jinx o olhou com olhos reflexivos, e Ekko continuou. – O que quero dizer é que às vezes dar um passo adiante significa deixar algumas coisas para trás.
Jinx não disse nada, mas ficou admirada com a sinceridade das palavras de Ekko. Por Janna, não queria admitir, mas sentia tanta falta de ouvir a voz do amigo, de suas carícias. Ela odiava admitir, mas ela sabia que ele daquela vez estava certo.
– Você realmente é um mistério, senhor - respondeu com um sorriso travesso e puxou sua mão para fora do esconderijo.
Ekko ficou surpreso por alguns segundos. Powder tinha lhe dito as mesmas palavras na outra linha temporal. Isso só deixou mais claro para ele: Powder e Jinx nunca foram pessoas diferentes, por mais que tenha tentado por anos dividi-las em duas personalidades. Elas eram a mesma pessoa, sempre foram. Aquela mesma menina brincalhona que zuava na infância era aquela mesma adoslecente rebelde que trabalhava para Silco, que por sua vez, também era a mesma mulher vulnerável e fragmentada em sua frente. Ele amou Powder, então, ele também amava Jinx, porque ele amava cada pedacinho dela, seja qual fosse sua aparência ou seu nome. Ele continuaria amando-a de todos os jeitos, em todos os universos.
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Ekko então pegou sua mão e a conduziu até o túnel dos Fogolumes. O percurso foi curto, mas parecia uma eternidade para os dois, que permaneceram quietos e serenos, aproveitando a calmaria que exigia aquele momento. Quando chegaram ao túnel, o garoto pediu que ela fechasse os olhos, e embora um pouco desconfiada, obedeceu.
– Ekko, é bom que isso não seja nenhuma armadilha, ou gracinha. Se for eu juro que…
– Quer esperar? Não, não é nada disso, prometo. Pronto, chegamos. Pode abrir os olhos!
Jinx abriu os olhos e ficou abismada com a beleza do lugar, que, apesar de ser uma área em Zaun, parecia totalmente diferente. Quase como um refúgio, um oásis de tranquilidade. Fazia tempos que não via um lugar tão iluminado, com tanta vida. Para onde quer que olhasse, a paisagem a vislumbrava ainda mais.
– Puxa, que lugar… lindo... quase nem parece Zaun! – Jinx disse, maravilhada. – Você construiu tudo isso?
– Bem, sim, mas tive muita ajuda – Ekko respondeu, com um sorriso humilde, um pouco envergonhado – Essa é base dos Fogolumes, a minha comunidade, um lugar onde qualquer um é bem-vindo. Um lugar para recomeçar.
Jinx ficou em silêncio, até que algo chamou sua atenção. Ela caminhou até um mural na parede, um painel imenso, cheio de rostos familiares. Muitos deles eram seus amigos (ou ex-amigos), e ali, as imagens pareciam eternizar um tempo que ela já não sabia se conseguia reviver. Como se a culpa e a saudade pesassem em seus ombros, ela cambaleou para frente, traçou o concreto com suas mãos e recostou-se sobre a estrutura. Ekko a observava de longe, e sentiu uma dor no peito. Ele sabia muito bem o que Jinx sentia.
– E esse… é o nosso mural de memórias. Meu lugar favorito também – Ekko disse, se aproximando de Jinx, que ainda estava com os olhos fixos nas figuras de quando ela e Vi eram crianças, da época em que ainda eram irmãs de verdade.
– Sinto falta… dos abraços da Vi, do beijinho de boa noite do Vander, até de Claggor… daquele idiota do Mylo – Jinx murmurou, com a voz embargada, enquanto colocava a mão na parede. Era como se o toque nela a conectasse com tudo aquilo que sentia falta – Saudades da… – a mínima menção ao nome da garotinha era impensável – nossa, como sinto falta daquela pestinha! Esse lugar é tão quieto, tão... calmo. Ah, coelhinha, você teria adorado esse lugar. Sinto tanto sua falta – Ela suspirou, as palavras misturando melancolia e nostalgia.
Ekko ouviu seus sussurros com atenção e não pôde deixar de sentir a dor por trás de cada palavra. Naquele momento percebeu uma coisa, algo que nunca tinha parado para pensar. Jinx tinha sofrido muito na vida, tanto quanto ele. Ela também havia passado por dificuldades e enfrentado tantas perdas, mas, no fim do dia, ele tinha a garantia de um lar repleto de pessoas queridas para lhe confortar, lhe apoiar. Jinx, por outro lado, não. Ela sobreviveu ao caos de Zaun, por tantos traumas, grande parte sozinha. Não era à toa que beirava à loucura e agia com perversidade. Ekko sentiu remorso por isso, e pensar que a mulher em sua frente, desfalecida e angustiada, era o monstro que todos temiam. Que ele temia.
– Sabe, Ekko... eu me sinto muito melhor aqui. Como não me sentia desde... – Jinx disse tirando Ekko de seus pensamentos.
– Ei... – Ekko disse, gentilmente colocando sua mão em seu ombro. – Não tem de quê. Afinal, é isso que amigos fazem – Ele disse, a voz baixa, sentindo uma pontada dentro do peito, como se essas palavras quisessem escapar de seu coração.
– Sabe, Ekko, quando disse aquilo mais cedo… sobre lutar para quem vale a pena… – Jinx hesitou, virando-se para ele com um sorriso fraco – Foi Powder quem te disse isso?
– A própria – Ekko sorriu, de forma suave. – Sabe, Jinx, as ideias dela consertaram Zaun, e… hmm, não consigo deixar de pensar que você faria maravilhas se usasse seu potencial para o bem.
– O que quer dizer com isso, menino prodígio? Agora, quer que eu mude? – Jinx perguntou, com uma indignação evidente de quem se ofendeu.
– Não, não, não. Você entendeu errado – Ekko falou rapidamente, segurando as mãos dela – Só estou dizendo que nem tudo está acabado, Jinx. Ainda há uma chance de consertar tudo, de nós consertamos tudo, juntos!
– Não tô entendendo, Ekko, consertar o quê? – indagou confusa, sobrancelhas arqueadas – Por acaso você não tá falando daqueles desgraçados de cima, né? Porque se tá, Ekko, eu juro que não respondo por mim mesma!
– Jinx, você sabe tão bem quanto eu que Piltover não merece um pingo do nosso suor, mas há pessoas que amamos que estão lá em cima, agora, dando as suas vidas para salvar todos, e por essas pessoas, só por elas, vale cada gota! – Ekko parou por um instante e respirou fundo – Além do mais, acho... não, eu tenho certeza… que eles não tem a mínima chance de sair dessa sem você no time.
Jinx congelou por um minuto, e olhou incrédula para Ekko. Ela tirou suas mãos das dele. Parte dela sabia que Ekko estava certo, Vi estava lá em cima dando tudo de si para uma cidade que nunca a valorizou e nem por isso, ela desistiu. Ela estava lá, lutando pela Caitlyn, por uma pessoa que por mais desprezível que fosse para Jinx, era alguém importante para sua irmã. Isso a fazia pensar na força de Vi. Ela sempre foi tão durona, mas no fundo sabia que Vi só tinha medo. Sua irmã era corajosa porque tinha medo de perder sua família. Jinx não podia deixar de se sentir orgulhosa por isso, mesmo sabendo que também era seu ponto mais fraco. Voltando aos seus sentidos, Jinx voltou a pensar em Ekko, e numa tentativa desesperada de justificar a lealdade repentina do amigo ela perdeu a razão.
– Ahhh, então é por isso que você voltou... – Jinx se afastou, uma expressão de ceticismo no rosto – Eu estava achando estranho. Afinal, por que você voltaria do seu universozinho perfeito para ajudar uma renegada como eu? Porque você quer que eu lute. Eu tenho cara de soldado, por acaso? Ekko, não vê que eu não tenho mais forças para isso? Eu vou acabar piorando as coisas, como sempre faço – Jinx disse, caminhando rumo à saída, se esforçando para esconder o dilema interno que vivia dentro de si.
– Jinx, espere! – Ekko chamou, indo atrás dela – Você não está entendendo... eu voltei porque eu quis voltar! Porque… por mais perfeita que fosse a vida do Ekko daquele outro universo, ela não era minha. Minha casa não era lá, nunca foi. Sempre foi aqui, com você. Porque Jinx... Powder... ou sei lá, não me importa. Você pode ser quem quiser, eu não vou embora – Ele olhou nos olhos dela, com uma sinceridade crua e se aproximou de mansinho, até enxugar suas bochechas com a toque suave de suas luvas – Jinx, não chore, você é perfeita. Não existe outro universo para mim, porque esse é o meu lugar, com minha... amiga – Ekko declarou esperançoso.
Ao ouvir aquelas palavras, Jinx paralisou. Ela estava sem palavras. Aquilo... aquilo fazia sentido. Ela se sentia especial para ele, e pela primeira vez, essa sensação parecia genuína. “Não chore, você é perfeita”, essas palavras ecoaram a cabeça dela como as vozes de um passado distante. Era a voz de Silco, o criminoso mais respeitado e temido de Zaun… e seu pai, que a acolheu quando ninguém mais quis. Seu peito apertava mais e mais ao se lembrar dele. Ele acreditava nela, no potencial de Jinx. Talvez, apenas talvez, Silco estivesse certo. Talvez ela pudesse fazer a diferença, se estivesse ao lado de Ekko novamente. Seu amigo também acreditava nela, e com uma estranha naturalidade, ela também acreditava nele. Ekko não precisava ajudá-la, muito pelo contrário, o esperado seria ver ele tentando prendê-la ou até matá-la. Ela não o julgaria por isso. Mas não, ele escolheu ajudá-la, acolhê-la… salvá-la, outra vez. Não, ela não o decepcionaria, não mais. Ela não ia decepcioná-lo, nem a Silco, nem a Vander, nem a Vi, nem a ninguém. Era o mínimo que poderia fazer por Ekko. Era o mínimo que poderia fazer por todos. Isha estava certa, era hora de ser a grande heroína de Zaun, a heroína que Isha enxergava nela!
– Então... o que me diz. Jinx, fala alguma coisa. Estamos nessa… juntos?
Ekko esperava uma resposta, mas Jinx saiu caminhando em silêncio. Por um momento, pensou que ela fosse embora.
– É, pelo menos eu tentei – Ele murmurou, com um sorriso triste, quando de repente... Splash ! Uma onda de tinta azul caiu sobre seus pés.
– Tá esperando o quê, chefinho? Essa luta é nossa! – Jinx gritou, com uma gargalhada.
Ekko explodiu de felicidade e com uma rapidez impressionante correu e a abraçou, sentindo um alívio imediato. Ele pôs o queixo por cima de sua cabeça e a segurou firme, simplesmente não queria soltá-la. De seus olhos, involuntariamente lágrimas escorreram e pingavam de suas bochechas. Ele sabia que ainda havia força nela, e ele a admirava muito por isso.
Jinx também não pôde parar de sorrir, seus lábios se abriram de canto a canto. O abraço a surpreendeu, mas ela amava surpresas, e percebeu o quanto amava os abraços de Ekko. Em seus braços ela estava segura, protegida… uma sensação relativamente nova para ela. Ela rodeou seus braços ao redor de Ekko, o que fez o coração de ambos disparar um pouco mais. Passado o calor do momento, Ekko ainda enxugando os olhos questionou:
– Jinx, mas por que essa tinta?
