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Connection Falls

Summary:

Will Cipher, o triângulo bondoso aprisionado por seu irmão maligno, finalmente encontra uma brecha entre dimensões com uma ajudinha do Bebê do Tempo. Ele invade os sonhos de Dipper Pines -- o garoto que outrora derrotara Bill -- para entregar uma terrível revelação: o triângulo amarelo está vivo... e mais poderoso do que nunca.

Embora tivesse sido apagado da existência, o antigo tirano interdimensional retornou das cinzas da realidade com um plano ainda mais devastador: reunir os vilões mais perigosos do multiverso e realizar o Multivergedom - o colapso absoluto da vida como conhecemos.

Agora, caberá a Dipper, Will e novos aliados viajarem por dimensões desconhecidas, realidades distorcidas e universos em ruína para impedir o caos que se aproxima.

Chapter Text

DIPPER

Um som distante de piano flutua pelo ar. Uma melodia triste, elegante, que pesa no peito de qualquer humano que a escute. Ele desperta, olhos cansados, em um quarto fechado, sem janelas. As paredes são azul-marinho, salpicadas de estrelas cintilantes; o chão, cinza e frio; o teto, negro, coberto por símbolos estranhos que nunca tinha visto.

Nada parece errado. Nada que deva preocupar. Sempre o mesmo sonho... sempre a mesma dor de cabeça latejante.

Tenta se levantar, mas nenhum músculo responde. Com esforço, consegue sair do sofá gelado. O chão gruda levemente nos pés, como uma gosma fria e elástica. Cada passo é pesado, quase relutante.

Arrasta-se até a porta de onde a música surge, puxa a maçaneta devagar... e lá está. Ele. O Demônio dos Sonhos. O destruidor de mundos que jamais morreu. Aquele que invocou os poderes anciões e voltou do nada.

Bill Cipher desliza os dedos pelas teclas, certeiro em cada nota. Um terceiro braço surge do corpo triangular, segurando uma taça que ele oferece ao rapaz.

Que provocador. Depois de tudo, Bill retorna das cinzas com a mesma personalidade?

Estranhamente, dessa vez ele se apresenta diferente. Um corpo azul, levemente brilhante, contorno branco. Nenhum chapéu, gravata ou bengala de vovô. Mais "bonzinho", talvez. Mas o rapaz jamais esquece o verão em Gravity Falls. Recusa a bebida e se senta na poltrona ao lado do piano.

Seu coração dispara ao analisar o quarto: um pequeno aquário preso à parede com peixes de aparência absurda; um tapete grosso e carnudo, que parece feito de criaturas interdimensionais, cobrindo metade do chão; e, pendurada no teto, uma lâmpada gigante que mais parece um olho vigilante.

Seus olhos voltam para Bill, parado, contemplando seu medo. Pela primeira vez, Dipper decide encarar o triângulo, tentar conversar. Mas antes que possa falar, Bill solta risadas agudas.

— Nem precisei dizer "sente-se"! — levita da cadeira. — Educado, hein.

Dipper sabe que está sonhando. Bill não pode machucá-lo aqui, apenas acessa seus sonhos. Mas ainda assim, arrepia sua espinha.

E se não estivesse? E se tivesse controle total da sua mente?

Não. Se tivesse, já teria se vingado.

— Me diga logo o que quer de mim! — Dipper ergue a voz, soltando um suspiro nervoso. — Quando vai parar de atormentar meus sonhos?

O olho enorme de Bill o encara, silencioso. Dipper nem pensa em apertar a mão do usurpador. Este encontro é apenas mais uma tentativa de tirar algo dele. Bill sempre quer. Bill quer sua liberdade.

— Não, Dipper. — Bill paira à frente dele. — Não quero liberdade.

— O quê? Você... — Dipper sorri de canto, acostumado às artimanhas. — Leu meus pensamentos, não é!? Vamos logo, Bill! Me mande de volta à realidade ou eu...

— Eu não sou Bill Cipher! — o triângulo interrompe, erguendo a voz. Afasta-se e projeta, com o olho, a imagem de Bill. — Não me compare a esse obliterador de vidas, nem em poder, nem em personalidade. — Fecha a projeção, aproxima-se, estendendo a mão. — Me chame de William Cipher. Meus amigos me chamam de Will. Se eu tivesse amigos, é claro.

Um silêncio pesado cai. Dipper esconde as mãos. Óbvio que é mentira, mais uma ilusão de um ser manipulador e tentador.

— Veja! — Will estala os dedos. A sala desaparece, revelando um vazio absoluto. — Esse seria o destino de Bill.

— O nada?

— Correto. Mas, em seu último suspiro, Bill invoca os poderes anciões e... — outro estalo, e surge a lembrança de Stanley Pines obliterando o triângulo amarelo. — Implorou para o Supremo Axolotl ajudá-lo. Tornou-se paciente do Teraprismo, um asilo para seres superpoderosos e interdimensionais.

— Até que isso parece bom, se ele não escapou... — comenta Dipper.

— É... — Will prolonga. Mostra uma sala de terapia, cheia de demônios, espectros e seres interdimensionais. No centro, Bill, confuso, sentado numa cadeira. — Ele viveria preso para se tornar uma nova "pessoa". Mas... — o cenário muda, e aparecem em uma floresta. — Venha.

Dipper segue o triângulo azul, observando a floresta de Gravity Falls: pinheiros altos, cogumelos nos troncos escuros, arbustos cheios de possíveis bizarrices, cheiro de churrasco no ar limpo e azul.

— Gravity Falls, de novo... — comenta, descendo um barranco até uma clareira ensolarada.

Chegam a uma estátua antiga: Bill, coberta de musgo, poeira e flores secas do outono. Antes que se aproximem, Will puxa Dipper atrás de uma árvore. Passos frenéticos ecoam pela floresta.

— Aquele menino é um Morty, o Morty Maligno. — Will sussurra. — Fugiu do seu universo, criou uma arma que viaja pelo multiverso. Agora está aqui, em Gravity Falls, tentando libertar Bill e quebrar a barreira de Ford.

Dipper espreita entre árvores e vê o garoto se lançar contra a estátua, sendo arremessado junto com um objeto desconhecido. Uma cúpula rosa e brilhante surge, Morty berra e pega um livro estranho do chão.

— Um feitiço de proteção... — sussurra Dipper. — E... ainda não quebrou?

— Sorte, só pode ser. — comenta Will.

Dipper arregala os olhos. Morty está sozinho. Instintivamente, se prepara para agir, tirando um livro de feitiços da pochete. Mas Morty Maligno reage rápido: pressiona um botão cinza, uma nave redonda aparece, e ele foge.

Will suspira, indignado.

