Actions

Work Header

Volta para casa

Summary:

Thiago nunca pensou que sua mente chamaria por Elizabeth após uma missão que resultou em um ferimento profundo e uma costela ferida. Porém, quando ela chama, ele vai até ela.

Notes:

(See the end of the work for notes.)

Work Text:

Ela não diz palavras gentis. Ela não bate à porta. Ela não se faz presente por necessidade. E, mesmo assim, se mantém na vaga memória de Thiago, rastejando como uma sentença pré-determinada, mas sequer tendo coragem de alcançá-lo totalmente. Então era assim que os condenados se sentiam ao caminharem pelo corredor da morte? Os pés pesados, a dor agoniante em uma costela quebrada, o cheiro de ferro misturado a whisky - ou o whisky não estava lá antes? Tanto faz. De qualquer forma, parecia uma experiência individual. Deveria ser. Quando se termina uma missão, se é que termina uma missão, um agente é colocado em devaneios específicos. Ele só não esperava que ela fosse seu devaneio.

Um colega seu lhe disse entre soluços de sangue que vira Deus; outro disse que o céu era lindo, o anjo também. Alucinações, claro, mas de forma bela. A maioria sequer tinha o direito disso. O paranormal apenas tomava sem pedir licença. Era rude. Alguns diziam ‘brutal’, mas ele não via desse modo; achava apenas rude. Como se fosse uma prostituta sem receber o pagamento, via desse jeito.

A questão é que ele não morreria naquele casebre, sua honra não permitia. Então o julgue por vagar pelos bairros com a mão no tronco, arrastando os pés, amaldiçoando a madrugada de quem o assistia e não fosse tonto o suficiente para julgar como um figurino de dia das bruxas. O amaldiçoe por levar sua merda até a porta de outra pessoa, como um cão vira-lata, não um homem de sorrisos lascivos. O maltrate por aparecer em sua porta quando o trovão bate forte contra telhas uma semana após uma discussão envolvendo vícios, abandonos e títulos. Grito quando suas mãos pesadas alcançarem a madeira da sua porta em um tom de quatro batidas. Quatro. E o rejeite por, ao ver seu rosto, ele sussurrar como um desesperado:

— Elizabeth.

Não Liz; não ‘querida’; muito menos ‘minha querida’. Seu nome, como uma salvação. Um esparadrapo para a carne exposta. O rejeite, Elizabeth Webber, e ele poderá retornar ao inferno de onde veio, cair em desgraças, ou simplesmente…

— Puta que me pariu, você perdeu a cabeça?! — ela o interrompe dos pensamentos piegas, praticamente se jogando ao lado do agente e passando a mão em volta da cintura encardida pelo sangue — Por que não foi pro hospital? Ligou pro hospital?

— ‘Tava perto — fora a resposta desagradável.

Os próximos minutos foram repletos por resmungos que envolviam palavrões do mais baixo nível e escapadas com o olhar toda vez que um pano úmido arrastava a carne maltratada. Pedidos de desculpa nunca eram ditos — não pela teimosia ou orgulho, apenas porque nenhum dos dois se vestia com eles naquelas horas. Thiago estava em seu sofá, e Elizabeth não estava feliz com o rastro de sangue no seu apartamento, e de repente a ideia dele morrer era um pouco ofensiva, também. Por isso suas mãos tremiam, é claro. Pela raiva. Cada ponto saturado com cuidado e nervosismo era simplesmente a rejeição da ideia de vê-lo morto por algo tão estúpido como um ferimento aberto.

— Diz alguma coisa — é mais uma ordem que um pedido. Thiago sorri, cansado. Ela talvez propositalmente pese a mão na agulha — Vai, facilita.

E se ele se esmerar e colocar a cabeça para funcionar só um pouco além da dor pela falta de anestesia, o cansaço e a humilhação poderia escutar a voz dela quase chorosa. Quase desesperada.

— Você é melhor nisso do que eu — ele responde.

O olhar dela diz muito. Era melhor calar a boca, pensou.

— Você anda muito impulsivo — ela diz, mas não dispara. Existe uma diferença, porque é quase como um desabafo — Não faz mais isso.

Também não é uma ordem — Thiago voltaria para o inferno, e ela também. Às vezes juntos, mas nem sempre. Eram a vida que levavam. Viva a Ordem.

O tempo passa muito mais devagar do que ambos esperavam para um sábado chuvoso. Elizabeth o remendou com cuidado, e trocou sua roupa quase com movimentos vindos da memória. A cama era dura, nunca fora comprada com o intuito de ser confortável, e toda vez que Thiago se remexia e gemia baixo pelas costas já maltratadas, era possível encontrar um vislumbre de culpa pela auto sabotagem que acertou ele sem querer. Os papéis na mesa da cozinha foram ignorados, porque agora ela estava cheia de analésgicos e bulas. Era bom se precaver, dizia. Ela vagava como um espírito inquieto entre os cochilos. O tocava a testa como uma enfermeira de guerra.

— Eu tô vivo, minha querida — Thiago finalmente fala algo assim que o Sol parou de se esconder por trás das nuvens, e aquilo deveria significar algo. Tinha que significar. Naquela vida, tudo precisava significar. — Fica em paz.

— Você não dormiu — é a resposta dela, sentando-se na beirada da cama.

— Não consigo com você por aí.

— É por causa do colchão.

— Já deitei em coisa pior.

Ela sabe.

— Além disso, eu tô acostumado, não tô?

Uma pausa. As mãos dela se erguem e Elizabeth tenta alcançá-lo, mas era lenta.

Então, ele a segura. Entrelaça os dedos, os ossos e a carne. Aquela era a ordem das coisas: onde Liz falhava, Thiago repunha. Onde Thiago perdia, Elizabeth encontrava.

Porque Liz era muito mais complicada do que Elizabeth, as pessoas só precisavam saber disso.

— Você me deu um puta de um susto, Thiago.

— Enfraqueci a membrana?

É o mais próximo de um sorriso que ela consegue entregar, e tudo bem porque paga o suficiente.

— Não, claro que não. Mas, eu vou se você aparecer aqui de novo sem trazer as agulhas. Custa caro, sabia?

— Eu vou dar um jeito.

Uma promessa.

— Eu sei.

Notes:

oi gente me segue no tt @georhfly sou bonito sou gostoso jogo bola e danço