– Tá brincando, né? Jura que tá me perguntando isso? E eu achando que me conhecia! – Jinx respondeu, com um sorriso debochado – Olha meu estado. Se pensa que vou lutar assim, o surtado é você, viu?
– Assim como? Você está… ótima! – respondeu tímido.
– Tá me zoando, né? – Jinx fez uma careta.
– Desculpe, tudo bem, tudo bem, como quiser – Ekko suspirou, como quem não quer contrariar – Mas mais do que transformações mirabolantes, precisamos de um plano… e um dos bons.
– Não se preocupe Ekko, tá falando com uma especialista. Veja e aprenda, chefinho: será um espetáculo e tanto! – Jinx disse com um olhar tão ameaçador que fez Ekko engolir em seco. Mas logo essa sensação de medo foi substituída por uma imensa admiração.
– É, vocês realmente amam fazer uma entrada - murmurou para si mesmo, ao perceber o quanto tinha de Powder em Jinx. Como pude ser tão cego esse tempo todo?
Em um instante, Ekko e Jinx já tinham reunido ferramentas, tintas, pincéis e sucatas de todos os tipos. Então, os dois começaram a trabalhar juntos. Estavam sozinhos e por um instante, Ekko ficou grato que a base havia sido evacuada para a batalha entre Noxus e o Lado Alto, que agora contaria com a ajuda da realeza da Subferia, como as pessoas gostavam de pensar.
– Tome Jinx, encontrei alguns retalhos de roupa que encontrei na base, não sei se servem , mas… pegue.
– Ui, são horríveis, mas dá pro gasto. Um toque aqui e outro ali, e vai ficar novinho em folha. Ah, já ia esquecendo… fiz isso aqui para você – Jinx atirou um cropped, indiferente, à Ekko.
– O quê? Não, não não, me sinto ótimo com minhas roupas! Não vou pôr isso! – Ekko disse indignado.
Dois minutos depois, Ekko apareceu usando o cropped que Jinx fez. Ela sorriu satisfeita.
– Beleza, e como fiquei? — Jinx apareceu com suas novas roupas: botas pretas, uma calça preta rasgada nos quadris, um novo cinto de utilidades e uma faixa de top, com uma touca roxa remendada que lembrava a boca de um tubarão. Ela estava orgulhosa de seu novo visual
– Uau! Você está… — Ekko comentou, olhos arregalados, e meio boquiaberto – Bem. Muito bem – coçou a garganta, tentou desesperadamente esconder o óbvio. Jinx, num instante, corou com o comentário de Ekko, mas lutou para não transparecer.
– Sua Powder pode ter senso de moda e tal, mas duvido que ela tenha meu charme! – gargalhou triunfante.
– É… – soltou naturalmente – Quer dizer, não… quer dizer… por que não seguimos? – mudou de assunto, constrangido, virando-se de costas. – Me diga, “especialista de armas mais cobiçada de Zaun”, como vamos lutar sem armas?
– Ha, está atrasado, engraçadinho, já pensei nisso... mas acho que você não vai gostar muito. Peguei um dos hoverboards dos Fogolumes. Espero que não se importe — Jinx sorriu com suspense — Ah e já ia esquecendo. Ekko quero te apresentar a alguém — Ekko pareceu intrigado – Conheça Rhino, minha mais nova criação! Uma arma com mil utilidades, velocidade, basicamente o ápice da belicultura moderna. Projetada, arquitetada e construída por euzinha! — Jinx fez uma pausa e, com um sorriso malicioso, falou para a arma: — Rhino, não é um amorzinho? Você é, não é?
– Posso aceitar você ter pego o hoverboard... mas ver você falando com uma arma… é outra história — Ekko revirou os olhos, tentando manter a compostura.
– O que foi, chefinho, tá com ciúmes de uma arma? — Jinx provocou, com um sorriso travesso.
– Eu? Puff, claro que não… eu… deixa para lá – Ekko revirou os olhos – Sabe… tava pensando nunca vamos chegar a tempo da batalha andando. Então…
– Então…?
– A gente bem que podia usar seu esconderijo para isso, não? Só se você quiser, claro! É que fiquei pensando: seria um baita desperdício deixar hélices daquele tamanho mofando lá sozinhas. O que acha? – coçou o pescoço com a mão, e de seus lábios nasceu um sorriso hesitante.
– Hmm, deixa eu pensar… é… não é sua pior ideia! É, eu topo! – Jinx disse – Nada mau, garoto gênio!
Ela lhe deu um soquinho no braço que fizeram os dois gargalharem. Ekko não conseguiu esconder o quanto estava feliz por vê-la sorrir novamente, com vida em seus olhos e vontade de lutar.
– Ah, você gostou? Então que tal eu te mostrar isso? – Ekko sorriu confiante ao mostrar um croqui do projeto que fez.
– Uau, quando teve tempo de fazer isso? Olha só pra isso… você é inacreditável mesmo, não é? – Jinx sorriu de volta.
– O quê? Não pensou que fosse a única com carta nas mangas, pensou? Pensei que me conhecesse.
– Hmm, eu também. Não lembrava de você ser tão exibido e desatento. Seu cérebro encolheu ou o quê?
– O quê? Do que está…
– Fala sério, Ekko, com esse ângulo de propulsão aerodinâmica você queria o quê? Estraçalhar a gente? Vai, me dá isso aqui! – Jinx pegou agressivamente o lápis da mão de Ekko e ininterruptamente rabiscou o papel inteiro. Mudando detalhes aqui e ali, a cada traço, deixando o garoto sem palavras – Taram ! Agora sim: IM-PE-CÁ-VEL!
– Uau! Como você…? Uau! Você é uma gênia! Se Heimerdinger visse isso… – Ekko abaixou os olhos, sentia saudades do mentor – Jinx… tem noção do quanto isso é incrível!
Jinx o olhou estatelada. Ninguém, nem mesmo Vi ou Silco haviam lhe dito algo assim antes. Seu coração disparou, como se fosse pular para fora. Ela sentia um fervor dentro dela, o mesmo que sentiu quando Ekko a abraçou.
– Ekko… – disse ainda tentando recuperar o fôlego – Eu… não sou muito boa com essas coisas, mas… obrigada, tá?
– Pelo o quê?
– Você sabe, por tudo isso, por me dar uma segunda chance, por mais que eu não entenda bem o porquê. Só… obrigada – falou evitando contato visual.
– Não precisa me agradecer por nada. Na verdade sou eu devia estar te agradecendo – Ekko sorriu de volta e balançou a cabeça –
– E pelo o quê exatamente? Por minhas habilidades incrivelmente únicas de montar projéteis ou pelo seu cropped? Eu falei que ia ficar bom e você não querendo me…
– Jinx – interrompeu a garota que desembestou a falar – Por não desistir de tentar – falou suavemente.
– Por alguém especial… vale a pena, não é? – Jinx disse emocionada, e Ekko estava nas nuvens.
O Sol estava quase se pondo, quando Jinx e Ekko voltaram do esconderijo com seu projeto concretizado. Jinx convenceu Ekko que o balão devia ser colorido para fazer jus ao propósito da batalha. Então, estavam finalizando suas pinturas.
– Acho que por aqui já foi! Estamos preparados! — Ekko disse, orgulhoso do trabalho em equipe. Ekko tinha desenhado o símbolo dos Fogolumes pelas hélices do balão, traços que lembram uma ampulheta em vários tons que enfeitavam o transporte. Ekko, observava Jinx, enquanto pintava orelhas de coelho no topo do balão.
– Para que são as orelhas de coelho? — Ekko perguntou, curioso.
– Ahh isso… é só uma coisa entre… ela e eu, nada demais. Eu costumo… costumava chamá-la de “coelhinha”, como a minha mãe fazia comigo – Jinx disse, com um tom melancólico, a ficha sobre a morte da garotinha ainda não caíra totalmente – Queria que ela estivesse aqui para ver isso. Ela iria amar tanto tudo isso!
– Ei, Jinx... não fique assim. Quer… me contar o que aconteceu? Qual era o nome dela? – Ekko perguntou timidamente, mas ela não respondeu. Deduziu aquilo como um “não”. – Jinx, sabe, ela…
– Ekko, será que podemos não falar sobre isso? – falou introspectiva, quase defensiva.
– Claro, desculpe, eu não quis…
– Tá, tá tudo bem – Jinx fechou-se outra vez reclusa, distante. Ekko reprimiu-se por isso, não devia tomar no assunto, ainda não… era muito cedo. Precisava animá-la, fazê-la esquecer da garotinha antes que ela se afastasse completamente de novo. Então uma ideia lhe veio à mente… Blaft, em um instante Jinx foi atingida por uma explosão de tinta.
– Tá com você! – Ekko riu consigo, se divertindo com a reação de surpresa dela – O que? Não vai dizer que esqueceu como se brinca?
– Ha, até parece! – uma feição completamente oposta nasceu em seu rosto – Você acha engraçado, né? Toma essa! — Jinx se virou, desafiada, e atirou tinta rosa em Ekko.
– Ah, então vai ser assim? Toma isso! — E, com isso, começaram a correr pela base, como duas crianças brincando de pega-pega. De repente, eles eram aquelas crianças infantes e inocentes de novo, como era para ser.
– Quem perder taca tinta no outro! – gritou Jinx confiante que ganharia a aposta.
– Isso é o que vamos ver, Pow Pow! - retrucou Ekko.
Jinx se escondeu atrás de um longo ramo da árvore que ficava ao centro da base. Até que foi surpreendida por Ekko, que a pegou pela cintura, antes que ela pudesse prever. Ele então a levantou, enquanto ela se contorcia de tanto rir. Não se dando por vencida, Jinx usou sua super velocidade de cintila para virar o jogo, afinal, ela nunca perdeu para Ekko antes, ou pelo menos era o ela queria ele pensasse. Num golpe rápido e certeiro, Jinx derrubou Ekko no chão.
– Desista, chefinho! Eu venci, para variar - rindo de sua glória – Parece que algumas coisas nunca mudam, né? Você continua uma menininho perdedor!
– Isso é porque eu sou um cavalheiro e sempre deixo você ganhar! – Ekko contra-atacou, com um sorriso malicioso no rosto.
– Ha, até parece, perdedor! Eu ganhei a aposta, agora me passe aquelas tintas, tenho muito trabalho a fazer! – Jinx ria e debochava.
– Você só se esqueceu de uma coisinha… eu nunca desisto! – com uma determinação inabalável e Ekko deu uma rasteira que a fez cair no chão quase em cima dele.
Jinx então caiu sobre Ekko, o empurrando para trás. Ele riu ao perceber a confusão que tinha provocado. Jinx fez uma careta, que logo se tornou uma risada sincera.
– Ei, isso não vale, é golpe baixo! – reclamava indignada à medida que tentava se desentrelaçar do corpo de Ekko.
– Aprendi com a melhor – apontando para Jinx – É… acho que se pode considerar um empate – Ekko disse glorioso estendendo a mão para Jinx.
– Huh, trato é trato… eu acho! – bufou, apertando sua mão, com um sorriso de lado.
– Ei, o que que significa esse símbolo que você está pintando em mim? — Jinx perguntou, aproveitando a suavidade das pinceladas da mão de Ekko em seu braço. — Você também pintou isso no balão.