— Não é tão fácil assim, Dipper. — Estala os dedos; eles voltam à sala dos sonhos. — Morty ouviu seus passos. Agora sabe que alguém o observa... talvez ache que alguém tenta impedi-lo.

— Estraguei tudo...

— Não. Morty Maligno não tem um terço do que nós temos. — Will projeta desenhos: coruja, sapo, varinha estelar. — Existem heróis pelo multiverso que não conhecem Bill, mas podemos convocá-los para impedir o Multivergedom. Todos aceitarão; o multiverso inteiro está em jogo.

Dipper tosse, sem palavras. O coração aperta, cheio de tensão. Há anos não vivia uma aventura assim. Agora, o multiverso inteiro depende dele.

— Vamos, Dipper! — Will estala os dedos, libertando-o da ansiedade. Um feixe de luz azul surge atrás dele. — Este portal leva a Gravesfield. A pessoa que você precisa convocar: Luz Noceda e seus amigos bruxos. Estarei esperando no cemitério. Agora, você precisa salvar nossa realidade.

Dipper encara o portal. Sua mente apaga, concentrando-se apenas no passado. Apesar das lembranças, ele sabe: pode ser um herói. Precisa convocar os outros, enfrentar Bill e impedir o Multivergedom. O multiverso depende dele.

Chapter 2: 1. - Quando os Portais Sonham

Chapter Text

 

Embora o rosto esteja iluminado pelo portal azul brilhante, não há "luz" no rosto de Dipper, apenas uma expressão de perplexidade, medo e indecisão no olhar. Neste momento, a sua mente lembra dos momentos daquele icônico “verão de mistérios” em Gravity Falls. E agora, o retorno desse é verão o multiverso em jogo, uma missão de convocar os heróis e impedir o Multivergedom.

A hesitação ainda o prende, mas, no momento em que der o primeiro passo, decidirá de vez aceitar seu destino. Mesmo que não quisesse chamar aquilo de “destino”, Dipper sabia que estaria ajudando os mundos, formando alianças e combatendo o mal que ameaça todas as realidades.

Ele lança um olhar para Will, que se aproxima flutuando e emparelhado ao seu lado com a indagação final:

— Está pronto?

— Pronto? — Dipper suspira, franzindo o cenho. — Ninguém está realmente pronto para isso. Mas… já enfrentei pesadelos parecidos. Se passar isso pelo preço pela paz… eu pago.

Dipper dá alguns passos em direção ao portal azul, e o olho único de Will acende com uma chama amarelada. Mas, de repente, os passos de Dipper cessam. Will arregala o olho, preste a falar, quando Dipper o interrompeu:

— Mas… e os meus amigos? Meus pais? É uma Mabel! — Ele se vira de imediato, as mãos enfiadas nos cabelos, andando de um lado para o outro. — Tá, eu não posso ir se…

— Eles estão bem. Eles ficarão bem, Dipper. — diz Will calmamente, pousando a mão sobre o ombro dele. — Confie em mim. Agora… as chances de a Terra ser atacada por, sei lá, pôneis voadores, ou qualquer maluquice do tipo, são mínimas. Nosso único dever é…

— Reúna os heróis e derrote Bill Cipher. É…  eu sei . Mas… — Dipper ainda está no portal.

O vento que emerge do vórtice balança seus cabelos, e um leve suspiro escapa de sua boca.

— Tudo bem… estou pronto.

Dipper finalmente atravessa o portal. Seus olhos estão cegos por um branco absoluto — um vazio, uma sala, um plano em que nada existe. Por um breve momento, ele acredita ainda estar sendo transportado. Mas, ao ouvir uma risada distorcida se aproximando por trás… ele já entende o que está por vir.

Ao se virar, Dipper vê um corredor surgir diante dele: salas homologadas, paredes cinzentas, um cenário frio e inóspito. Ele ainda pisa sobre o chão branco, mas o triângulo azul que se aproxima não. Então, Will Cipher começa a caminhar também sobre o chão branco… e Dipper arregala os olhos.

A forma triangular de Will se distorce no ar, as linhas vibram, a cor muda de azul para amarelo… e ele se transforma. Os cabelos surgem, o gravata se alonga e se molda em uma fraque elegante. Um sorriso maligno se desenha no rosto recém-formado.

Não. Não pode ser.

Dipper não quer acreditar, mas, acima de tudo, se prepara. Puxa o livro de feitiços da pochete, abre rapidamente na seção desejada e lança um olhar (o mesmo olhar em que enfrentara-lo no estranhamento).

—  Codex Arcana, página 56: Protego!

Bill Cipher para imediatamente, olhando para frente.

— Ora, uma barreira? — diz, com desdém, e tocando no campo esverdeado formado ao redor do rapaz. — Achei que seria muito mais difícil.

Bill estende a mão, e um impulso invisível lança Dipper para trás. Três paredes e um teto se erguem ao redor, formando uma cela.

— Você substituiu o seu velho, mas ainda não aprendeu a lição essencial de toda a realidade… — Bill diz com indignação e um balançar de cabeça, soltando por um fim uma voz série e conectada de fúria: —  Nunca confie em ninguém!

O tom logo se transforma em um sorriso, e ele fala num ritmo mais calmo, quase como se quisesse manter o seu controle ou esquecer uma antiga “vida”:

— Nem em amigos. Nem em família. Eu já fui assim, Dipper.

— Já chega! — Dipper corre em direção a ele, mas, no mesmo instante, notas luminosas e quentes surgem à sua frente. Ele para bruscamente. — Quando eu sair daqui, Bill! Eu vou…

— Ah, você não vai. — o triângulo responde naquele clássico tom agudo. — Eu não estou no controle. Dentro de uma cascata que me concedeu dominação eterna. Não haverá resistência que me impeça, nem heróis… porque o multiverso…

— Então é isso que você quer, Bill!? Ó Multivergência? O sofrimento e a morte de pessoas? A mera destruição da realidade!? Isso…  é ridículo .

— Não, não é… exatamente “a destruição da realidade”. E não é ridículo — Bill se aproxima da cela, inclinando a cabeça. — Pense no Multivergedom como uma  formatação . Reconfigurar a realidade, quebrando padrões. Mas o fator principal é este: o que você chama de “vida” é um bug que impede que minha célula exista por completo. Eu vou criar uma crise de universos para reiniciar o sistema multiversal.

— Ahh, uma popular “destruição da realidade”. — Dipper revira os olhos e solta um bocejo sarcástico. — Sério, a mesma ladainha de sempre? E tipo… , cara! Isso já tá ficando  chato .

— Talvez... — Bill responde, desviando os olhos por um instante — não me importo se uma crise de realidades para o acontecimento do Multivergedom. O que importa é o reinício. O novo “padrão” será diferente. Uma nova existência, algo inimaginável. E você, Dipper, junto com os demais heróis do multiverso, não passa de uma linha genérica no meu caminho. Só assim posso sair do limbo multiversal que eu mesmo ajudei a criar… com aquele maldito quadrúpede rosa.

Ele dá uma pausa soltando um leve respiro pela boca, colocando os dedos na testa quente e retornando com um olhar sério.

— Não é pessoal. Não guarde rancor por ter me derrotado mais de uma vez… só acho que essa vida de super-heróis e vilões virou uma maldição pra mim. Talvez a “nova realidade” seja um mundo… diferente: sem heróis, sem vilões… sem o caos, que tanto me atormenta.

Depois de um silêncio, Bill solta uma risada sincera, leve e fraca, e Dipper apenas balança a cabeça em negação.

— Nós vamos nos reencontrar de novo. — responde o antigo triângulo com um sorriso, e estala o dedo e invoca um penteador, no qual começa a modelar o cabelo loiro. — O bom é que, agora,  você  é o prisioneiro, e  eu  tenho mais liberdade pra agir.

Ele se vira, e sua clássica bengala surge no ar.

— Posso enganar outros tolos e ampliar meu poder. Mas antes, preciso resolver… algumas pendências  multi-multiversais .

—  Mimimimi … — sussurra Dipper.

Com um estalar de dedos, um portal amarelo e distorcido se abre à sua frente. Bill o atravessa, virando o rosto apenas para dizer:

— Até o “são nunca”… e não compre ouro.  Sério, não vai valer nada quando o mundo estiver em colapso . Tchau!

A primeira coisa que Dipper faz, assim que Bill desaparece, é chutar as notas da cela, movido pela raiva e pelo desespero. Mas, no instante seguinte, uma labareda azul envolve seu tênis, forçando-o a recuar. Ele rapidamente tira o casaco e usa para apagar o fogo.

Um suspiro de alívio escapado, mas o coração continua disparado.

Era inacreditável. Dipper Pines — depois de Gravity Falls, depois de tudo o que viveu — enganado por Bill Cipher mais uma vez. E agora, pronto. Ele se senta no chão frio da cela, de pernas cruzadas, a cabeça baixa.

Não importava o quanto lutasse, o quanto aprendesse… seu maior inimigo sempre dava um jeito de voltar. Sempre encontrei uma nova forma de invadir seus sonhos, alimentar seus medos, e enganá-lo — como sempre.

Se Bill ainda está vivo, então Dipper nunca venceu. Nunca realmente venci.

Ou pelo menos… é isso que ele pensa. Porque, na realidade, o mundo ainda precisa dele.

Respirando fundo, Dipper se levanta, ainda o vazio à frente, ainda abatido, mas determinado. Puxa da bolsa um pequeno dispositivo: uma espécie de pulseira metálica, criada por ele mesmo, chamada de  Lançador de Glifos .

Ele o encaixa no braço esquerdo, ajusta as amarras com firmeza e insere um papel com runas em um compartimento lateral. Pronto para disparar, ao posicionar a mão sobre o gatilho, mas, antes que possa apertar, uma voz feminina ecoa pela cela, suave, mas cansada:

—  É impossível ...

Ele arregala os olhos, feito por um espanto maravilhoso, e então se imobiliza para observar em volta.

— Quem está falando? — pergunta, desconfiada.

O vazio na sala o fez acreditar, por um breve momento, que ficou louco; no entanto, a mesma voz retorna:

— Estou na cela ao lado. — responda, seguida de um suspiro profundo. — Estou aqui há... horas, eu acho. E, pelo jeito, as paredes deixam as vozes passarem.

— Interessante… então isso não é matéria real.

— É impossível sair daqui. Vai por mim.

— Ah, mas não custa tentar, né?

Dipper aperta o gatilho e… nada acontece. O papel com o glifo se solta, flutua e se desfaz no ar como poeira. Ele tenta novamente, e o mesmo erro se repete. A magia simplesmente não funciona ali.

Mesmo não funcionando, Dipper sente uma fagulha de esperança, principalmente por ter alguém naquele lugar. Essa é a questão que carregará na cabeça:  se Bill Cipher prendeu essa pessoa aqui, com certeza deve ser importante ou possuir algum poder .

— Caiu nas palavrinhas desse triângulo? — pergunta a mulher, num tom resignado, como se já soubesse a resposta. — Eu tive que fazer um contrato com ele.

— E lá vamos nós… Bill é o ser mais poderoso e manipulador do multiverso. Só que, acima de tudo, faça mal. — Dipper se recosta na parede, com sua mente Equipamentos em Bill Cipher e em mais nada. — Mas, dessa vez, tem algo diferente. Não é o mesmo Bill. Eu sinto que ele… mudou. Abandonou aquele  eu  carismático. Entende?

Nenhuma resposta da moça; e Dipper, após esticar os braços, continua:

— Mas, falando nisso… você conhece ele? O que você fez esse contrato?

— Pra ser sincero, eu não tenho escolha. — responda ela, com a voz embargada. — Foi um engano. E também… um erro meu. Um erro que me custou algo imensurável.

— Eu... sinto muito. — Dipper murmura, com uma breve pausa de silêncio. — Primeira lição da vida: nunca confie num triângulo de gravata e bengala, mesmo que ele seja azul, roxo, amarelo ou de qualquer cor que dê pra imaginar… ou não. Nunca confie!

— Verdadeiro... verdadeiro. — responde ela, com um leve toque de ironia cansada.

Dipper decide fechar a matraca por um momento.

Ele sente que, ao tentar descobrir o “motivo real” do contrato, acabou deixando o clima pesado. Agora, o vazio e a quietude vieram a incomodá-lo. Ainda assim… pelo menos não está completamente sozinho — dá pra dizer que são “companheiros de prisão e ilusão”.

Mas então, algo inesperado quebra o silêncio: uma risada.

A risada da moça ecoa pelo corredor, leve, quase divertida, e o coração de Dipper se alivia instantaneamente.

— Você está rindo, hein? — ele pergunta, com uma sobrancelha arqueada.

— É que… — ela tenta conter o riso, mas falha miseravelmente — você foi totalmente iludido. Cara, ele disse “um menino tentando reviver Bill” e o “escolhido pra impedir tudo isso” — as gargalhadas se intensificam — você caiu que nem um sapinho!

— Hahaha… pelo menos eu… — Dipper pausa, leva a mão ao queixo e se levanta do chão. — Espera. Você ouviu toda a minha conversa com ele? Então minhas suspeitas estão certas.

— Suspeitos? — pergunta a mulher, curiosa.

Dipper não responde, apenas sorri de canto, e ela completa:

— Mas eu admiro sua determinação… e coragem. Você parece ser uma boa pessoa, Dipper.