– Isso é o meu símbolo. O símbolo dos Fogolumes, na verdade. É uma ampulheta. Representa o tempo, e bom… o tempo é muito importante para mim, sabe? — Ekko explicou, com um toque de seriedade na voz.
– É, eu me lembro de você grudado naquele relógio como se sua vida dependesse dele – Jinx disse em tom nostálgico.
– Foi um presente de Benzo… você sabe o quanto ele era importante para mim – sussurrou.
– Você também estava com ele na ponte outro dia – murmurou cabisbaixa – Sabe, Ekko, acho que nunca vou esquecer do seu olhar naquela noite. Eu… eu achei – suspirou – pensei que por um momento eu realmente tivesse morrido e… levado você comigo.
Ekko ficou perplexo com a revelação, aquele dia na ponte também despertava mágoas dentro dele. A forma como bateu em Jinx, como quase a matou. Foi tudo tão rápido, tão intenso, até que boom , lá estava ela, no chão, derrotada por si mesma, sob escombros e cinzas. Aquela visão ainda lhe dava arrepios. O sentimento de culpa por não tê-la impedido a tempo ainda o assombrava. Lembrava claramente da sensação de alívio quando sentiu seu pulso, fraco, mas existente. Ele passou a mão pelo seu rosto queimado e tirou o excesso de sangue e detritos, desejando que, por Janna, sobrevivesse. Ele a pegou no colo, e a pôs em um local seguro, assim que ouviu vozes de Silco e seus homens. Silco saberia o que fazer. Ele poderia ser um monstro para Ekko, mas ele jamais faria mal à Jinx. Daquele momento em diante, a tensão conflitante dentro de si só cresceu, e só cessou no dia em que viu sua figura inconfundível espalhada em cartazes por toda Piltover. Ela estava na mira dos Defensores, mas estava viva. Isso já era mais do que suficiente naquele momento.
– Foi você não foi? – Jinx questionou Ekko que não pareceu entender muito bem – Foi você que me levou até Silco. Eu estava mais pra lá do que pra cá, mas ainda assim eu senti. Senti alguém… você!
– Ah, não tem porque mentir para você… fui eu sim – sua feição se fechou – Foi naquele dia que percebi que… – Ekko olhou fundo nos olhos de Jinx, atentos a cada palavra sua – Não importava o quanto quisesse te esquecer, te odiar… eu continuaria… continuaria fracassando, porque… – pausou por um segundo – tive medo de te perder – confessou, palavras entaladas em sua garganta há muito tempo.
– Ekko – colocando as mãos sobre suas bochechas e as acariciando – Você não vai me perder, tá bom? Eu prometo – eles trocaram olhares profundos, conectados um ao outro. Aos poucos, sentiram, quase que por um instinto ou impulso, a necessidade de aproximar seus rostos.
Quando estavam próximos o suficiente, já capazes de escutar a respiração um do outro, um estrondo os despertou de volta à realidade. O barulho era de um pincel que Ekko esbarrou por acidente, no mais inconveniente segundo, rompendo a tensão romântica que pairava no ar. Os dois, ainda tímidos, se afastaram de depressa, quase como se temessem o que aconteceria se continuassem perto.
— Eh… bom, v-você deveria ter um símbolo também! - Ekko perguntou limpando a garganta, para quebrar o clima desconfortável do quase beijo.
– Hm, mas quem disse que eu não tenho? — Jinx sorriu, passando o pincel e fazendo um grande "X" em rosa no cropped de Ekko e nela mesma. — Pronto. Agora você está na minha mira, e olha, ainda estamos combinando! – Ekko riu, mesmo que um pouco tímido com a ideia de estar ali, tão perto de Jinx.
– Está ótimo, mas falta uma coisinha. Vem aqui — ele passou tinta roxa na ponta dos dedos e com um toque suave, fez dois traços delicados no rosto de Jinx, como um artista dando o toque final em sua obra-prima. Ela ficou tão corada que quase se camuflou com a cor da tinta.
– Você também precisa de uma marca, senhor tempo. — Jinx disse com um sorriso travesso, pegando a tinta ao seu lado — E para sua sorte, ainda me lembro como se faz. Fazia em você toda hora quando éramos dois pirralhos catarrentos, lembra?
Ekko riu de leve ao lembrar daqueles tempos, quando a vida era bem mais simples, apesar das dificuldades. Quando acabaram suas tinturas, olharam um para o outro e não conseguiam deixar de sorrir.
– Bom, acho que agora está tudo pronto — Ekko concluiu, olhando para o trabalho que haviam feito juntos.
– Não, ainda não — Jinx negou, com um brilho no olhar. — Falta o grand finale ! Ekko, pega aquela tesoura, preciso que me faça um último favor.
Ekko olhou para ela, curioso, e pegou a tesoura, sem questionar.
– Quero que corte o meu cabelo, bem curto, como… como o da Vi — Jinx falou com firmeza, os olhos brilhando de determinação — Quero parecer durona como ela. Sempre quis isso, então hoje serei.
Ekko, não disse nada, só a olhou com olhos gentis e obedeceu. Com cuidado, começou a cortar o cabelo de Jinx, a tesoura movendo-se de forma precisa. Depois, como um toque final, ela pintou uma mecha de sua franja de violeta, algo que o fez lembrar da Powder do outro universo. Essa lembrança, por mais doce que fosse, trouxe à tona um pensamento em Ekko: não importava o universo em que estivesse, Jinx sempre seria a única. Seja pronta para festa ou para guerra, ela era a dona do seu coração, e nada jamais mudaria isso.
– Pronto, chefinho. Agora sim, vamos explodir algumas coisas! — Jinx falou com um sorriso vitorioso, pegando Rhino com confiança renovada.
Ekko, vendo a transformação de Jinx, sentiu o peso da responsabilidade, mas também o calor da amizade e da lealdade. Eles estavam prontos. Então, quando estavam saindo, duas figuras familiares apareceram na frente deles. Eram Sevika, braço direito de Silco e uma velha conhecida de Jinx, ao lado de Scar, o melhor amigo de Ekko e mais recente líder dos Fogolumes.
– Ogra, o que está fazendo aqui? Você conhece essas pessoas, já conhecia os Fogolumes? O que…? – Jinx tagarelava com rapidez ainda um pouco confusa com a aparição repentina de uma pessoa que, embora não gostasse de admitir, considerava da família.
– Ahh, não vou dizer nada enquanto não fechar essa matraca, pivete – resmungou Sevika, silenciando Jinx – Fiquei sabendo que escapou da prisão e que tinha um plano, então, reuni uns fãs seus e os trouxe para cá – revirou os olhos apontando para a multidão atrás dela.
– Eles… eles vieram por mim? Mas como… por que? — Jinx questionou confusa.
– Você é famosa, criança, não foi difícil. Desde que nos desencontramos, fiz alguns aliados, como esse homem morcego aí. Resgatamos ele de Água Mansa aquele dia. Quem diria que sem querer salvamos o líder dos Fogolumes. Desde então, estou sempre aqui na base, eles me acolheram, são gente boa e fazem um bom trabalho por aqui. Queremos as mesmas coisas: lutar por uma Zaun próspera, livre de sofrimento e injustiça. Uma coisa levou a outra e, estamos aqui, com um sonho, um exército e uma líder – Sevika olhou Jinx nos olhos e pôs a mão em seu ombro. Jinx ficou pasma, nunca tinha ouvido nada mais parecido com um elogio do que aquilo vindo dela.
– Sevika, eu… eu… eu não sou essa baboseira de líder, eu… não consigo.
– Para de resmungar! Você é surtada e muito irritante, mas… você também é mais forte do que pensa. Ele taria orgulhoso de você agora, e… a garotinha também. Fiquei sabendo sobre… ela, sinto muito, sabe, aquela rebeldezinha era sua cópia mesmo! — Jinx sabia que ela se referia a Silco e Isha, e aquilo subitamente encheu seu coração de coragem. Sem pensar, ela deu um abraço apertado em Sevika, afundando sua cabeça em seu tronco.
– Obrigada, ranzinza, eu sempre soube que você tinha uma fiozinho de amor por mim debaixo dessa sua carranca amargurada e feiosa. Eu também… senti sua falta.
– Certo, já deu, né! Me solta, peste. Agora vai lá, sobe ali e faça sua mágica! – Sevika disse, se esforçando monstruosamente para não demonstrar o quanto o abraço e aquele “eu te amo” aqueceram sua alma.
– Esquerdinha… você tá chorando? – Jinx caçou incrédula com a cena diante de si. Aquilo realmente estava acontecendo?
– Quê? Não, foi só um cisco idiota.
– Tem certeza, porque eu…
– VAI LOGO, PESTE! – Sevika gritou, apenas para enxugar o “cisco” dos olhos.
– Rs, eu vou, mas não porque você pediu! – E assim saiu saltitante, até a base da grande árvore ao centro da base.
Do outro lado do campo, Ekko também abraçava o amigo, envolvidos demais com a energia de reencontro.
– Ekko, onde você se meteu? Sabe quanto tempo a gente tá atrás de você? Você desapareceu e agora… cara, nem acredito que você tá aqui!
– Eu sei, foi mal, mas eu não consegui, bom… deixa essa história para lá, outra hora eu te conto com calma. Tô tão feliz de te ver, de estar de volta. Você fez um ótimo trabalho por aqui.
– Tive que assumir as rédeas por enquanto, mas o posto continua sendo seu, amigo, sempre vai ser!
– Nossa, e vejo que recrutou novas pessoas, tem um exército delas. Como conseguiu?
– Foi ela, Ekko. Devo minha liberdade àquela moça.
– Quem? Jinx? – perguntou um pouco surpreso com a repentina lealdade do amigo à Jinx, uma pessoa que, também por sua influência, sempre foi inimiga declarada dos Fogulumes.
– Sim, ela libertou todos os nossos de Água Mansa, lutou sozinha contra a fera, ela salvou todo mundo, Ekko. Se não fosse por ela, sabe se lá quando veria minha família de novo! Quando você mandou o sinal dizendo que estava com ela, na hora, soube que teríamos chance.
– Espera. Scar, você por acaso tá me dizendo que todas essas pessoas, incluindo você, que sempre detestou Jinx, estão aqui para lutar com ela?
– Ela pode ter feito muita coisa ruim no passado, mas eu julguei mal, ela é uma heroína agora. Ekko, com a liderança dela e com você de volta, essa batalha já tá no papo. Piltover não sabe o quanto estará em débito com Zaun depois dessa – retrucou, caminhando em direção à multidão que Jinx parecia timidamente reunir.
– Uau, as pessoas realmente admiram ela – Ekko afirmou para si mesmo, indo ao encontro de Jinx, que estava em cima de uma plataforma mais alta, onde todos conseguissem vê-la e ouví-la.
– Oiii, gente… tudo certo por aí? Tudo na boa? Eu sou a Jinx. Acho que, tipo… vocês já sabem disso, né? Não preciso me apresentar, é só olhar os panfletos na rua e já sabem quem sou eu. Hahaha.