Ele congelou por um instante, sentindo as bochechas corarem levemente. Um sorriso discreto surge em seu rosto. Então, volte a se concentrar e observe o corredor.

Através das notas, ele vê o  Arcano do Codex  jogado no chão, o seu “diário”/tomo/guia de magia e feitiços (eu sei, muitas barras) que Bill derrubou deliberadamente ao empurrá-lo.

— Se eu tive pelo menos o meu livro nas mãos… talvez conseguisse tirar a gente daqui.

— Hmmm… então você faz mágica? — A mulher se desencosta da parede e se levanta. Seus ossos estalam, os braços e ombros se movem com certas dificuldades. — Rapaz… faz tempo que eu não faço isso também.

Um som agudo, semelhante a um  flash , ecoa. Em seguida, um feixe de luz azul atravessa a cela dela, ricocheteia na parede e atinge o livro, empurrando-o direto para dentro da cela de Dipper. Ele o segura rapidamente e percebe que está pegando fogo.

—Nossa Senhora! Como é que você fez isso!? — Dipper exclama, surpreso, enquanto bate nas páginas para apagar as chamas azuladas. Por um momento, pensa que ela pode ser uma “heroína” (alguém que Bill enganou e prendeu para facilitar seus planos). — Por acaso, você conhece a magia do nosso universo?

— Você sabe? — ela faz uma breve pausa antes de responder. — Tô destinado a ser guardiã desse multiverso… então, é, sei de algumas coisinhas. — tente explicar, com certa humildade. — Espero que não tenha danificado seu livro.

— Ah, não. Tá de boa… e reluzente. — Dipper responde com um meio sorriso, aliviado.

Dipper abre o livro de feitiços, folheia as páginas e para a seção de  Feitiços de Identificação . Rapidamente, ele puxa uma folha da pochete, faz alguns rabiscos de símbolos e começa a pronunciar palavras que são indescritíveis.

— Existem duas faixas que me fazem acreditar que é isso — diz ele, sem desviar o olhar do chão. — As vozes que atravessam as paredes… e a anulação da Propagação de Energia Mágica. Essas paredes não são reais, uma ilusão, ou talvez uma matéria importada de outro plano existencial. E a anulação de magia não existe se há seres que se propagam. — Ele ergue o olhar convicto. — Então, isso aqui é uma dimensão de prisão ilusória… ou um lugar dentro do subconsciente de Bill.

Os símbolos que desenhou começam a brilhar, erguendo-se lentamente do papel e flutuando no ar. A energia deles se distorce, revelando o selo de Bill, e a assinatura de sua magia é espalhada por toda a cela:  Dimensão Ilusória . Dipper estava certo.

Ele rasga outra folha e desenha novos símbolos, dessa vez com mais precisão. Coloca uma pequena pedra sobre o centro do papel e recita um feitiço em voz baixa. Quando termina, pisa firme sobre a pedra mágica.

As paredes ao redor tremem, as notas brilham como se fossem feitas de luz líquida, e o chão começa a se dissolver. O som do mundo muda… não, retorna ao real. Em um piscar de olhos, o vazio branco se rompe, e eles se veem de pé em uma floresta escura, sob um céu encoberto e distante.

Dipper recolhe o livro do chão e dá algumas tapinhas na capa chamuscada.

— Uau… — murmura uma voz do outro lado. Pela primeira vez, Dipper vê claramente. — Ótimo trabalho, feiticeiro.

Ele ri de leve.

— Eu não sou um feiticeiro… e sim um mago.

A garota ergue uma sobrancelha, confusa, como se não houvesse diferença alguma entre as duas palavras.

— Só consigo usar magia com a ajuda de palavras arcanas — explica ele, fechando o livro com cuidado. — Mas, enfim… se não fosse por você, ainda estaríamos presos ali.

A mulher dá alguns passos à frente. Seu cabelo castanho e ondulado reflete a luz fria da lua. Dipper, instintivamente, recua um pouco, erguendo a mão num gesto hesitante.

— Espera… como se chama?

—Ana.  Anne Boonchuy . E você?

— Di... — ele interrompeu-se por um instante, hesitando — Mason… Pines.

Anne apoia a mão na cintura, arqueando um sorriso divertido.

— Prazer, Dimason Pines.

— É… pode ser — responder, desviando o olhar, tentando esconder o rubor que colore o rosto. — Acho que estamos na Terra. Não… certamente estamos na Terra.

Dipper vira-se depressa e caminha até um arbusto coberto de flores azuladas. Pega uma delas com cuidado, mais por curiosidade do que por beleza, e então tira um pequeno dispositivo da pochete. Alguns segundos bastam para o visor confirmar o impossível: eles estão em...

– Connecticut? — murmura, franzindo o cenho. — Eu moro em LOS ANGELES!

Ele avançou alguns passos e, ao afastar os arbustos de um arbusto mais alto, enxergar uma rua vazia sob o luar. Um silêncio inquieto domina a região.

— Já estou aqui, vou procurar aquela heroína. Precisamos deter Bill Cipher — diz, determinado. Mas, ao se virar, vê Anne de pé, olhando para a lua com uma expressão distante, melancólica, embora de alguma forma feliz. Ele entende o recado: ela não vai junto. — Foi um prazer te conhecer também, Boonchuy.

Dipper ergue a mão num aceno discreto.

Mas antes que ela responda, ou ao redor vibra. Uma luz azul intensa envolve Anne, que é lançada para o céu como uma cometa ascendente. Um vento súbito atravessa a floresta, balançando as folhas, o casaco de Dipper, e até arrancando seu chapéu.

Ele observa, de olhos arregalados, até que o brilho desaparece entre as nuvens.

— Caram… estranhabolas. O que acabou de acontecer aqui? — pergunta, mais para si mesmo. Depois, respire fundo e solte um meio sorriso cansado. —  Hmpf … acho que nada mais nesse mundo… ou melhor, nesse  multiverso , me surpreende.

Dipper caminha até a estrada. Seu chapéu relatado no asfalto, e ele o apanha com cuidado, batendo a poeira e ajeitando-o na cabeça. À frente, há algumas casas quebram o silêncio da noite e um muro que cobre metade da visão deles.

Uma placa antiga o recebe à beira da estrada:

“Bem-vindo a Gravesfield.”

 

🌲🐸🦉

 

Esta é a cidade que o Bill Cipher faz “bem”, o de tom azul e olhar sereno — Will Cipher — mencionara. Era aqui que Dipper deveria encontrar a tal heroína chamada Luz…  Centelha ?

Ele hesita no nome, arrisca uma hipótese e escreve outra no caderno. A memória de Dipper sempre foi fraca… e a resposta obviamente está na cara. Um sono de dez mil duembretes no inverno enche a cabeça de Dipper.

Pelo menos uma coisa é certa: Gravesfield é real. A primeira verdade dita por Bill. E agora será necessário encontrá-la ou morrer tentando. Mas uma dúvida o atormenta:

Por que a prisão ilusória foi construída perto daqui?

Talvez Bill tenha deixado as peças propositalmente interessadas. Um jogo, uma tentativa de iludir com esperança. Talvez ache que Dipper nunca vencerá. E por isso tudo não passa de um lembrete cruel de que Bill sempre estará sob o controle dos Pines… e do mundo.

Não. Não do mundo. Da própria presunção de retornar, de ressurgir e propagar o caos.

E se essa esperança, essa chance ilusória, foi o mesmo presente envenenado dado a Anne Boonchuy?

Por que Bill não matou os dois quando teve uma chance?

Dipper continua caminhando pelo asfalto rachado da estrada, observando as árvores curvadas, os arbustos que se movem com o vento e as pequenas decorações de Halloween. O frio da noite o acompanha.

É preciso admitir. Ele está com medo. O desconhecido sempre foi seu maior medo.

Quando atravessa a cerca quebrada e entra de vez na cidade, a distância do vento é substituída por murmúrios de corujas, que vem de todos como previsto. Embora estivesse na calçada, Dipper observava todas as árvores em busca daquelas corujas, mas nada.

Gravesfield relacionado em sombras.

Há uma pequena praça central, que entra ao atravessar a rua. O gramado ali era seco, porém, limpo e bonito como… como o gramado do vizinho do Dipper. Após dar uma caminhada, ele retorna a rua úmida e vazia.

Entre no primeiro lugar que encontra aberto: uma cafeteria de fachada gasta, com o letreiro trêmulo de néon,  Robin's Roast .

O medo, que antes diminuía, volta à superfície. O sino da porta toca. Nenhum cliente. Nenhum funcionário.

Só o aroma vago de café e uma placa virada para fora falando  Aberto .

Dipper se senta no balcão, pousa o diário sobre o tampo e começa a escrever. Os pensamentos se embaralham. As palavras não se encaixam. O corpo pede descanso, mas a mente recusa:  não enquanto Bill estiver à solta .

Não, enquanto isso não…

—Ah! Olá! — Uma voz surge de repente, e Dipper quase derrubou a caneta.

Uma moça saira pela porta dos fundos, ajeitando o avental.

— Desculpa a demora. Quer alguma coisa?

— Um café com muita… MUITA açúcar mesmo. — Dipper força um sorriso. — Bota açúcar nisso.

— Hm, tá bom… tipo umas dez colheres a mais? — ela ri, sem resposta.

Enquanto ela se vira para preparar o pedido, Dipper observa. Seus olhos caem sobre o crachá:  Vee . E por um instante, ele jurou ter visto o que são apenas pontas de orelhas, disfarçadas sob os cabelos.

Esfrega os olhos. Pode estar vendendo coisas. Volta ao diário. Rabisca. Risca. Desenha. Pára.

As palavras não fazem sentido algum.

Vee retorna e coloca o copo diante dele, com o aroma quente perto do seu rosto. No topo da espuma, um desenho simples. Uma coruja, feita com leite.

Dipper sorri de leve, e por um breve instante, o caos dentro dele silenciado.

— Que fofo… — comenta Dipper, dando um gole no café e lançando um olhar rápido ao relógio de parede. — Você consegue fazer uma Ursa Maior?

— Uma constelação? Ah, é o próprio leite que decide o formato — ela sorri de canto, apoiando o cotovelo no balcão e o queixo na mão. — Sempre saem corujas, mesmo quando não tento. E você… faz desenhos também?

—Desenhos? É, mas acho melhor você nem vê-los. São meio… macabros, consomem a alma. Sabe? — Ele dá de ombros. — Tenho uma dúvida: até que horas fica aberto aqui?

— Até às oito da tarde.  Por quê?

Vee se vira casualmente, franzindo a testa ao perceber que o relógio marca quatro da manhã.

— Você… tá coisado de novo?

Dipper olha para o próprio relógio de pulso, que gira como um ventilador usado.

— Tá, acho que meu relógio também… tá tendo um colapso existencial.

— A cidade inteira tá — responde Vee, virando-se de relança. — Desde o incidente, todo o mundo prefere ficar trancado em casa.

— Incidente?

— Longa história. Um tal de  Rei Gelado  apareceu neste Halloween, congelando as pessoas. As crianças ficaram traumatizadas — diz ela, pegando o relógio de parede e colocando-o no balcão. — Você não é daqui, né?

— Só estou visitando. Ou... tentando. Ou estou perdendo, ainda estou confuso com o que aconteceu comigo. Ouça uns barcos sobre uma bruxa. Uma tal de  Luz Centelha … eu acho.

— Ah,  Noceda ? — diz Vee, arqueando a sobrancelha enquanto puxa debaixo do balcão… um martelo enorme. — Hora de acabar com isso.

— Ok, calma aí — ergue Dipper as mãos. — É nesse momento que eu corro ou espero que você me explique o porquê de um martelo em uma cafeteria?

— Relaxa, não é pra você — responde Vee, com um sorriso meigo. — É pro relógio.

— Ó relógio. Claro… ufa! — Dipper solta um suspiro. — Já passei por coisas demais só nesta noite. Primeiro, ex-namoradas psicopatas me enganando. Depois, cacei um lobisomem, tirei um sono profundo e, quase agora, passei pelo pior pesadelo da minha vida, com um triângulo encapetado, uma estranha mulher e…

Vee apenas balançando a cabeça, de cima para baixo, concordando com cada palavra. Então ergue o martelo, pronto para descer ̶c̶a̶c̶e̶… o golpe!

E então…

PLIN!

A porta se abre com o estalo do sino ecoando pelo café. Dipper não olha imediatamente, voltando-se para escrever em seu diário. Mas quando percebe o olhar perplexo de Vee — o mesmo olhar que ele viu quando Bill revelou a verdade —, ele finalmente ergue o olhar e observa o que acaba de entrar.

Uma mulher fica parada no meio da porta, quase caindo, enquanto Vee larga o martelo e corre para ampará-la.

—Salgueiro  ! — grita Vee, desesperada. — O que aconteceu!?

— Ele voltou… — Willow é conduzido até um assento nos braços da amiga. A voz dela treme, e as palavras soam como uma sugestão de pavor que nenhuma coruja jamais desejaria ouvir: — Belos e Bill estão de volta, mais fortes do que nunca.

Vee aperta a própria mão sobre o peito, quase sufocando. Willow respira com dificuldade. Dipper permanece parado por um instante, soltando um suspiro. Com cuidado, deixa o diário de lado, pegue um papel com símbolos e se aproxime deles.