Bom, é… vou ser sincera, eu sei lá o que tô fazendo aqui. Tipo, eu só tô tentando sobreviver igual todo mundo. E, se eu tô falando isso é porque… bom, se alguém tem mais de 2 neurônios funcionando, sabe que eu não sou a pessoa que faz discursos bonitos, né? Então, já vou logo avisando: não esperem muita coisa. Mas eu to aqui né, dane-se lá vai…
Primeiro, eu queria só agradecer vocês, eu acho. Vocês podiam tá fazendo qualquer outra coisa, sabe, tipo, sentados num bar, tomando um gole… ou se escondendo em algum buraco… e sinceramente eu não julgaria vocês, nem um pouco. Mas, não. Vocês escolheram tá aqui, com a gente… comigo. Não sei o que isso diz sobre vocês, mas, hein, a escolha foi feita e não dá para voltar atrás!
Acho que o que tô tentando dizer é que eu sei que não é fácil. Desistir pode ser uma ideia bem tentadora. Eu mesma tentei desistir… várias vezes… mas tô aqui, não tô? E… não foi por nada… eu não fiquei aqui por nada. Foi pra fazer essa luta toda valer a pena - ela olha de relance para Ekko e Sevika, meio sem jeito, como se perguntasse se estava indo bem. Eles devolvem um olhar confiante, um incentivo amigo e esperam enquanto ela se volta pro público de novo.
O dia de hoje foi meio doido… mas esse caos todo foi até que bom, porque me fez pensar. As coisas são malucas, sem sentido, imprevisíveis… crueis… mas talvez seja um pouco isso que faz a vida ser boa de vez em quando, mesmo que “boa” seja uma palavra forte. Quer dizer, quem diria que eu estaria aqui agora, bancando a oradora.
Vocês tão aqui agora, e isso significa muito… mais do que qualquer palavra bonitinha. Isso só me prova essas duas coisas: que vocês são lelés da cabeça e que vocês tão prontos. Na verdade eu nem sei direito pra que vocês tão prontos, sei lá contra o que a gente vai lutar. Mas se vocês são loucos o suficiente pra lutar por quem amam, então… são invencíveis!
E olha, vocês, por algum motivo, escolheram acreditar em mim. E por mais que eu seja meio… bem… eu, não vou mentir: eu gostei disso. Eu também acredito em vocês. O mundo pode tá um lixo… mas sempre esteve mesmo e vocês nunca deixaram de lutar - ela abaixa a cabeça, não tendo mais tanto controle na própria fala - Vamo passar por isso, é o que a gente faz. Porque querendo ou não amanhã vai ser outro dia né? - ela olha na direção do Ekko, sem acreditar que falou isso. Ela, que nunca pensou no amanhã com esperança, que há tanto tempo não ousava sonhar, mesmo que só um pouco. Ekko estava calmo. Então ela ficou calma, e depois até meio animada ela continuou - Então, idiotas… é isso. Nossa, deixei um clima no ar né… quem tá com medo? Vai ser legal. Vão escrever sobre isso por gerações! Vamo lá mostrar a esses soldados metidos a besta quem manda de verdade. Bora fazer a festa! E quem não curtir… que se dane.
Ekko então se deparou com a cena mais épica de toda a sua vida. A multidão estava eufórica, berrando gritos de guerra, aplaudindo, cantando hinos em uníssono e se abraçando com os punhos erguidos para o céu, em uma onda de esperança e união que há muito ele não via. Jinx havia conseguido, ela realmente era um símbolo. Ele estava contente por ela, estava orgulhoso. Ele então subiu ao palco e segurou sua mão bem forte, se entreolharam e, então, juntos eles ergueram os punhos. E juntos, rumaram para Piltover, prontos para a batalha do século.
Já no caminho, Ekko parecia relutante em quebrar o silêncio que se instalara entre eles. Graças ao trabalho deles, a invenção estava pronta e funcionava perfeitamente, algo que dava os créditos à Jinx. O voo rumo a Piltover foi silencioso, mas cheio de significados não ditos, e ele sentia o peso das palavras que queria dizer.
– Jinx… antes de irmos e lutarmos pelas nossas vidas, queria te dizer... — Ele falou, mas a voz saiu mais baixa do que ele gostaria.
– Pode dizer, chefinho, desembucha — Jinx respondeu, com um sorriso malicioso, mas também um olhar que demonstrava que ela estava disposta a ouvir.
Ekko deu uma respirada profunda, tentando encontrar coragem, mas as palavras foram sufocadas. Ele começou a se mexer inquieto, coçando a cabeça e tentando organizar seus pensamentos, como se estivesse tentando dar forma ao que estava sentindo.
– Só queria te dizer que… tô muito orgulhoso — falou finalmente, a voz tremendo um pouco — Sei que já disse isso, mas é a pura verdade e eu... eu queria saber se...
Ekko parou, as palavras emboladas, o rosto corado e os braços levantados, tentando esconder o desconforto. Ele estava claramente nervoso. Jinx olhou para ele, uma sobrancelha arqueada, mas com uma expressão compreensiva.
– Ekko, pode falar. Somos amigos de novo, esqueceu? — disse, de forma reconfortante, tentando aliviar a tensão que ele sentia. Ele a olhou rapidamente, ainda corando, e então soltou uma risada nervosa.
– Isso... isso, era isso... sobre sermos amigos outra vez e... só amigos — Ekko deu uma risada forçada e logo suou frio, tentando afastar a ansiedade. Não era o momento certo para esse tipo de conversa, pensou. Ele queria ter coragem para perguntar se Jinx gostaria de ficar na base dos Fogolumes, e quem sabe... jantar juntos depois do caos daquele dia. Como se fosse um encontro. Mas a batalha contra Noxus estava à frente, e ele sabia que não podia se distrair agora. O convite teria que esperar.
Jinx percebeu o nervosismo de Ekko, mas não deixou o momento passar sem dar uma resposta. Ela se aproximou mais dele, e com um sorriso sincero, disse:
– Ekko, somos mais do que amigos, você sabe né? Somos melhores amigos. Dessa vez, é para valer — E então, com um gesto suave, ela deitou a cabeça no ombro dele.
Ekko ficou parado por um momento, sentindo o calor do gesto, o peso da amizade que agora parecia mais sólida do que nunca. Ele olhou para ela, e os dois trocaram um sorriso silencioso, como se aquele simples ato de proximidade fosse mais importante que qualquer palavra. O silêncio entre eles foi confortável. Era como se, por um segundo, tudo parecia certo! Eles estavam ali, juntos. E isso bastava. Como se tivessem todo o tempo do mundo em suas mãos.
Chapter 2: Camélia
Notes:
Agora sim a história ganha uma sequência. Neste capítulo acompanhamos a perspetiva de Ekko diante dos últimos acontecimentos. Além disso, gostaria de lembrar que os links de músicas são totalmente opcionais, esses não alteram a história em nada, apenas dão um toque mais profundo. É isso, boa leitura e espero que gostem! ;)
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Chapter Text
“NÃO!” , alguém gritava ao fundo. “Não, não, não pode ser!” , continuava a voz, ainda distante. Era rouca, estridente, e densa. “AHHH”, berrou com uma força impressionante, ressoando em eco pelo lugar. Os grunhidos não paravam, se repetiam um atrás do outro, rasgando a atmosfera quase apocalíptica do lugar. Seus urros eram graves, longos, carregados de dor. Tinham notas de tristeza, ira, culpa, negação em cada som emitido. Eram lamentos… lamentos vindos de uma mulher, lamentos de quebrar o coração.
Ekko os escutava, como apitos em sua cabeça, ainda confuso e atordoado. Tentou abrir os olhos, voltar aos seus sentidos. Tudo parecia escuro, áspero… onde diabos eu estou? Suas mãos trêmulas tocam o chão frio, estava deitado sobre escombros do que pareciam blocos de concreto ou sabe-se lá o quê. Com um esforço quase monumental, tentava mover seu corpo dolorido. Concentrava-se, aos poucos, a ficar lúcido outra vez, a se lembrar do que aconteceu… como tinha acabado ali? Como um instinto, tateou suas costas, procurando por seu Z-drive, e sentiu rachaduras. “Droga, isso não é nada bom”. Ainda com dificuldade, se levantou, resmungando pela dor que parecia emanar de cada músculo de seu corpo. Bateu a poeira em suas roupas, sujas de poeira e farpas. “NÃO!” , a voz guinchada tornou-se audível de novo. “Jinx…?” , pensou. Estava zonzo, mas não pôde deixar de sentir o pico de adrenalina ao escutá-la. Em segundos, a dor que sentia foi substituída por outro sentimento: preocupação. “JINX! , pensou, disparando em direção a origem do som. Quanto mais perto, mais altos eram os gritos, maior a ansiedade em seu peito. Correu, descendo pilhas de destroços, cambaleando sobre pedras e pedaços de metal, que só dificultavam seus movimentos. Deslizando sobre os restos da antiga torre de Piltover, Ekko enfim avistou a dona da voz, próxima à margem instável da fortificação. Essa figura, no entanto, não era Jinx. Diminuindo o passo, aproximou-se da mulher de cabelos curtos cor-de-rosa, era Vi. Ela estava ajoelhada, estatelada no chão, soluçando aos prantos. Seu rosto inchado, olhos vermelhos… ele nunca a tinha visto chorar em toda a sua vida. “Não, isso definitivamente, não era nada bom” . Com a voz ofegante e o olhar tenso, perguntou de uma vez:
– Vi… o que.. aconteceu aqui? Cadê a Jinx? - Ekko hesitou a cada pergunta, sua mente desesperada por respostas que não sabia se queria ouvir – Vi… cadê a Jinx? – olhos marejados pelo suspense.
Vi não se manifestou, afogada demais em sua tristeza.
– Vi! CADÊ A JINX? – berrou impulsivamente, olhos petrificados, fixos em Vi. – VI, por favor, eu preciso saber! CADÊ A JINX? – suplicou.
Vi o escarou com o canto do olho, simplesmente não tinha energia restante para manter contato visual.
– Ela… se… foi! – revelou com pesar, lágrimas escorriam sem cessar por suas bochechas – Minha irmãzinha… ela… – tentou prosseguir, mas o peso daquelas palavras eram maiores do que ela poderia suportar.
Ekko paralisou. Aquelas palavras latejavam em sua mente. “Não, não poderia ser verdade… Jinx… sua Jinx, se foi? Não, não podia ser”. Seu coração acelerou, e uma feição de puro pânico tomou conta de si.
– Não… não, não, não, não! Não minta para mim, Vi! Cadê a Jinx? – as palavras saltavam sozinhas de sua boca, e sem que notasse, suas mãos trêmulas suavam frio.
– Essa é a verdade, Ekko! Jinx se foi! Ela… ela se sacrificou, para me salvar – seu tom se elevando – Ela morreu, Ekko, salvando a imbecil idiota inútil da irmã dela! – começou a se debater, castigando a si mesma com uma raiva voraz – Era eu… quem deveria protegê-la! Eu que devia estar morta, não ela! – voltou a sussurrar.
Ekko estava pálido, olhos arregalados inundados de lágrimas que escorriam de suas bochechas e molhavam suas roupas. Aquilo era um pesadelo. Se beliscava, querendo acordar, querendo fugir daquela verdade, terrível demais para acreditar. Sentindo-se derrotado, o peso em seus joelhos cedeu. Memórias dela o atormentavam.
<< Ekko, você nunca vai me perder, tá bom? Eu prometo.>>
– Você… me prometeu! – jogando uma pedra pelo abismo com todo o ódio que havia em si – Jinx… você me prometeu, caramba! Me deu sua palavra que eu não te perderia – lamentou baixinho dessa vez.