— Você vai ficar bem — diz Vee, quase chorando. — Vai ficar bem!

— Não… você precisa fugir, Vee. — Willow tenta se levantar, a voz ainda trêmula. — Ele está vindo para cá. Fuja e avise os outros.

Dipper se coloca entre elas e pega seu livro de feitiços. O feitiço anterior drenou grande parte de sua energia, e ele não tem certeza se conseguirá lançar uma de regeneração. Mas ele não pode deixar aquilo passar desesperado.

— Vai ficar tudo bem… no entanto… — murmura.

Um instante crítico se aproxima: Willow quase sua entrega final suspiro. Dipper rasga um papel do livro, desenha círculos e símbolos com precisão e inicia o feitiço, movendo as mãos sem tocar nada.

Um brilho verde envolve o ferimento, cicatrizando lentamente.

— É um feitiço de regeneração absoluta — explica Dipper, virando-se para Vee. — Todo o corpo será revigorado em alguns minutos com um pequeno aumento na Mana de Energia Mágica. Mas agora… — Dipper desvia os olhos para janela — o nosso problema pode ser outro.

Ele convidou para as duas, como se salvar vidas fosse rotina, mas o estrondo seguinte interrompeu seu momento de rompimento. Estilhaços de vidro voam pela janela enquanto algo invade o café.

Um monstruoso colossal emerge, abrindo um buraco na parede. Seus membros longos arrastam-se sobre o chão rachado. É um corpo gosmento, como um lodo ou uma mistura de lixo e água podre, grudando no chão. O cheiro rapidamente sobe no ar. Um odor forte e ruim… muito ruim, apenas com um aroma sutil metálico.

Os olhos azuis da criatura encaravam as duas mulheres, cheios de uma ameaça silenciosa.

Mas é o olhar de Dipper que prende a atenção. Raios amarelos circulam no corpo da criatura, que parece imóvel, apesar de sua forma monstruosa. O rosto, semelhante a um crânio, não demonstra expressão… e assim Dipper percebe o verdadeiro medo que ocasionará.

— Bem como eu esperava — diz, aproximando-se. Observe uma pele viscosa. — Tem cheiro de humano… embora sua aparência não se confirme. — Ele coloca a mão no queixo, sem demonstrar medo ou hesitação, somente curiosidade. — Isso tem cheiro de maldição. Por acaso, você é um bruxo?

— Ele é quase isso. E quem é você? — Willow pergunta, ainda atordoada, sentindo um calafrio percorrer sua espinha. Os olhos dela seguem Dipper, que se mantém firme diante da criatura travada sob o feitiço. — Você não parece ser daqui.

— Eu sou Mason. Mestre mago e viajante multiversal… e também um caçador de monstros.

Logo depois da apresentação, a porta se abre num sopro e mais três pessoas entram às pressas no estabelecimento. Todos corretos para Willow; uma mulher morena parece a mais ansiosa. Um rapaz de pele pálida planta-se na frente do grupo, em guarda, olhando Dipper com olhos atentos.

–Belos. — a mulher morena diz, o nome saiu carregado de rancor, enquanto, ao lado da amiga, observa o rapaz e a criatura parados no meio do salão.

Dipper permanece calmo. Só nota a aproximação com um movimento no canto do olho, e mesmo assim não se aflige. Vai até o balcão, pega o diário, anota o nome “Belos” e fecha com um círculo grande na volta da palavra.

Ao voltar para junto da criatura paralisada, ele enfrenta todos os recém-chegados.

— Quem são vocês? — pergunta, folheando o livro de feitiços. — Você parece conhecer a magia do nosso universo.

— Eu sou Luz. — a mulher morena se apresenta. — E você...?

— Mason Pines.

A confirmação desaba com o peso de uma verdade: talvez a única verdade que Bill disse. Luz Noceda existe. E, como Bill havia dito aqui, ela é uma heroína — uma peça para enfrentar o Multivergedom. Dipper respira fundo; o multiverso precisa reunir quem puder.

— Olha, é uma longa história, mas o multiverso precisa da ajuda de vocês. — Dipper abre o diário na página certa e mostra a ilustração de Bill sobre o Estranhagedom. — Existe um ser chamado Bill Cipher, um demônio… ou quase isso, extremamente poderoso, capaz de obliterar vidas num estelo, destruir mundos e até universos.

— E lá vamos nós... — Luz murmura, pronta para outra aventura.

— Meus avós derrotaram Bill, mas de alguma forma ele voltou. — Dipper continua, mostrando um desenho da família Pines reunida. — Bill Cipher é a maior ameaça do multiverso. E vocês... são...?

— Bruxos. — o rapaz das cicatrizes completa em tom seco.

— Heróis! E bruxos também... — Dipper corrige, um pouco tímido e com a mão na nuca. — Vocês podem impedir o projeto de lei e impedir a destruição da nossa realidade. Vim convocar vocês para essa batalha.

Um homem alto e moreno se aproxima, contrariado.

— Espera, espera, espera. — diz ele. — Você está dizendo que temos que impedir a destruição da realidade?

—Isso mesmo. —Dipper responde. Vê a mulher de olhos verdes lançar um olhar desconfiado. — Já fui enganado por Bill várias vezes. Também errei. Mas eu, vocês e muitos outros heróis por aí podemos impedir isso. Somos uma esperança.

É difícil convencer os bruxos só com palavras — e mais ainda quando, a maioria senão todos, há quem já sofreu nas mãos de alguém chamado Belos. Dipper tem vinte e dois anos, tatuagens pelo corpo e um diário de couro azul; não é exatamente um cartão de credenciais incontestável. É natural que desconfiem e se indagam: e se ele for mais um mentiroso, manipulador ou assassino?

Para Dipper, pouco importa o ceticismo. Pelo menos por enquanto, eles terão que seguir essa jornada até acreditarem.

Os cochichos entre os bruxos crescendo; o próprio Dipper quase se perde neles, esquecido do monstro atrás. Ele retoma o fio da fala e encerra o que chama de incentivo (mensagem do autor: eu estou adorando escrever isso kkkkkk).

Todos os olhos estão perplexos — exatamente como ele esperava. O peso do destino realmente parece escondido na ponta dos dedos, e Luz aparentemente está mais agitada. Ela não consegue encarar nenhum dos dois: Dipper Pines, sendo completamente um visitante ou “Messias do Caos”; e o velho Bill Cipher, que nem precisamos falar dele mais.

Dipper se vira para uma criatura sob o feitiço de paralisação e pergunta, com o cenho erguido:

— Vocês conhecem essa... coisa?

–Belos. Ele foi o imperador das Ilhas Escaldadas. — Hunter aparece ao lado de Dipper. — O objetivo dele era exterminar as bruxas, mas, como vê, não conseguiu. — Hunter mostra a língua, desdenhoso. — A gente o derrotou antes. E como... como ele voltou?

— Deve ser obra do Bill. — alguém confirma sem hesitar, sendo Gus aproximando-se de Dipper e Hunter. — Bill reviveu Belos de algum jeito. Talvez você esteja reunindo monstros, seres poderosos, um exército de...

— Vilões. — Luz Noceda completa, de forma seca e vazia.

O grupo se move em direção à criatura. Luz é a única que avança um passo a mais e ergue as mãos, palmas abertas; uma aura roxa e sombria emana dela.

— Vamos acabar logo com ele. Menos um vilão para nos atrapalhar. — Luz sugere, decidida e pronta para exterminá-lo.

 

🌲🐸🦉

 

— Você tem razão. — Dipper segue Luz, concordando com firmeza. — Deixar essa coisa presa com Bill por aí não é uma boa ideia. Ainda mais se forem cúmplices. Mas… deixa isso comigo.

Ele levanta as mãos, umas as palmas, e delas irrompe um brilho intenso, rosa-magenta, cheio de partículas que dançam pelo ar. Os bruxos observam, silenciosos, já preparados para o que vai acontecer.

— Isso vai fazer. — Dipper atravessa o círculo mágico e toca Belos com a ponta do dedo. — Codex Arcana, página 66: Feitiço de Obliteração.

Uma explosão de partículas se espalha pelas mãos de Dipper, envolvendo Belos em um brilho vermelho intenso. Aos poucos, seu corpo gosmento se desfaz, desaparecendo até que só reste um esqueleto imóvel. Os gritos agonizantes ecoam pelo ambiente e o esqueleto finalmente se desfaz, mas, mesmo assim, os olhos azuis do imperador fracassado permanecem a brilhar no chão, como estrelas prestes a se apagar.

— Estranho. — Dipper segura os restos. — O feitiço de obliteração destruição carne, ossos… — Ele mostra a palma da mão para os bruxos. —Tudinho; até os olhos… mas eles estão localizados aqui.

Confuso, ele pega o diário no balcão e se posiciona no centro da porta.

— Esses olhos ficam comigo. – Dipper suspira. — Já é um passo contra Bill.

— Espera aí. — Um aviso seco.

Uma sensação molhada e gostosa cai sobre seu ombro; algo mole, mas firme. Raízes verdes brotam do chão, bloqueando a saída. Ele sente a circulação percorrendo cada fio de cabelo.

Ao olhar para trás, Luz manipula formas roxas com uma mão firme, os bruxos seguram seus cajados, magia pronta. O rapaz das cicatrizes permanece à frente, com duas adagas envoltas em raios amarelos, estendidos e ameaçadores.

— Esses olhos ficam comigo. — Luz repete.

— Eu não quero conflito. — Dipper estreita os olhos e mantém a mão na bolsa. — Não sei quem são vocês, nem o que passou… mas é mais seguro ficar comigo. Confie: conheço Bill melhor que qualquer outro. Talvez eu seja o único em quem vocês podem confiar… Bill está prestes a destruir a realidade e…

As luzes se apagam de repente. No breu, só brilham os círculos mágicos e o resplendor dos cajados. Um orbe roxo voa em direção a Dipper, criando uma parede de gelo e jogando um papel glifo ao chão.

Ele se joga ao solo, traçando rapidamente outro glifo, dessa vez de vento. Os bruxos são empurrados e caem no chão frio.

Dipper salta sobre o balcão e corre para os fundos. Pensei em conjurar um glifo de luz nas mãos para iluminar o caminho, mas abandonei a ideia ao perceber os círculos mágicos e flutuantes ao redor do pulso vasculhando o escuro.

Ele procurou na pochete uma folha de glifo, mas todas se esgotaram. O diário está em mãos, intacto; não pretenda rasgar páginas do seu precioso. A única saída restante surge de sua memória.

— Codex Arcana… página 43… Espelhatus!

Estilhaços de vidro estouram, e uma luz ofuscante invade o lugar. Uma passagem se abriu na parede, deixando a luz da lua iluminar tudo. Do outro lado, Dipper surge, segurando um grimório sob o luar, lançando um olhar de relança, carregado de desdém.

Willow é a primeira a avanço, mas seu corpo bate na barreira e cai. Luz a salva antes que toque o chão. Gus tenta atravessar, sem sucesso.

— Transformação de matéria simples… hã, ou qualquer uma, em vidro anti-bruxos — Dipper comenta, sem olhar diretamente para ninguém, folheando seu grimório e “dando uma aulinha”. — Vocês não podem passar. O sangue bruxo bloqueia a travessia.

—É mesmo? — Luz dá um passo adiante.

Com um olhar incrédulo, Dipper a observa atravessar a abertura como se nem fosse uma bruxa, como se fosse…

— Humano? — ele murmura, boquiaberto, mas rapidamente esconde o espanto. — Interessante. Você é metade humana e bruxa… ou será que é humano que se tornou uma bruxa? Hmmm... no entanto, isso não é nada demais. Eu sou humano e... não só sei magia, mas sou um mestre mago.

— Você é meio debochado, né? — Luz retruca.

— Só um pouquinho.

Ela avança, lançando um orbe eletrizante com o cajado. Dipper Desvia. Um segundo ataque roça sua barriga, forçando-o a recuar. Ele mantém distância, Luz insiste, atacando sem cessar.

De repente, um raio amarelo corta a rua. Dipper recua, passa pelo lado de Luz e, num piscar de olhos, se vê seguro por Hunter.

— Você também não é um bruxo? Ou apenas usou essa habilidade para atravessar a barreira? — Dipper pergunta, com a mão no queixo, refletindo, quase esquecendo sua situação. — Eu estou realmente surpreso. Vocês são bruxos bons.

Luz avançando, apontando o cajado para seu rosto.

— E você diz como se não existisse bruxos bons. Quem é você? Devolve agora os olhos.

— Tudo bem. Desisto. — Dipper procura na pochete mágica, vasculhando cada compartimento. Não há sinal dos restos de Belos. — Cade…? — ele murmura, perplexo. — Onde estão!?

— Anda logo e para de enrolar — Luz insiste.

— Não está comigo! — Dipper levanta as mãos.

Então, ele desvia o olhar e percebe algo no canto da rua.

— Ali! — Dipper aponta, fixando-se em um par de olhos que se movem silenciosamente. — Peguem o sem-vergonha!

Os olhos pretos, com pupilas azuis estendidas, saltam em pânico e começam a rolar em direção ao beco mais próximo. Luz corre atrás deles, mas os globos oculares se espalham frenéticamente, saltando e quicando pelo chão.