Voltando seus olhos para Vi, arrastou-se para perto da amiga inconsolável, e a envolveu em seus braços, como se isso fosse capaz de dividir a carga do luto. Vi retribuiu seu gesto, e o agarrou com força, temendo que Ekko pudesse sumir também.
– Eu sinto muito, Ekko! Sinto muito! Eu estraguei tudo! Fui fraca e isso me custou o restou da minha família. Por minha causa, perdi meu pai, por minha causa perdi… perdi ela! – Vi resmungava no ouvido de Ekko, sua cabeça encostada nela.
– Vi… não fala assim, não importa o que aconteceu, não foi sua culpa! Eles não gostariam que se sentisse assim… nenhum deles – consolou ele, ainda um pouco aéreo, sem entender totalmente a que “pai” Vi se referia, porém não se atreveu a questionar, aquele não era o momento.
– Aquela idiota… quem ela pensa que é, hein? Ela não podia ter feito isso, não podia e ela fez mesmo assim. Teimosa, ela tinha que bancar maldita heroína? – Vi deu voz aos seus pensamentos, com um toque angustiante que escondia certa admiração. Ouvir aquilo foi como a gota d'água para ele, e voltou a chorar ao se lembrar da imagem triunfante e brincalhona daquela menina… daquela mulher que nunca mais veria.
E lá ficaram. Onde nada mais se ouvia além de seus gemidos chorosos. Onde nada mais se via a não ser o vislumbre dos dois enlutados, debruçados ao chão, um sem soltar o outro. Onde nada mais se sentia a não ser a excruciante dor da saudade.
No dia seguinte, Ekko acordou na mansão de Caitlyn, um lugar tão grandioso que parecia errado denominar uma única casa. Aquilo estava mais para um castelo, na verdade, e um dos grandes! Afinal, aquela era uma propriedade de Piltover, e como se não bastasse, era a de uma das famílias mais influentes do Lado Alto: a família Kiramann.
Ekko abriu os olhos, esforçando-se para recapitular os últimos acontecimentos em sua mente. Talvez, tudo poderia ter sido fruto de um pesadelo horrível! Tocou a cama, era macia e cheirava a lavanda, com a ponta dos dedos sentiu o toque suave dos lençois de seda, olhou para lado e avistou da janela prédios brancos e altos, em meio a artefatos tecnológicos, como planadores e zepelins. É, estava em Piltover. Talvez ainda estivesse sonhando, e puxa, que pesadelo!
Ele se levantou e encarou o espelho, bolsas fundos abaixo dos olhos provaram que não tinha sido uma noite fácil. Ao seu lado uma pilha de roupas novas lindamente empilhadas com perfume nauseante de água de rosas. Roupas chiques, perfume fresco, tudo naquele quarto gritava privilégio. Ekko podia estar ainda meio atordoado, mas tinha plena consciência de que vestir aqueles trapos chiques de mauricinho seria a última coisa que faria. Na verdade, nada naquele lugar o fazia querer ficar, não havia absolutamente nada que precisasse naquela fortaleza adornada de mármore. Até porque como um lembrete mórbido lhe tomou o pensamento: não haveria lugar no mundo que quisesse estar sem Jinx e ela… não estaria em lugar nenhum. Não depois do dia de ontem. Não enquanto estivesse naquele pesadelo interminável, mas não podia, ainda não. Não sem antes conversar com Vi. Ele sabia que se ele estava lá, Vi definitivamente estaria, e por Janna, precisavam conversar. Algo dentro dele não acreditava na morte de Jinx, ele só… precisaria de mais evidências. Quase não pregou o olho pensando nessa possibilidade, e ele não descansaria até ter absoluta certeza, nem que para isso tivesse que aturar o cheiro esnobe de rosas e lavandas.
Assim que se aprontou, foi à procura da amiga, não sabia quanto tempo demoraria para achar ela naquele labirinto de corredores de troços chiques, valiosos e completamente inúteis. Não pôde deixar de pensar em quantos suprimentos valiosos poderiam ser arrecadados para os necessitados de Zaun com o dinheiro de cada estátua ou pintura. No caminho, ao fim de um dos corredores, deparou-se com um quadro enorme, pendurado na parede. Nele, um retrato da família Kiramann, o General Tobias, a Conselheira Cassandra e a jovem Cait, atualmente conhecida como Comandante Caitlyn. No instante em que pôs os olhos no rosto da jovem, devaneios do dia anterior surgiram e tomaram seus pensamentos. Ambessa e o exército noxiano haviam sido derrotados, por civis de Zaun e pelas tropas de Piltover, junto haviam salvo a todos da tal Gloriosa Evolução que ameaçou tomar conta da mente das pessoas com o poder da Hextech. Eles conseguiram. Ele conseguiu, afinal, o mundo estava salvo outra vez. Quem dera a história acabasse assim, mas não, estava bom demais para ser verdade. Ao fim da batalha, Jinx havia se sacrificado para salvar Vi, e… se foi. Lembrou-se vividamente daquele turbilhão de emoções que ainda não tinha superado, se é que iria superar algum dia. Depois de horas sozinhos naquele lugar, Caitlyn e seus aliados apareceram e os trouxeram para lá. Ele não se lembrava muito mais que isso, Era provável que só fosse sua mente tentando bloquear os traumas do dia anterior.
– Ah, hora de encarar os fatos, Ekko, o pesadelo é real – suspirou cabisbaixo.
– Bom dia, senhor… Ekko, não é? Se lembra de mim, certo? Cait.. – disse Cait, que apareceu de súbito atrás dele, com o tapa olho ligeiramente intimidador.
– Sei bem quem você é – retrucou agressivo.
– Oh é… – constrangida, tentou puxar assunto – Vejo que ainda está com as roupas sujas de ontem. Você não deve ter visto, mas deixei uma pilha de roupas limpas. Fique à vontade para experimentá-las, tenho certeza de que ficarão ótimas! – esboçou um sorriso, que claramente não foi retribuído por ele.
Ekko não gostava de Cait, não fazia nem questão de disfarçar. Na verdade, não gostava de ninguém do Lado Alto, mas agora, pelo menos, tinha motivos reais para odiá-la, desde que soube de sua fama como a comandante genocida que arregaçou Zaun até o último canto atrás de Jinx. Como se não fosse o bastante envenenar sua cidade com gás tóxico, Ekko soube por outros Fogolumes que Cait convenceu Vi a ajudá-la nisso, como Defensora. Era difícil perdoar alguns dos crimes de Jinx, alguns feitos contra Cait, mas sinceramente, ele estava começando a entender o ódio de Jinx por ela.
– Olha, eu agradeço a sua ajuda e tal, mas se ainda estou aqui é porque estou atrás de Vi. É com ela que quero falar. Assim que conversarmos, vou pegar as minhas coisas e dar o fora daqui, entendeu? Não precisa mais fingir que se preocupa comigo, comandante – havia rancor em sua postura e no tom de sua voz.
– Com todo o respeito – Cait respondeu ríspida – Eu não acho que seja uma boa ideia. Vi ainda está muito abalada e ferida de ontem. Ela está descansando agora. Terá que falar com ela depois.
– Acho que você não está entendendo, Cait – desdenhou seu nome – Preciso falar com a Vi, agora. É urgente e… particular – ameaçou.
– Ekko, acho que não fui clara o suficiente. Vi está de repouso agora. A última coisa de que ela precisa é de um interrogatório. Portanto, ou você espera por ela ou terá que se contentar a perguntar para mim.
– Até parece que quero respostas de uma criminosa de guerra como você! Eu nem sei porque estou gastando meu tempo aqui nessa cidade nojenta, na verdade - gritou agressivo.
– Criminosa? Com licença, posso ter cometido erros como qualquer outro, eu reconheço, mas não ouse me chamar de criminosa! Estaria me desonrando e desonrando a memória de minha mãe me comparando a uma criminosa como… – hesitou por tempo, respirando fundo para não dizer algo que Vi a repreenderia depois.
– Diga… vá em frente, diga o nome dela! - provocou Ekko – Jinx pode ter cometido crimes sim, mas nem isso faz dela metade da vilã que pensa que ela é… ou era. Se não fosse por ela… – sentiu seus olhos lacrimejarem – Vi não estaria aqui, e provavelmente você também não. Sem ela, Zaun não teria entrado em cena e carregado essa luta nas costas como sempre faz por vocês Piltes desgraçados!
Cait pareceu atingida pela fala de Ekko, mas com certeza não o bastante para amenizar o ódio crescente naquela sala. A tensão entre eles era tanta que quase se viam faíscas entre seus olhos. De repente, Vi apareceu, tão exausta quanto Ekko.
– O que diabos tá acontecendo aqui, hein? – olhou impaciente para Cait, seus olhos fundos e estreitos, ainda inchados de quem cujas lágrimas não permitiram lhe pregar os olhos. Cabisbaixa e com os cabelos rosas despenteados tapando-lhe a face, encarou com esforço Cait, que por sua vez lhe dirigiu aquela mesma familiar feição de surpresa e preocupação, a única esboçada por ela desde a tragédia do dia anterior. A garota de cabelos azuis, no entanto, não se absteve em aproximar-se e logo, a agarrou pela cintura como uma espécie de muleta humana. Era difícil para Cait vê-la naquele estado. Ela que sempre fora tão forte, tão otimista, perdera sua chama completamente. Vi estava mais frágil do que nunca e a policial, por mais prazerosa que fosse a sensação de livrar o mundo das garras maníacas de Jinx – e por mais que não admitisse - a traria de volta dos mortos somente para ver a companheira sorrir outra vez!
– Vi, o que está fazendo aqui? Deveria estar na cama, de repouso, lembra? - alegou surpresa com semblante preocupado.
– Relaxa, cupcake. Tô vegetando naquela cama desde ontem, tá tudo bem, tá legal? – sua voz abafada quase não se ouvia. De repente, desviou o olhar para o garoto à sua frente, aquele mesmo garotinho que sempre seria como seu irmãozinho – Ekko, o que faz aqui? – disse Vi, enfim agarrando-se aos braços firmes e graciosos da namorada.
– Vi, eu sei que talvez esse não seja o momento, mas eu passei a noite em claro tentando entender o que… o que aconteceu e… não consigo entender. Vi, só preciso saber o que aconteceu… o que realmente aconteceu ontem! – sua voz falhou com pesar e por um instante Ekko sentiu os olhos umedecerem.
– Ekko, eu sinto muito mesmo, mas não quero falar sobre nada disso agora, tá? Sinto muito, hoje não – Vi franziu o cenho escondendo em vão o inescondível: sua tristeza.
– Vi, por favor! Eu preciso entender o que aconteceu. Eu mereço saber a verdade, não acha? Depois de tudo… – Ekko insistiu.
– Ekko, não escutou ela? Não percebe seu estado? Respeite a vontade dela e por fazer se retire antes que eu mesma o faça – Cait assumiu sua postura rígida e séria de comandante outra vez. Sempre ficava assim quando se tratava de Vi.
– Cala a boca, princesa progresso, não tô falando com você! – Ekko se aproximou ofendido, mas antes que Cait pudesse retrucar, ambos foram interrompidos por Vi.
– Quietos, pelo amor de Janna! Os dois! – gritou em alto e bom som – Cait, está tudo bem, ele tem razão, ele merece saber o que aconteceu. Meu luto pode esperar.
– Vi, tem certeza de que quer fazer isso? Não acha que está muito recente ainda? Eu.. – Cait foi interrompida com o sutil toque dos dedos calorosos de Vi em sua bochecha. Um gesto reconfortante seguido por uma troca de olhares que dispensava qualquer palavra.
– Vamos chefinho, vamos acabar logo com isso – Vi balançou a cabeça em direção ao quarto convidando o garoto a entrar.
Vi o conduziu até seu quarto e fechou a porta. Ekko olhou o ambiente ao redor, estava uma bagunça. Reparou que havia peças do uniforme de Cait sobre a cama, e com desgosto, leu as entrelinhas.
– Vi, eu… precisava perguntar. Como… – hesitou – Como ela fez isso? O que exatamente te faz pensar que Jinx… você sabe – evitaria ao máximo dizer aquele verbo em voz alta.
– Ekko, eu já te disse, por favor, não me faça reviver isso! Ela se foi me salvando de Vander!
– O quê? – Ekko sobressaltou ao ouvir esse nome, o nome de alguém querido que se foi há muito tempo – Vi, eu não estou entendendo!
– Ah, droga! Onde você estava quando tudo… ah deixa para lá. – Vi disse séria – Senta aí que aí vem história.
Então Vi contou tudo. Desde o momento em que ganhou o distintivo de Cait, até a briga que tiveram na mina, como Jinx tinha encontrado Vander, vivo, mas totalmente desfigurado. Contou da tentativa de curá-lo no acampamento do Arauto, e de como as coisas acabaram mal, até a hora em que perdeu total controle sobre suas lembranças. Ekko escutou tudo com absoluta atenção, lutando para absorver cada detalhe, por mais surpreendente que fosse.
– Ele estava fora de si. Você devia estar desacordado com a batida, mas… naquele momento, ele ia me ferir, me… matar. Jinx mandou eu me afastar, mas eu… – lágrimas escorreram de seus olhos outra vez – Eu não quis ouvir, fui uma idiota teimosa, então antes que ele pudesse me agarrar ela se debruçou sobre ele com uma velocidade impressionante! – Ekko sorriu ao se lembrar dessa habilidade na pequena guerra de tinta que tiveram – Ela ia cair, mas eu a segurei – pausou – Mas eu não fui a única, porque aquele monstro – soltou áspera, sabendo que no fundo seu pai gentil e protetor já não estava mais naquele corpo animalesco, só sobrara a fera endiabrada, a verdadeira culpada de tudo isso – a agarrou pela cintura e aí… ela só… se foi – Vi andou em direção à janela, com olhar baixo e braços cruzados, tentando manter alguma compostura. Ekko só desviou o olhar pesaroso.
– Vi, posso te fazer mais uma pergunta? Quer dizer… além dessa – perguntou receoso, mas não obteve resposta, apenas um suspiro que interpretou como “sim” – Havia mais alguém com Jinx, uma criança talvez?
A pergunta de Ekko pareceu ter afetado Vi, que o olhou com um olhar surpreso de quem não esperava ouvir aquilo de alguém como ele.
– Isha? – Vi levantou o olhar em direção ao garoto claramente surpresa com a aleatoriedade da pergunta – Bom… sim, mas porquê que quer saber? O que que tem ela?
– Nada demais, só ouvi algo a respeito e bom… Jinx não quis entrar em detalhes, então achei que talvez você soubesse alguma coisa – respondeu inquieto.
– Eu não sei muito, na verdade, passamos pouco tempo juntas. Mas… dava para ver que era uma garotinha muito especial. Não sei como se conheceram, mas não se desgrudavam. Era bizarro como elas se protegiam, como eram parecidas, eram como carne e unha, acho que… Isha era quase como Powder era para mim. Hum, ela me lembrava a Powder – seu rosto esboçou uma alegria repentina despertada com a lembrança – Sei lá, fazia muito tempo que não via Jinx daquele jeito.
– De que jeito? – questionou escutando atentamente cada palavra.
– Não sei, quando ela estava perto da garota ela mudava, parecia mais calma, mais lúcida. Parecia até… feliz. A forma como ela cuidava daquela menina… pareciam irmãs ou… mãe e filha. Mas não importa mais, Isha não está mais aqui. Por Janna, isso deve ter arrasado ela. Quem sabe… se pelo menos agora elas possam estar juntas de novo – lágrimas escorriam involuntariamente de seus olhos vermelhos.
Ekko arqueou as sobrancelhas. Isso era possível? Jinx com uma criança era uma visão difícil de imaginar, no entanto se lembrou do estado como a encontrou no esconderijo. Aquela figura pálida, cinza, estática e suicida ressoou em sua mente outra vez, como uma assombração. Ele sabia que Isha era alguém importante para ela, só não imaginava o quanto. Ele pode ter chegado a tempo de salvar Jinx, mas não podia dizer o mesmo para a garotinha. Não pôde deixar de sentir fisgadas de culpa em seu coração por isso.
– Vi… eu agradeço por ter me contado, eu não fazia ideia. Mas… Vi – Ekko se segurou, temendo sua reação – e se ela tiver sobrevivido?
– Isha? Esqueça chefinho, vi a explosão com os meus próprios olhos. Não tem como ela ter sobrevivido.
– Não Isha… Jinx. Quer dizer, não encontraram nenhum corpo, com certeza ela deve ter deixado alguma pista, algum vestígio que seja, um sinal de que ela está viva!
– Ekko, só para tá? Não sei onde quer chegar, mas é melhor parar por aí.
– Vi, eu só acho… estranho. Não quero ser impertinente, mas Cait odeia Jinx, você não acha que talvez…
– O quê? Acha que Cait mentiu para mim sobre as buscas. Ekko, você acha mesmo que ela mentiria para mim sobre uma coisa dessas? – suas veias sobressaltam-se a cada palavra – Você é inacreditável mesmo.
– Vi, não foi isso que quis dizer, é só que…
– Você acha mesmo que já não checamos? As patrulhas de Piltover já revistaram aquele buraco de cabo a rabo, mais de uma vez. Só encontraram restos de explosivos… dela. O único corpo encontrado era da besta, que mal respirava. E como estava? Todo ensanguentado, com queimaduras em todo corpo. Se um brutamontes como ele ficou naquele estado, imagina… não, eu não quero nem pensar. Não tem corpo, Ekko, porque não sobrou nada, ela virou pó, simples assim! – Vi extravasou toda a raiva contida nela. Quando finalmente se acalmou olhou para um Ekko apático – Eu sei que é difícil aceitar, eu também estou tentando, juro! Mas é hora de encarar a realidade, garoto, por mais dura que ela seja!
– Não, Vi, desculpa, mas você está errada! – lágrimas escorriam sem pestanejar – Talvez você já tenha aceitado mesmo, talvez seja só manipulação daquela ditadora da sua namorada…
– Ekko! Não fala assim da…
– Mas ela não morreu, Vi, ela NÃO MORREU! Ela deve estar em algum canto, ferida, talvez, mas viva, eu sei! Ela é a Jinx, afinal…
– EKKO, já deu! – berrou dando um tapa na cara dele Ekko a fitou surpreso. Ela tinha batido nele? Ele só tinha dito a verdade, ele sabia que estava certo, ou pelo menos era isso que queria pensar. Não importava mais, o que quer que tenha acontecido, ele teria que descobrir sozinho, ficou bem claro que Vi não o ajudaria, e muito menos Cait, como se ele quisesse ajuda dela.
– Se a ama tanto assim, faça como eu e deixe que ela descanse em paz. É o mínimo que ela merece depois de tudo, não acha?
– Quer saber, você pode até estar certa, ela pode ter… você sabe – simplesmente não conseguia dizer “morreu” em voz alta – mas existe uma chance dela estar viva, por aí, em algum lugar. Eu prometi que nunca desistiria dela outra vez e vou manter minha promessa até o fim dos meus dias. Enquanto existir essa chance, eu não vou desistir de procurá-la, com ou sem a sua ajuda! Marque minhas palavras, eu vou trazê-la de volta para casa. Adeus Vi!
Vi não disse mais nada, deixou que ele fosse, ele estava por conta própria agora. Ele já era bem grandinho, ficaria bem. Talvez seria mais fácil assim. Ver a imagem de Ekko era ver sua Powder de anos atrás, e por Janna, como doía. Suas mãos trêmulas, ainda sujas de sangue seco do dia anterior, a fizeram lembrar do dia em que tudo desmoronou. Quando perdeu sua família, quando perdeu sua liberdade, quando perdeu… sua irmãzinha. Com um grito sufocado e olhos reluzentes de lágrimas, desabou no chão e chorar, com toda sua culpa, tristeza e saudade, e a salgada sensação de ter cometido o mesmo erro outra vez e perdido um amigo. E chorou inconsolável aos braços da comandante, a única pessoa que parecia lhe restar na vida.
Ekko, por sua vez, desatinou a sair do quarto determinado, pegou suas coisas o mais rápido que pôde, esfregando os rastros molhados de suas bochechas. Estava de partida, não aguentaria passar nem mais um segundo naquele casarão. Seu rosto estremeceu ao devanear sobre os momentos do dia anterior. Sentia falta de seu toque, de seu jeito de fazê-lo rir… “Aguente firme, Jinx, eu estou indo!” . Saiu voando em seu hoverboard, luzes verdes cintilando em seu rastro. Ele sabia muito bem o que precisava fazer.
Ekko chegou onde queria. Estava no galpão onde o esconderijo de Jinx, transformado em uma base aérea havia colidido. Aquele lugar estava revirado, provavelmente pelas recentes buscas dos soldados na área, aquelas que Vi havia dito. Mesmo assim, cada pilha de escombros parecia igual para ele, sensações quase familiares emanavam a aura daquele caos. Com o coração batendo acelerado, caminhava sobre a pedraria irregular e estilhaçada no chão. Cada passo que dava parecia mais pesado que o anterior, como se o ar ao redor estivesse denso, carregado de eletricidade estática e recordações dolorosas. O ambiente era escuro e sufocante, iluminado apenas pelo horizonte em tons vivos avistados ao longe davam um toque quase surreal à atmosfera.