Antes que qualquer um pudesse reviver, Dipper surge, empurra Luz ao chão e recupera os olhos. Mas, mal tem tempo de respirar: um bruxo balançando em seu cajado surge e o arrebata para os céus.

É Gus, enfurecido, segurando Dipper pelo colarinho, mas solta-o num rápido instante. Dipper então agarra-se com todas as forças ao cajado, enquanto Gus o leva rápido pelos ventos e mais a cima. Quando Dipper olha para baixo, percebe, com horror, que sua pochete já não está mais presa à cintura… e é tarde demais.

—Seu…! — Dipper tenta gritar, mas um pisão nas mãos o faz soltar e cair livremente pelo céu.

O chicoteia seu rosto, e as casas de Gravesfield se aproximam perigosamente. Sem pochete, sem papéis para glifos, a única opção é confiar na sorte… até que, enquanto cai de costas para o chão, vê a lua cheia e se lembra.

Ergue o dedo, traça um símbolo invisível no ar, toca o pingente no pescoço e grita:

— Entre as forças do desconhecido, da estranheza, e da sombra que observa e espera o chamado: Duembrente, atenda ao pacto!

Um rasgo de luz azul-violeta se abre no céu. A silhueta de uma criatura robusta forma-se em frente à lua e, em segundos, desce em espiral, rugindo de forma distorcida. Agarra Dipper antes que ele colida com o solo, e o impacto forma uma pequena cratera, mas ele está seguro nos braços do Duembrete.

Os moradores de Gravesfield começam a emergir de suas casas, assustados pelos gritos e estrondos da noite. Dipper ignora tudo, erguendo os olhos ao horizonte da rua e para o céu em busca dos bruxos. Um deles corta as nuvens como uma coruja.

Dipper acena ao Duembrete, que murmura obedientemente. Os braços colocam Dipper em suas costas, e, num avanço com pisadas violentas, salta para o ares.

Despenca num telhado de uma casa, continua correndo, salta para outra casa e finalmente, num último pulo sobre-humano, lançam-se ao céu em direção ao bruxo. O Duembrete abre seus braços musculosos, e suas asas, pequenos, mas humildes, batem tolamente: planejando por uma distância maior e finalmente agarrando uma bruxa.

Só que… um brilho roxo emana dos braços contidos do Duembrete, que murmura inocentemente. Em seguida, quando estavam prestes a despencar numa floresta, uma explosão roxa lançando Dipper das costas de seu bichinho.

Ele aterrissa num arbusto, e desliza por alguns metros numa ladeira e finalmente bate de costas para um tronco. Ergue-se rapidamente para retornar à “cena do crime”, mas instintivamente volta para trás da árvore, com o coração acelerado, ao reconhecimento de uma voz perfeitamente familiar.

— Então será nessa floresta que cairá o meteoro azul? — a voz de Bill ressoa, cortando o silêncio da noite.

— De acordo com meus cálculos, será aqui… ou talvez em Gravesfield — responda um garoto, com a voz firme.

—Rei Gelado! — Bill Cipher chama esse nome desconhecido. — De acordo com seu conhecimento mágico, o meteoro encontrado azul irá cair em qual local?

— Eu acho que será em Gravesfield.

Dipper inclina a cabeça e observa a cena à distância: Bill Cipher, na forma triangular, caminha pela floresta ao lado de Morty Maligno e do tal Rei Gelado.

— Então anda logo — cutuca Morty, empurrando o homem velho com sua arma. — Perder tempo é uma crueldade multiversal.

O Rei Gelado usa apenas uma cueca e uma coroa, talvez, improvisada na cabeça, tremenda na noite gelada. Parecia claramente estar sendo manipulado pelos dois — e provavelmente estava.

Dipper se afasta rapidamente, esconde-se atrás de um tronco e respira fundo. Quando abre os olhos, vê Luz Noceda se aproximando, com magia brilhando nas mãos e um olhar enfurecido. Ele toca o dedo nos lábios, fazendo um sinal para que ela fique em silêncio, e então aponta discretamente para os três.

— Esse é o tal Bill Cipher que eu queria explicar para vocês — sussurra Dipper. — Mas ele está na forma triangular. O corpo original.

— E aquele é o Morty. — revela Luz, parando ao lado de Dipper com a sobrancelha franzida.

— O quê? Você o quê?

— Ele invadiu o Reino Demoníaco procurando o Belos. Por isso achamos que você se envolveu.

— Só porque eu queria ficar com os olhos dele? Isso… isso se chama precaução multiversal!

— Shhhhh… Fecha essa boquinha! — Luz reclama, impaciente, enquanto Dipper parecia um mosquito zumbindo em sua orelha. — Vamos avisar os outros antes que destruam a cidade, assim como fizeram com as Ilhas Escaldadas.

— Ilhas… Escaldadas?

Luz um olhar rápido para Dipper antes de atravessar o arbusto. Ele fecha a matraca, ainda sem ter certeza de quem realmente era Luz Noceda. Por outro lado, Dipper já estudou sobre o Reino Demoníaco e conhece muito sobre aquele lugar, mesmo nunca tendo viajado até lá.

— Meu lar — diz Luz, sem olhar para ele, mantendo os olhos fixos nos inimigos. — Um dos meus “lar”.

Dipper registrou os estudos sobre as Ilhas Estilhaçadas, fragmentos de armadura colossal espalhados pelo mar; das Ilhas Petrificadas, onde o corpo de um titã se transforma em pedra; das Ilhas Dilaceradas, retalhadas e remendadas por mãos desconhecidas. Mas as Ilhas Escaldadas? Nunca ouvi falar. Talvez fosse um território “especial” de Luz, um pedaço singular do Reino Demoníaco, e por isso ela escolheu se juntar ao grupo, pronto para proteger a cidade.

Dipper hesita, o coração apertado entre duas decisões impossíveis: investigar o plano de Bill e enfrentar o perigo de frente, ou retornar aos bruxos em Gravesfield, seguro, mas talvez tarde demais.

Por um instante, Luz vira a cabeça levemente, com um aceno em direção à cidade. Dipper havia decidido ainda, mas abre a boca para falar:

— Acho que já sei o plano deles. As joias feitas… e os cometas, são a peça principal.

Luz olha intrigada e preocupada. No entanto, Dipper não consegue ver o rosto dela perfeitamente, e então deita-se no chão e esgueira-se ao arbusto. Mesmo assim, Luz continua com os olhos presos nos inimigos, como se fosse um vazio sem propósito ali.

Alguns bruxos estão tão cheios de trevas que, quando você olha nos olhos deles, acha que nunca mais verá a luz.