Observou o espaço. Grande parte do que costumava ser o lar de Jinx por sete anos, estava destruído ou soterrado em destroços. Pedaços de metal e madeira marcados com símbolos que ele não precisava traduzir – cicatrizes de uma vida vivida na linha tênue entre a criação e a destruição. O cheiro de pólvora ainda pairava no ar, misturado com o leve toque de algum gás químico que ele reconhecia das engenhocas improvisadas de Jinx. Tudo lá era uma partezinha dela, e para ele era difícil não pensar nela, quando tudo gritava seu nome! Ekko respirou fundo, sabia que teria que ser forte, afinal, tinha ido até com um objetivo: buscar pistas sobre seu paradeiro, e era isso que faria. Revirou entulhos, remexeu sucatas e revolveu escombros por minutos, horas…
Fez isso, um dia, dois, três… e quando se deu conta semanas já tinham se passado. Há dias, seguia religiosamente a mesma rotina: saía cedo da base e ficava vasculhando até o fim da noite. Apesar da insistência incessante de Scar para que o garoto não fizesse patrulhas por um tempo, pelo menos até processar a perda dos últimos dias, Ekko não só as fazia como insistia em não fazer outra coisa. Pulava de madrugada a madrugada, emendava noites rodeando perímetros de Zaun a Piltover, sem descanso, sem trégua. Scar e outros Fogolumes o repreendiam por isso, mas Ekko não dava ouvidos, alegando que as patrulhas mantinham sua cabeça deprimida ocupada. Papo furado, eles sabiam. Ekko escutava tanto aquilo que em parte começou a acreditar nisso, mas no fundo, era só uma conveniência para procurar qualquer vestígio da suposta falecida garota de cabelos azuis. A grande verdade é que ninguém realmente sabia o que se passava dentro do patrulheiro teimoso. Nem mesmo ele sabia. Seus sentimentos não eram claros, seus pensamentos confusos, seus propósitos, obstinados. Não havia certeza de nada, somente do fato de que não descansaria até ter as respostas de que ansiava. Ao menos era essa a ilusão que enfiou na cabeça, a mesma falsa esperança que o tirava o sono, a cada cartaz de “procurada” esquecidos nos murais, até seus grafites, em cada zaunita de cabelo tingido. Ela estava em todos os lugares, menos onde deveria estar: ao seu lado, em carne e osso.
Todos os dias de busca deram no mesmo. Nada. Naquele dia, não estava sendo diferente. O Sol já havia se posto, o céu estava escuro, de longe só se enxergava a silhueta dos gloriosos edifícios do Lado Alto e suas janelas. Ekko, pegou uma lamparina quebrada que encontrou e com o atrito de duas pedras fez fogo. Sentou em um pedaço de madeira, as mãos sobre os joelhos. “Que busca inútil, talvez Vi tenha razão, não sobrou nada”. Seu semblante era de decepção, estava frustrado. Num ato impulsivo, Ekko levantou-se agressivo e com uma vareta batia forte no que sobrou do balão. Berrando com fulgor, extravasava todo ódio que sentia. Quando parou, sentindo suas pernas trêmulas, cedeu ao chão e lá, em meio ao pó levantado, ficou.
– AHHHHHHHHHHHHHH!! – gritou enquanto socava restos de madeira à sua frente, os nós de seus dedos sagraram com as farpas que o perfuravam, mas não se afligiu pela dor – De que adianta salvar o mundo, e terminar assim, sem nada – confessou em um sussurro inaudível.
Suas lágrimas caiam sobre o concreto, e quando abriu os olhos, percebeu algo: era uma ponta branca como uma folha. O que é isso? Cauteloso retirou as estruturas que prensaram o papel, amassado, rasgado. Curioso, desdobrou-a, com cuidado. Suas mãos sujas com o carvão que cobria sua superfície, e com sopro suave, afastou as impurezas que escondiam a arte.
– Parece um… desenho – os traços eram infantis, coloridos, caóticos.
Na sulfite, havia duas figuras desenhadas de mãos dadas. A da direita, era mais alta, uma mulher de calças listradas, olhos rosados e duas longas tranças azuis que desciam até os pés, ela segurava uma bandeira azul. Já a figura da esquerda era mais baixa, tinha uma roupa semelhante, duas tranças pequenas e azuladas saiam de um capacete.
– Jinx, e essa deve ser… Isha – Ekko não pregou os olhos, então, aquela era Isha, a garotinha que conquistou o coração indomável de Jinx, um feito inédito até então – Ela é tão pequena e não é que se parecem mesmo – riu ao perceber a semelhança.
Com curiosidade, virou o verso, percebeu que lá havia algo escrito. Com certa dificuldade, tentou ler a letrinha da menina.
– Uma dedicatória… “De Isha para Mama, minha heroína” – aquilo o abalou mais do que previra. – Jinx e “Mama”, por Janna, o que foi que eu perdi? – De repente, pensou em como teria sido divertido ele ter conhecido Isha, eles com certeza se divertiram muito juntos. Aquele desenho deve ter sido um presente de Isha para Jinx, que se não fosse por ele teria sido esquecido ali – Não se preocupe Isha, você não será esquecida. Faço questão de entregar pessoalmente para sua Mama, eu prometo.
https://youtu.be/9IjOrFoh9kc?si=-U5cfN4X0xWOAQ6M
Mais alguns dias haviam se passado e nada mudou muito por Zaun, em realidade parecia tudo muito agradável na base, todos seguiam com suas vidas normalmente, aliviados, e felizes por se livrar do peso de um problema a menos nas costas: o de uma guerra iminente. Desde aquele fatídico dia, o mundo parecia ter fluído seu curso natural, seguido em frente como deveria ser, como sempre foi. Zaun tinha seguido em frente, menos… ele. Seus dias se sucederam monótonos desde então, um estado de transe, de negação profunda. Jinx e ideias ilusórias do que poderia ter sido atormentavam sua mente e alimentavam seus devaneios. Pareciam ter piorado desde a conversa com Vi, e com o memorial às vítimas da batalha se aproximando, a situação não melhoraria nem um pouco. Ekko acordava, e passava o dia enfurnado no trabalho, como se isso fosse ajudar a dissipar as paranoicas de sua mente, paranoias essas que em parte desejava que fosse verdade, parte essa que ainda o fazia sair à noite às escondidas procurar rastros no galpão, na esperança branda de encontrar algo sobre o paradeiro da “falecida”.
Foi depois de uma de suas escapadas noturnas que voltou para os seus na base dos Fogulumes, sua casa. Aquela comunidade, a qual ele era o líder, lhe trazia uma sensação tão reconfortante que consolava um pouco seu coração atordoado. Sentira muita falta daquela sensação, das pessoas, dos seus amigos, de tudo desde seu sumiço interdimensional. Apesar de tudo, voltar para lá todos os dias, mesmo depois de buscas em vão, era um alívio reconfortante.
Já estava bem tarde quando chegou, e boa parte das pessoas já tinham ido dormir, só se escutavam os sons vigilantes das corujas e dos grilos. Com todo cuidado de não acordar ninguém, entrou na imensa bagunça que se tornara seu quarto. Antes tão organizado e limpo, o ambiente parecia imitar seu espírito cansado e negligente. Estava se preparando para deitar, quando escutou uma batida na porta. Um pouco surpreso, abriu a porta. Era Scar.
– Desculpa se te acordei, chefinho. Vi a luz estava acesa e resolvi entrar – introduziu Scar.
– Relaxa amigo, tava mesmo acordado. Além disso, é sempre bom ver você. Entra – recuando um passo para que Scar entrasse. – Então, o que devo a honra da sua visita? Algum problema? Alguém ferido? Al… – disse em tom de preocupação até ser interrompido.
– Não, não, está tudo bem! Por Janna, você se preocupa demais sem necessidade às vezes, sabia? Eu só vim para ver como você tá. Sabe, já faz um tempo desde que… você sabe e… bom, amanhã será o memorial.
– Desembucha, Scar!
– Eh só que Ekko, é totalmente compreensível que esteja se sentindo assim e acho que temo que o memorial mexa ainda mais com você, sabe? Você já teve várias recaídas esse mês, e bom, você mal dorme Ekko! Na verdade, você não faz outra coisa que trabalhar ou chorar pelos cantos…
– Quê? Claro que não, eu tô ótimo! Nunca estive melhor na verdade, vencemos a batalha contra Noxus, Piltover está se colocando em seu lugar uma vez na história, salvamos todos. Eba! – Ekko forçou um sorriso de felicidade que não enganaria nem uma mosca, era óbvio que não estava tudo bem, todos sabiam. Quem ele queria enganar?
– Só estou tentando dizer que eu sei como perder alguém importante para nós é horrível e que leva tempo para a ferida cicatrizar, mas para isso você primeiro precisa aceitar o que aconteceu, não acha?
– Aceitar?
– Ekko, você age como se nada tivesse acontecido. Aceita que não tá bem! Sei que disse isso centenas de vezes já, mas talvez não seja má ideia tirar uns dias para você, sabe? Sem patrulhas, sem reuniões…
– O quê? Scar, quantas vezes preciso repetir que estou bem? Não importa o que eu esteja sentindo, não vou deixar de cumprir com meus deveres só porque…
– Ekko, pela primeira vez na vida pense em você, tá legal? Deixa que eu cuido das coisas por aqui, eu cuidei esse tempo todo enquanto esteve fora sei lá onde, não foi? Você é o meu melhor amigo e eu preciso que seja sincero comigo. Zaun perdeu muito mais que soldados naquela batalha, perdemos o nosso maior símbolo de resistência em anos. Jinx era esse símbolo. Isso devastou todos, sem dúvida. Zaun precisava dela, ainda precisa, mas não podemos mudar o curso das coisas. Ela se foi, e você não parece estar aceitando muito bem.
– Não preciso de folga nenhuma, beleza? Estou bem, amigo, as patrulhas me ajudam a distrair e me deixam em forma, o que é justamente o que preciso! Scar só não se preocupe comigo, ok? Deixo que cuido das coisas sozinho – desviou o olhar.
– Sozinho? Ekko, da última vez que disse isso você sumiu por meses. Achamos ter te perdido para sempre. Não queremos que faça nenhuma loucura outra vez. Zaun precisa de você agora mais do nunca. Já perdemos o bastante, não acha?
– ELA NÃO SE FOI, DROGA, SCAR! – explodiu em raiva, extravasando as palavras entaladas em sua garganta há dias - Pare de dizer isso. Já é difícil o suficiente ter que fingir isso para todos, todos os dias a cada zaunita que diz “eu sinto muito”, “meus pêsames”, “o que será de nós sem ela?”. Eu não preciso da sua pena também, tá bom? – disse com veias exaltadas pulando de suas têmporas.
– Não é pena, Ekko, é preocupação. É difícil acreditar, eu sei, mas é o que aconteceu e nem eu, nem você e nem ninguém pode mudar isso! Você está se iludindo, ou você acha que ela ainda está naquele galpão que visita todo santo dia?!
– Ah era só o que me faltava, agora deu de me espionar? Olha, eu sei o que estou fazendo, tá? Eu só preciso que confie em mim. Eu sei que posso estar me iludindo, eu sei, mas é um risco que eu escolhi assumir, porque ainda há uma chance dela ter sobrevivido e eu vou lutar até o fim para ter certeza disso.
– Ekko… meu amigo, eu não posso deixar você…
– Por favor, Scar, por favor! Eu sei que parece loucura, mas eu só não posso aceitar algo que não acredito! Não acredito na memória de Jinx, não acredito na memória de Isha! Eu só… preciso de tempo.
– Ekko…
– Por favor, Scar, posso estar enlouquecendo, mas vou enlouquecer mais rápido se ficar aqui sem fazer nada sabendo que… – suspirou, a dificuldade de proferir tais palavras – Se me deixar em paz, prometo que ficarei bem, está bem? Pode parecer que eu não sei o que estou fazendo, mas minha intuição diz que estou certo. Scar… eu a amo. Se sua esposa ou seu filho pudessem estar vivos, mesmo que tudo aponte para o contrário, você seguiria sua vida como se nada pudesse ser diferente?
– Não, eu… aff, tudo bem – suspirou - Se é isso que quer, pelo menos me deixe te ajudar: o que posso fazer por você, amigo?
– Só prometa que vai assumir a liderança da base até lá como tem feito maravilhosamente até agora.
– Isso é fácil, pode deixar. Mas Ekko, tem que me prometer que não vamos te perder. Zaun não pode perder mais um líder, e eu não posso perder mais um amigo.
– Obrigada, Scar, eu prometo – disse emocionado abraçando o companheiro.
– Sem problemas. Ah, e, bom… eu já ia me esquecendo, mas, acho que ela gostaria que ficasse com você – Scar tirou de dentro de seu casaco a touca roxa com dentes de tubarão que Jinx havia feito para sua roupa de batalha. Ele deu para ele. Ekko pegou com cautela o tecido, seu olhar atônito, ele o tateou e o cheirou, tinha o cheiro dela.
– Como… onde você encontrou isso?
– Bom, é que você não foi o único que não acreditou nas buscas daqueles mauricinhos. Fomos lá também, e encontrei isso e guardei para te dar quando estivesse melhor, mas… você está além de ajuda pelo jeito – sorriu com o canto do boca.
– Obrigada Scar, você não tem ideia do quanto isso significa para mim.
No dia seguinte, Ekko acordou renovado, tinha recuperado a determinação de antes. Agora, tinha seu amigo lá por ele, e além disso tinha um propósito maior que todos: expandir as buscas para territórios mais distantes, quem sabe Jinx não teria ido para lá? Passou dias, montando paineis com cortes de plantas dos ductos de ventilação do galpão, quadros e mapas mentais com teorias e pontos de interrogação. Fazia patrulhas por toda Zaun, por cada beco, por cada túnel, cada lugar que ela poderia estar. Continuou fazendo rondas pelo galpão em busca de mais pistas, na esperança de encontrar algo útil à investigação, que sustentasse sua hipótese que Jinx conseguiu se esconder da explosão e se refugiado em algum lugar. Mas se ela não estava morta, onde estaria, porque não voltava? Essas perguntas ainda atormentavam sua mente e estilhaçaram seu coração. Já se passaram mais de dois meses desde sua “suposta morte”, e até agora, ele não tinha tido sucesso nenhum, e não tinha nada além de um capuz, um desenho e uma teoria.
Era inverno e ventava bastante, por isso Ekko foi obrigado a usar seu casaco, ele tinha evitado mexer nele desde que emprestara para ela aquele dia. Não queria tirar sua essência, seu cheiro, sua energia do casaco.
– Ah Pow Pow, onde você está? Onde foi que você se meteu dessa vez? Se você está viva, por que não vem me ver, por que não me avisa? Queria que estivesse aqui, comigo, sentada aqui ao meu lado. Tenho tantas coisas para dizer, eu… ia te chamar para sair, quem sabe? Ah, sinto tanto a sua falta que doi, por que está me torturando assim? Acho que estou começando a ficar louco, ultimamente só tenho falado comigo mesmo, acredita? Tipo agora. Faria qualquer coisa para te encontrar, Pow, eu só… só preciso de uma dica, um sinal. É tudo o que precisa fazer, ficar onde está que eu vou até você, só me mande um sinal, por favor, preciso saber onde você está, porque… preciso de você. Preciso de você mais do que nunca – falou em tom suave, baixinho.
O vento soava numa brisa macia em seu rosto. Ekko fechou os olhos, levantou o queixo e desfrutou do toque do ar em sua face. Segurava firme o capuz de Jinx com uma das mãos, rosadas pelo frio. Com a outra mão, desdobrou o desenho que olhou provavelmente pela décima vez só aquela tarde. Ele gostava de tê-los com ele por perto, era como se esses objetos o conectassem com Jinx e Isha, seja lá onde estivessem. Quando enfim, abriu os olhos, se preparando para retornar à base, suspirou e guardou os itens no bolso, foi nesse momento que escutou um barulho do farfalhar de papel.
– O que é isso, eu não toco nessa blusa há tempos, não era para ter nada aqui – tocou no papel e o tirou do bolso. Era um envelope meio amassado, ainda meio intrigado se apressou em abri-lo. Quando abriu o envelope, uma nuvem de confetti atacou Ekko, que foi pego totalmente desprevenido. Ele sorriu quase automaticamente, “Não seria dela se não tivesse o fator surpresa” . Ansioso, logo pegou e leu o pedaço de papel rasgado que havia dentro. Era um texto curto escrito a mão, com caneta azul brilhante, que dizia:
<< Obrigada por ser meu garoto salvador de novo, Ekko. Não sei como faz isso, mas eu acho que você tem esse superpoder: você sempre está lá quando mais preciso. É meio estranho, mas você sempre me encontra.
PS: Te fiz uma surpresinha, espero que goste!
Ass. Sua melhor e mais legal amiga de toda a galáxia, Jinx >>
Ekko leu a carta no mínimo cinco vezes seguidas, o peso daquelas palavras era simplesmente demais para ele. Era irônico como esse suposto superpoder falhou nas mais inconvenientes circunstâncias. Ele não conseguia acreditar como só tinha percebido aquilo semanas depois. “Estúpido, por que não checou a blusa antes, Jinx deve ter posto nele antes da batalha” . Começou a bater nele mesmo como se punir a si mesmo fosse mudar algo. Olhou para o envelope de novo, no fundo, estava um acessório feito da bala de sua arma com um símbolo de macaco em tons rosados gravado. Aquele era seu símbolo e Ekko sabia disso.
– É perfeito, Jinx, obrigada! — segurando as lágrimas que ameaçam cair, ele segurava a bala e a carta contra o peito. Ele não demorou muito e prendeu seu mais novo presente em um dos drads de seu cabelo. Ele sentiu seu corpo revigorando com a sensação de que precisava retribuir o presente, e ele sabia exatamente o que fazer.
Passou a madrugada trabalhando naquilo, mas lá estava seu presente: um mural enorme com retratos de Jinx. Fez questão de retratar cada uma com todos seus detalhes, tinha que ser perfeito como ela. Ele a desenhou de quatro formas: como Powder de sua infância, sua expressão inocente e sorridente; como a Jinx que lutou contra aquele dia na ponte, com suas longas e envolventes tranças azuis; como a Powder de outra realidade, em seu vestido branco deslumbrante e rodopiante; como Jinx que lutara ao seu lado para salvar o mundo, destemida, uma heroína.
Todo sujo de tinta, e com uma expressão que sono, Ekko se afastou da parede para ter uma visão ampla de sua mais aclamada, em sua opinião, obra de arte. Ele havia dado tudo de si e se orgulhava do resultado. O Sol acabava de nascer e Ekko sorriu radiante ao ver a parede se iluminando pouco a pouco com a luz. Estava lindo, como ela. Ele amava cada versão dela, cada pedacinho fragmentado dela, e foi isso que quis mostrar.
https://youtu.be/L4O2I73vGhk?si=AMMAjz9-fdKUCKhM
Preso nesse pensamento em looping, Ekko passou a noite pensativo, sentado na beira de uma sacada de um antigo fliperama onde Jinx e ele costumavam brincar na infância. Aquele era seu lugar favorito, depois da base do Fogolumes, claro. Era lá que ele ia sempre que precisava ficar sozinho, refletindo. Naquele lugar, naquele silêncio, era seu refúgio secreto. Lá foi onde Ekko conheceu Powder há muito tempo. Foi onde teve seu primeiro beijo, mesmo que tenha sido com outra versão dela. Foi lá que ele tinha ido todas as noites desde que soubera do seu sacrifício. Era lá que ele ia quando queria se sentir perto dela, e por Janna, como precisava dela agora, pois em poucas horas, o Memorial de 100 dias da Batalha de Piltover contra Noxus começaria.
Ekko não sabia bem se queria ir ao memorial. Scar mesmo insistiu para que não fosse, na tentativa falha de proteger o amigo do que já o feria. Não queria ir a um memorial e velar uma pessoa que não morrera para ele. Jinx ainda assombrava sua narrativa, mesmo depois de tanto tempo longe e desaparecida. Mas Ekko resolveu ir mesmo assim. Afinal, havia outras pessoas a lamentar a perda daquele dia, pessoas que realmente partiram e não voltariam mais. Por essas pessoas, Ekko decidiu ir, e com isso quis dizer: assistir à distância.
Sentado na beirada, observou o grandioso evento funerário começar. A cerimônia foi feita na ponte que unia as cidades inimigas, as cidades irmãs. Avistaram-se membros do Conselho de Piltover, famílias zaunitas, uma multidão inconsolável. Ouvia-se coros de preces e o soluçar agonizante dos que ficaram em vida. Em instantes, incontáveis papeizinhos, cada qual com o nome de quem se foi, flutuavam em chamas como eternas lanternas, como estrelas cadentes. Ekko suspirou diante da cena, emotivo outra vez. Tantos nomes, tantas perdas, tanto luto. Como tantas pessoas conseguiriam seguir em frente e superar o vazio abissal que se abriu em seus peitos há exatos 100 dias atrás? De onde tirariam forças para isso?
Aquele lugar nostálgico o fazia lembrar da risada gargalhante da menina que costumava brincar de pique-esconde entre os becos do Subferia. Memórias rodopiavam em sua mente como um filme mágico, em que tinha Powder em seus braços, mais bonita do que se poderia descrever, sorrindo um para o outro apaixonados. Como queria que tudo aquilo não passasse de uma brincadeira inocente daquelas agora, como queria poder ter sua garota ao seu lado e beijá-la como se fosse a primeira vez. Mal podia esperar pelo momento em que a encontraria escondida em algum canto, perdida, esperando pacientemente por ele gritar “Te peguei!” ou o momento que o pegaria pelo braço e o convidaria para dançar outra música.
Ekko pegou um papel de seu bolso e o acariciou gentilmente. No papel estava escrito, com sua letra, “Powder”. Com pesar, ele o queimou. Observando a chama se juntar aos outros no vasto céu estrelado, enfim, não pôde deixar de pensar na razão por trás disso. Aquilo tinha sido sua despedida, sua aceitação. Na outra mão, apanhou o capuz magenta feito por Jinx antes da batalha, o tocou com cuidado e o cheirou como uma flor.
É verdade, ele jamais encontraria a menina que costumava brincar de pique-esconde... ele jamais sentiria o toque dos lábios daquela moça de franja e mecha rosa, mas ele nunca as perdeu. Elas nunca sequer deixaram de existir, porque continuam latentes, mas vivas, dentro de Jinx, na dona daquele capuz engraçado e cheirando a pólvora. Powder sempre existiu em Jinx e Jinx em Powder. Jinx mudou com os anos, mas isso não a fez menos amável, ou menos real, pois a verdadeira Jinx, é um pouquinho de todas as suas versões e agora, mais transparente que cristal, ele percebeu: ele amaria todas. Jinx sempre seria aquela que ele ainda esperaria, pois ela, de alguma forma, sempre valeria a pena.
– Espere por mim, Jinx, eu vou te encontrar mais cedo ou mais tarde, nem que dure a vida inteira ou… apenas quatro segundos.
Notes:
Capítulo 1 - CAMÉLIA
Segundo o livro "Floriografia - A linguagem secreta das flores" de Jessica Roux
Significados: saudade de você
Origem: "O significado da camélia tem origem no romance de 1848 de Alexandre Dumas, A Dama das Camélias que narra o amor trágico do jovem burguês Armand Duval com a cortesã Marguerite Gautier".
Big56boi89 on Chapter 1 Sat 19 Jul 2025 11:57PM UTC
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